Acessibilidade / Reportar erro

Corpos em Expansão: a arte do encontro no método Bailarino-Pesquisador-Intérprete (BPI)

Corps en Expansion: l'art de la rencontre dans la méthode Danseur-Chercheur-Interprète (DCI)

Resumo:

O artigo esclarece aspectos da pesquisa no método Bailarino-Pesquisador-Intérprete (BPI) em resposta ao texto de Höfling, publicado neste mesmo periódico, no v. 6, n. 2 (2016). São explicitados procedimentos e enfoques do método concernentes às pesquisas de campo, à criação artística e às apresentações dos espetáculos. No decorrer do texto são dados exemplos práticos, de investigações realizadas ao longo de 36 anos de pesquisas, bem como são abordadas teorias da psicologia, que auxiliam em um entendimento mais profundo dos conteúdos que se articulam no corpo e, consequentemente, fornecem subsídios para dar uma condução aos processos emocionais inerentes à criação artística.

Palavras-chave:
BPI; Corpo; Dança; Criação; Psicologia

Résumé:

L'article présente des aspects de la recherche de la méthode Danseur-Chercheur-Interprète (BPI), en réponse au texte Hofling publié dans ce journal en v. 6, n. 2 (2016). Des procédures et des angles d´approche de la méthode touchant aux recherches de terrain, à la création artistique et aux spectacles sont explicités. Sont donnés des exemples pratiques, de travaux réalisés au cours de 36 ans de recherches dans cette méthode, de même que des théories de la psychologie sont abordées, qui aident à la compréhension plus profonde des contenus qui s´articulent dans le corps et, conséquemment, apportent des recours pour une conduite des processus émotionnels inhérents à la création artistique.

Mots-clés:
BPI; Corps; Danse; Création; Psychologie

Abstract:

This paper replies to the text of Höfling published in this journal in v. 6, n. 2 (2016), clarifying aspects of the research in the Dancer-Researcher-Performer (BPI) method. Procedures and approaches of the method, concerning field research, artistic creation and presentation of performances are fully expressed. Throughout the text, practical examples of investigations carried out over 36 years of research in this method are given, as well as theories of psychology, which promote a deeper understanding of the contents that are articulated in the body and, as consequence, provide subsidies to guide the emotional processes inherent to artistic creation.

Keywords:
BPI; Body; Dance; Creation; Psychology

Introdução

Este artigo esclarece algumas afirmações acerca do método Bailarino-Pesquisador-Intérprete (BPI) feitas por Höfling, em texto publicado neste mesmo periódico, no v. 6, n. 2 (2016). Devido ao grande número de aspectos que necessitariam ser elucidados, inclusive citações utilizadas de forma incompleta ou fora de contexto, foi necessário selecionar aqueles que se considerou fundamentais. Assim, é esclarecida a opção presente no método de não separar o desenvolvimento pessoal do artístico e o que isso implica no cabedal teórico que respalda esse direcionamento. Sobre as pesquisas de campo realizadas no método, são explicitadas: a complexidade inerente aos segmentos sociais pesquisados; a Estrutura Física e Anatomia Simbólica do BPI; as relações interpessoais em campo; e a conexão da pesquisa de campo no âmbito de uma identidade corporal do intérprete. Outro aspecto relaciona-se às criações artísticas, a esse respeito são abarcados: a questão da brasilidade; a abertura do intérprete para o que está à sua volta; a escolha pelos conteúdos de vida; o que é a personagem no método BPI; e a conjunção entre razão e emoção nos trabalhos no método, da qual não faz parte a catarse. Por fim, são elucidados alguns aspectos sobre os conteúdos presentes nas criações artísticas e sua recepção pelos espectadores, incluindo as pessoas das pesquisas de campo.

O Bailarino-Pesquisador-Intérprete (BPI)1 1 O BPI tem sua principal alocação na Unicamp, aspectos do método são experienciados pelos alunos em disciplinas de cursos de graduação e pós-graduação. O método é vivido na íntegra apenas quando há a escolha da pessoa pelo mesmo, sendo desenvolvido, nesses casos, através de projetos de Trabalhos de Conclusão de Curso, Iniciação Científica, Mestrado, Doutorado, entre outros. O grupo de pesquisa Bailarino-Pesquisador-Intérprete (BPI) e Dança do Brasil, cadastrado no diretório do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), aloja os projetos mencionados. é um método artístico de pesquisa e criação em dança, embasado em eixos específicos e desenvolvido a partir de ferramentas próprias2 2 O Método BPI sustenta-se em três eixos - o Inventário no Corpo, o Co-habitar com a Fonte e a Estruturação da Personagem - e em cinco ferramentas - a Técnica de Dança, a Técnica dos Sentidos, as Pesquisas de Campo, os Laboratórios Dirigidos e os Registros (Rodrigues, 2003; 2010). , que favorece a potência latente na dança de cada intérprete3 3 O termo intérprete será utilizado para designar o artista que está em processo no método BPI. Considera-se intérprete o artista da cena aberto a experienciar em si mesmo toda e qualquer dimensão humana, expandindo dessa maneira a sua capacidade de comunicação com o espectador, pois ele não reproduz ou representa conteúdos e, sim, assume vivê-los em seu corpo. em conexão com segmentos sociais singulares. Cada intérprete, através do BPI, alcança uma estruturação corporal própria, construída por meio do processamento de memórias, imagens, emoções e sensações, provenientes do seu encontro com as pessoas com quem ele conviveu em pesquisa de campo4 4 As pesquisas de campo são o núcleo das experiências do eixo Co-habitar com a Fonte. . Na busca por um corpo vigoroso e mobilizado internamente, muitos artistas utilizam o método BPI ou aspectos do mesmo para a criação nas artes da cena.

Esse método possui um caráter sistêmico5 5 Segundo Capra (1982, p. 260): "Os sistemas são totalidades integradas, cujas propriedades não podem ser reduzidas às de unidades menores [...] A atividade dos sistemas envolve um processo conhecido como transação - a interação simultânea e mutuamente interdependente entre componentes múltiplos [...] Embora possamos discernir partes individuais em qualquer sistema, a natureza do todo é sempre diferente da mera soma de suas partes". , pois seus eixos atuam conjuntamente - de maneira integrada - sua divisão dá-se apenas como um recurso didático. Além disso, a pessoa do artista também é vista de forma integrada, não havendo uma separação entre o desenvolvimento pessoal e o artístico no processo de criação dentro do método. Tavares (2003TAVARES, Maria da Consolação Gomes da Cunha Fernandes. Imagem Corporal: conceito e desenvolvimento. São Paulo: Manole, 2003. , p.50) reforça esse aspecto, salientando que o BPI é uma abordagem corporal que visa "[...] desenvolver o ser humano de forma integral, ampliando suas relações com o mundo".

Quando se lida com o movimento em profundidade, muitas vezes o intérprete se depara com suas próprias referências emocionais que, através do contato com as sensações corporais, vêm à tona, muitas delas desconhecidas dele mesmo até esse momento. Devido a essa conjuntura, no método BPI trabalha-se o desenvolvimento pessoal do intérprete junto com o artístico. Na prática cotidiana com o método tem-se observado a potência desse reconhecimento de si mesmo, por exemplo, quando a pessoa constata a atuação dos seus próprios mecanismos de defesa6 6 Segundo Pruzinsky (1990), os mecanismos de defesa são formas aprendidas para lidar com o mundo, que incluem estratégias cognitivas, emocionais e corporais. Estes mecanismos são empregados repetidamente, internalizados e se tornam inconscientes. Muito depois de a necessi­dade de utilizá-los ter passado, eles continuam atuando. e isso reverte positivamente na fisiologia do movimento. Assim, é dada ao intérprete a possibilidade de ter acesso a conhecimentos da psicologia, como mais uma ferramenta para proporcionar o seu desenvolvimento artístico e pessoal.

A questão do desenvolvimento humano é central também na qualidade das relações interpessoais que ocorrem ao longo de toda a criação. Ao ter uma maior consciência de si, a pessoa poderá perceber os seus processos de incorporação, identificação e projeção7 7 "Na visão de Schilder [...] a imagem corporal dos seres humanos se constrói a partir da história interna do indivíduo e de suas relações com os outros. Ao longo do desenvolvimento as partes dos corpos dos outros vão fazendo parte da imagem corporal da pessoa (incorporação), assim como as atitudes recebidas em relação a seu corpo vão fazendo parte de sua personalidade (identificação). Um mecanismo importante de ser lembrado aqui é a projeção, pois com frequência se projeta a própria imagem corporal no outro. Há uma intercomunicação de imagens corporais através de partes ou do todo" (Rodrigues, 2003, p. 119). etc., o que a permitirá enxergar melhor o outro e cuidar das relações com o mesmo.

Pesquisa de Campo

No método BPI, a pesquisa de campo realizada no eixo Co-habitar com a Fonte é um dos trabalhos corporais centralizadores e detonadores de diferentes dinâmicas psicofísicas. Nela, o intérprete vive corporalmente uma situação de alteridade, a qual, nesse momento do método, é experienciada com vigor.

A observação feita em campo não é apenas pelo olhar, é uma relação de apreensão sinestésica no contato com as pessoas da pesquisa, devido à ampliação da percepção do intérprete alcançada através de trabalhos específicos realizados anteriormente em estúdio.

Através da pesquisa de campo, o corpo do intérprete é mobilizado e amplia-se o que ele reconhece como fazendo parte de si mesmo, principalmente a partir da coabitação com pessoas que alcançaram uma condição de resiliência. Segundo Cyrulnik (2004CYRULNIK, Boris. Os Patinhos Feios. Tradução Monica Stahel. São Paulo: Martins Fontes, 2004., p. 207):

A resiliência é a arte de navegar nas torrentes. Um trauma empurrou o sujeito em uma direção que ele gostaria de não tomar. Mas, uma vez que caiu numa correnteza que o faz rolar e o carrega para uma cascata de ferimentos, o resiliente deve apelar aos recursos internos impregnados em sua memória, deve brigar para não se deixar arrastar pela inclinação natural dos traumatismos que o fazem navegar aos trambolhões [...]

Cyrulnik (2004CYRULNIK, Boris. Os Patinhos Feios. Tradução Monica Stahel. São Paulo: Martins Fontes, 2004.) ainda explica que, juntamente com os recursos internos da pessoa, é necessária uma relação afetiva, uma "mão estendida", para que ela possa percorrer um caminho de superação.

A fala das pessoas encontradas nas pesquisas de campo no método BPI demonstra muitas vezes um processo de resiliência instaurado, o que pode ser percebido, por exemplo, nessa fala de um agricultor: "Eu tô cortado ao meio que nem um capado, mas eu não vou chorá" (Teixeira, 2007TEIXEIRA, Paula Caruso. O Santo que Dança: uma vivência corporal a partir do eixo Co-habitar com a Fonte do Método Bailarino-Pesquisador-Intérprete. 2007. 195 f. Dissertação (Mestrado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2007., p. 91). A intérprete que realizou essa pesquisa observa: "[...] o que me impressionava era que, mesmo mancando, eles estavam ali, insistindo, batendo os pés diante do altar de São Gonçalo, enquanto tivessem força" (Teixeira, 2007, p. 102).

A experiência de campo não é simples: ao mesmo tempo em que o contexto social pesquisado - ao qual o intérprete conecta-se de corpo inteiro - é muito diferente daquele do intérprete, está também emocionalmente muito próximo de uma identidade corporal sua8 8 A identidade corporal, segundo Tavares (2003, p. 104), está ligada "[...] à vivência e ao reconhecimento de nossas percepções. Isso permite constante coesão dessas percepções e construção de um 'eu corporal' [...] a base do sentido do eu está no reconhecimento do corpo e no desenvolvimento de representações mentais do corpo coerentes com nossa realidade existencial [...] Pelo reconhecimento do mundo externo de forma corporal o sujeito se estrutura como uma identidade corporal". . O intérprete apreende aquilo que está em íntima relação com o seu corpo9 9 "O corpo a que nos referimos [...] transcende a soma de todos esses aspectos [corpo e mente, movimentos e percepções, relações afetivas e sociais] pois é um corpo existencial e, por isso, a cada momento se revela inexplicável, fonte inesgotável do 'novo', do 'singular', que, ao mesmo tempo, carrega a vulnerabilidade própria do ser humano" (Tavares, 2003, p. 118). .

Dessa maneira, existe um conteúdo interno do intérprete que é corporal - ligado ao campo emocional da experiência de pesquisa - que será mobilizado na relação com as pessoas da pesquisa de campo e só será identificado nos laboratórios dirigidos10 10 Os laboratórios dirigidos são uma das ferramentas do método BPI "[...] são elaborados pelo Diretor de forma individualizada para que ocorra o reconhecimento da memória no eixo Inventário no Corpo, o reconhecimento do material da pesquisa em si mesmo no eixo do Co-habitar com a Fonte e a nucleação da personagem no eixo Estruturação da Personagem" (Rodrigues, 2010, p. 2-3). . Esse conteúdo emocional, fruto desse encontro do intérprete com os pesquisados, e ainda latente nesse momento do processo, será o cerne da criação artística.

As contínuas pesquisas de campo, ao longo desses 36 anos de existência do método, têm ocorrido em locais à margem da sociedade brasileira. São locais socialmente invisíveis, passíveis de preconceitos, afastados do centro das atenções do poder público ou da mídia, e podem ser considerados como esquecidos.

As pessoas que ocupam essas margens muitas vezes apresentam uma potência corporal não vista em outros segmentos da sociedade. Esse dado é algo que tem persistido nas diversas pesquisas de campo empreendidas. Vê-se nessas pessoas uma qualidade de movimento na qual há a integração do corpo todo, imbuído de significados, através de emoções que o mobilizam internamente, reverberando na sua expressividade. O movimento de muitas dessas pessoas é dotado de plasticidade, densidade, agilidade, articulando seus sentidos através de diferentes gradações do tônus muscular. É um corpo expandido pela sua conexão com uma ancestralidade, que na sua dança interliga o sagrado ao tempo-espaço do cotidiano e atualiza constantemente seus mitos e significados. Observa-se que o sentimento de sagrado não provém necessariamente de uma conexão com uma religião específica, e, sim, da percepção da pessoa de fazer parte de algo maior do que ela. Sua individualidade é colocada, assim, a favor de uma coletividade na qual movimentos de resistência e resiliência são atuantes no enfrentamento das dificuldades. Nesses nichos à margem encontram-se, muitas vezes, sentidos de esperança renovados dia a dia. É evidente que não são todas as pessoas desses segmentos sociais que apresentam essa qualidade de movimento em seus corpos, no entanto, quando isso ocorre - o que tem sido frequente nas pesquisas com o método BPI -, é algo, sem dúvida, muito especial.

Essas manifestações pesquisadas estão em constante movimento de transformação, atualização e adaptação, apresentando uma relação dialética com as culturas da sociedade dominante, como explicitam Gomes e Pereira (1992GOMES, Núbia Pereira Magalhães; PEREIRA, Edimilson de Almeida. Mundo Encaixado: significação da cultura popular. Belo Horizonte: Mazza Edições, 1992., p. 74):

Há uma tensão que significa tanto aceitação quanto repúdio: nessa dialética não existe apenas passividade. Os elementos da cultura popular resistem à imposição da norma culta, escapam-lhe ao controle, parecendo desaparecer aqui e renascendo lá, num processo dinâmico de recriação.

Ressalta-se a diversidade de manifestações, corporalidades, cosmologias e concepções de vida encontradas nas mais diferentes regiões brasileiras. Em cada campo pesquisado, há algo novo a aprender em termos de movimentos, suas funções e significados, assim como no âmbito das relações humanas.

A Estrutura Física e a Anatomia Simbólica, caracterizadas como ferramentas do método BPI, são uma decodificação corporal provinda de pesquisas de campo realizadas por Graziela Rodrigues - entre 1980 e 1995 - envolvendo Umbandas, Candomblés, Capoeiras, Congados, Maracatus, Folias de Reis, Folias do Divino, Batuques e várias danças regionais. Constam dessas pesquisas também uma comunidade indígena Xavante, a comunidade dos Arturos e grupos de boias-frias e benzedeiras. Essas pesquisas abarcaram diferentes estados do Brasil, desde a Bahia até o Rio Grande do Sul, estando centradas mais notadamente no Distrito Federal, em São Paulo, em Minas Gerais, em Goiás e no Mato Grosso.

Ousamos falar deste corpo a partir dos aprendizados vividos nas pesquisas de campo. É importante salientar que cada manifestação apresenta especificidades, em cada região ela é peculiar e cada grupo é único na sua expressão. Apresentamos, portanto, uma síntese, pontuando aspectos fundamentais, que foram comuns e marcantes. Cada referência enunciada contém desdobramentos que seria impossível expor neste primeiro relato (Rodrigues, 1997RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. Bailarino-Pesquisador-Intérprete: processo de formação. Rio de Janeiro: Funarte, 1997., p. 27).

Essa síntese, que deu origem à Estrutura Física e à Anatomia Simbólica, diz respeito a técnicas corporais nas quais o trabalho com a terra - no plantio e na colheita - é a base. É uma organização corporal dinâmica, que propõe a vivência da complexidade simbólica presente nos movimentos dos dançantes em suas relações com os mastros votivos, na qual a memória dos sentidos nutridos pela ancestralidade estabelece uma configuração psicofísica facilitadora para o aumento da percepção.

As investigações de campo realizadas pelos pesquisadores do método BPI ao longo desses vários anos vêm, até o momento, majoritariamente comprovando os dados sistematizados na Estrutura Física e na Anatomia Simbólica. Todavia, não há uma generalização, sendo fundamental, portanto, olhar para as diferenças.

Por exemplo, em pesquisa de campo realizada junto aos índios Pankararu, pôde-se ampliar a visão que se tinha a respeito da performance do corpo em movimento no espaço. Nas danças dos Pankararu (Figura 1), eles lidam com forças invisíveis, atribuídas às suas entidades mágico-religiosas, que estabelecem fluxos dinâmicos e renovadores dos espaços através dos corpos dos dançantes, em percursos circulares realizados nos grandes terreiros abertos de chão batido ou de areia, lugares sagrados para os Pankararu. A especificidade dessa dança está na intensidade desses percursos do corpo em infindos fluxos de força, movimentando-se em círculos e espirais.

Figura 1
Dança dos Pankararu

Em outra pesquisa de campo, esta realizada com as mulheres Xavante, viu-se que sua força física para trabalhar nas exigentes tarefas cotidianas - carregar e cortar lenha, plantio e colheita etc. - estava diretamente relacionada com a qualidade do movimento de sua dança. As pesquisadoras, depois de certo tempo em campo, perceberam que o princípio da dança Xavante feminina vinha do útero, reverberando no aterramento dos seus pés. Era um movimento que partia de um lugar profundo nos corpos das mulheres, dotando-as de uma força com a qual nunca se havia entrado em contato nas pesquisas anteriores.

Já em pesquisa de campo com os Assurini, verificou-se que o eixo mastro não estava presente nos corpos dessas pessoas: "Ao considerarmos o eixo-mastro, postura desvelada pelas análises do BPI [...] constatamos aqui a sua não existência, pois o movimento está todo o tempo na relação com o solo, gerador deste corpo" (Rodrigues; Müller, 2006RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca; MÜLLER, Regina. Dança dos Brasis: as mulheres das cócoras. Cadernos da Pós-graduação, Campinas, Unicamp, v.8, n.1, p. 129-136, 2006., p. 132)11 11 Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=SinFo62gNDE>. Acesso em: 23 maio 2016. .

A Estrutura Física e a Anatomia Simbólica são usadas, assim, como um referencial para a leitura corporal em campo, o qual na maioria das pesquisas vem sendo corroborado, mas que também pode ser complementado e até contraposto. Essa ferramenta é usada, ainda, na preparação corporal do intérprete durante todo o processo, auxiliando a criar condições físicas e sensíveis para que no seu corpo possam trafegar, de forma consciente, as suas sensações e emoções.

O foco da pesquisa de campo no eixo Co-Habitar com a Fonte são as relações interpessoais. Antes do intérprete ir para a pesquisa, é feita uma preparação que envolve um trabalho corporal e emocional, bem como reflexões a respeito de diversos aspectos envolvidos nessa relação com os pesquisados, como as relações de poder, os limites e os estados de receptividade. As condições de atenção e concentração trabalhadas ao longo de todo o processo no método BPI devem ser as melhores possíveis nesse momento. O intérprete em campo mantém o seu foco nas relações com os pesquisados, ao mesmo tempo em que está atento às suas próprias sensações e sentimentos.

Almeja-se que o intérprete alcance em campo uma relação amorosa com o pesquisado, no sentido de atuar com menos mecanismos de defesa, com abertura e empatia, o que lhe possibilita ver o outro mais integralmente. Esse tipo de relação se refere à posição depressiva e ao núcleo amoroso descritos por Klein (1991KLEIN, Melanie. Inveja e Gratidão e Outros Trabalhos. Tradução de Elias Mallet da Rocha e Liana Pinto Chaves. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1991. ), nos quais o sujeito alcança uma estabilidade emocional com capacidade para a tolerância e para ver as pessoas como totalidades, isto é, sendo capaz de perceber tanto suas falhas como também suas virtudes. Isso implica em aceitar as perdas ligadas às idealizações.

Em campo ocorrem questionamentos que, muitas vezes, podem levar o intérprete a conflitos internos. O choque de valores, o estranhamento e o sentimento de impotência que podem ser gerados no campo fazem o intérprete, neste método, lidar com o seu próprio etnocentrismo. Segundo Rodrigues (2003RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. O Método BPI (Bailarino-Pesquisador-Intérprete) e o Desenvolvimento da Imagem Corporal: reflexões que consideram o discurso de bailarinas que vivenciaram um processo criativo asseado neste método. 2003. 172 f. Tese (Doutorado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2003. , p. 109):

No Co-habitar com a Fonte é fundamental que o pesquisador entre em contato com o outro sem julgamentos. Isto envolve conflitos, porém quando o pesquisador redireciona os seus preconceitos ao compreendê-los, passa realmente a ver o outro e os seus espelhamentos. Tem-se verificado que com essa atitude a pessoa que está sendo pesquisada passa a ter um interesse genuíno pelo pesquisador, e dessa forma o pesquisado converte-se em pesquisador. Para ambos há uma transfusão de energias, que se misturam e se combinam, realizando uma entidade humana que é fruto desse tipo de interação: inteiramente profissional onde o afetivo é um elemento que faz parte.

Em experiência de campo de uma intérprete com agricultores de Minas Gerais, ela pôde perceber claramente como o pesquisado a testou e investigou, até chegar em uma relação de confiança:

Com ele vivi momentos significativos em que fui testada, até conquistar sua confiança. Por exemplo, quando, no primeiro dia, fui almoçar em sua casa, ele me disse: 'Não repara, a comida hoje lá em casa é de marmita'. Enquanto almoçávamos, notei que ele me observava, para ver se eu comeria mesmo. Só ao perceber que eu comia bastante e com gosto, sentiu-se mais à vontade. Aos poucos [...] o estranhamento foi diminuindo entre nós. Ensinou-me como colher uvas, com cuidado, para 'não deixar o rastro das mãos nelas' (Teixeira, 2007TEIXEIRA, Paula Caruso. O Santo que Dança: uma vivência corporal a partir do eixo Co-habitar com a Fonte do Método Bailarino-Pesquisador-Intérprete. 2007. 195 f. Dissertação (Mestrado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2007., p. 12-13).

Na perspectiva do método BPI, se não há uma abertura da parte do pesquisado, se ele não teve empatia e sintonia com o pesquisador e o pesquisador com ele, se não há uma reciprocidade, este não será um campo de pesquisa que terá continuidade, deve-se procurar outro local. As próprias pessoas pesquisadas são quem atestam se houve ou não essa reciprocidade, através dos seus gestos, das suas falas e das suas atitudes de abertura e acolhimento em relação ao pesquisador. O franco interesse do pesquisador pelo pesquisado muitas vezes faz este sentir-se reconhecido por aquilo que vive. Em pesquisa de campo em Tocantins teve-se o seguinte depoimento do pesquisado a respeito do trabalho da pesquisadora:

E a pessoa se dedica num trabalho, para ver as situação das comunidades mais carentes. E faz parte da vida, do mundo, né? Mas nem todo mundo conhece, gostaria que muitas pessoas se deslocassem, né? Se deslocassem para conhecer, para divulgar como é que passa as pessoas dentro dos interior, dentro das periferias, para se condoer [...]

Tem-se observado que nessas trocas que ocorrem em campo há uma valoração tanto do pesquisador quanto do pesquisado, a partir do momento em que um passa a ter uma disponibilidade sincera para o outro. Ocorre um fluxo de imagens corporais12 12 Imagens corporais são as representações mentais do corpo, relacionadas à identidade corporal, as quais abrangem todas as entradas sensoriais e as experiências vividas, que são processadas e representadas dentro de um aparato de maturação psíquica (Rodrigues, 2003, p.19). Segundo Schilder (1999, p.192) "[...] a imagem corporal não é um fenômeno estático, e sim adquirido, construído e estruturado num contato contínuo com o mundo [...] Os processos que constroem a imagem corporal não se dão apenas no campo da percepção mas também têm paralelos com a construção no campo libidinal e emocional". que propicia o desenvolvimento das mesmas, fortalecendo a conexão interpessoal.

Aspectos culturais e libidinais tomarão uma grande importância nesse momento do processo no BPI. A escolha do intérprete pelo campo tem ligação com questões ainda não conscientes de seu interior e, ao mesmo tempo, com uma identificação cultural deste com esse campo. Como foi dito anteriormente, a experiência dessa pesquisa mobiliza esses conteúdos particulares do intérprete.

Por outro lado, também ocorre de o intérprete descobrir, durante a pesquisa de campo, que esse foco por ele escolhido já fazia parte de sua história familiar. Isso mostra que, embora através da pesquisa de campo esteja-se buscando um contexto social diverso, este pode estar muito próximo do intérprete, como parte de sua identidade corporal.

[...] os atuais estudos pós-coloniais em Dança [...] a exemplo da Etnocenologia e pesquisas abraçadas pelo Método Bailarino-Pesquisador-Intérprete, entre outros, vêm assumindo os desafios de desvelar as linguagens perdidas, os saberes locais e a memória genética herdada da cadeia de transmissão oral, que provavelmente poderão nos falar sobre aquilo que, apesar de um segredo velado para nós mesmos, está muito bem guardado como herança em nossos corpos (Lobato, 2012LOBATO, Lúcia Fernandes. A Proposta é a Traição. Conceição | Conception, Campinas, Unicamp, v. 1, n. 1, p. 42-47, dez. 2012. , p. 43).

Embora tenha sido afirmado até aqui essa relação do pesquisador com o pesquisado, a pesquisa irá, a partir desse núcleo, se ampliar e resultar em interligações com o contexto de uma coletividade, de todo um segmento social.

O que busco sublinhar é que se trata de dimensões profundas da identidade, já que a pesquisa nos leva a territórios pouco percorridos: a dimensão simbólica do próprio corpo produzido num determinado processo de socialização [...] os silenciados mecanismos de exclusão e desigualdade social dessa mesma ordem socializadora, onde estamos insertos diferenciadamente 'pesquisadores' e 'pesquisados'; no melhor dos casos indo ao encontro mútuo que supere essa cisão de 'nós e eles' e seja um fazer junto. A pesquisa nos interpela em relação a quem 'fomos sendo' e quem 'queremos ir sendo' com permissão dos neologísticos gerúndios para transitar na dinâmica da produção de identidades (Vilas, 2012VILAS, Paula Cristina. Identidades em Multidimensão: pesquisa e método no campo do patrimônio intangível em América Latina. Conceição | Conception, Campinas, Unicamp, v. 1, n. 1, p. 59-74, dez. 2012., p. 72).

A identidade corporal, no BPI, é compreendida como algo que opera como um eixo da pessoa em processo - tal qual ela se encontra em determinado momento - e que engloba tanto sua história pessoal, quanto o contexto sociocultural em que está inserida. No entanto, a identidade corporal não é algo fixo, fechado ou predeterminado, é passível de transformações, principalmente no que diz respeito à dinamicidade de suas imagens corporais, de acordo com a compreensão desse termo por Schilder (1999SCHILDER, Paul. A Imagem do Corpo: as energias constitutivas da psique. São Paulo: Martins Fontes, 1999. ), que ressalta, neste, a interligação dos aspectos sociais, psíquicos e fisiológicos. Segundo Schilder (1999, p. 211) "[...] em nossa vida psíquica, há sempre tendências a formar unidades, Gestalten [...] Mas sempre que uma Gestalt é criada, esta tende imediatamente a se modificar e destruir-se". As imagens corporais, portanto, são dinâmicas e estão inseridas em um contexto individual em que a história pessoal, o ambiente, a cultura, a fisiologia e o psiquismo integram a identidade corporal da pessoa.

Assim, no método BPI, concebe-se o corpo constituído por uma série de fatores, como sua fisicalidade, o fluxo de suas imagens corporais, sua história, sua memória, suas conexões culturais, suas estruturas libidinais etc.

Na dinâmica da pesquisa de campo, o intérprete torna-se cúmplice do universo pesquisado na medida em que reconhece dentro de si as situações paradoxais que ele teve condições de vivenciar. O paradoxo está nos momentos que são conflituosos, pois, se, por um lado, o intérprete vive situações plenas que o satisfazem, por outro, tem que lidar constantemente com um sentimento de impotência, diante da impossibilidade de alterar as situações sociais nas quais ele se insere quando vai pesquisar. Dessa maneira, o que o corpo do intérprete irá expressar nos laboratórios dirigidos decorre das múltiplas trocas entre pesquisador e pesquisado. Nesse método, é impossível o intérprete não trazer dentro de si a denúncia social: "[...] o processo, portanto, estará nas mãos do bailarino, a partir do momento em que ele aprenda a conduzir as oposições. Aceitando o conflito em seu corpo, ele poderá elaborá-lo e transformá-lo em poesia" (Rodrigues, 1999RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. O bailarino-pesquisador-intérprete incorpora uma realidade gestual. In: GREINER, Christine; BIÃO, Armindo (Org.). Etnocenologia: textos selecionados. São Paulo: Editora Annablume, 1999. P.105-108. , p. 108).

Criação Artística

A relação da dança cênica com aspectos da brasilidade pode acontecer de diferentes maneiras. Segundo Navas (1994NAVAS, Cássia. Danza nacional en Brasil: aspectos de lo moderno y de locontemporáneo. In: OSSONA, Paulina et al. (Coord.). Itinerario por la Danza Escénica de América Latina. Caracas: CONAC, 1994. P. 33-50., p. 44), Rodrigues está dentre os profissionais da dança que, na década de 1980, retornaram ao estudo de temas da cultura nacional, porém de uma maneira diferente do que vinha sendo feito até então. Segundo a autora, estes profissionais não buscaram reproduzir as estruturas das danças das manifestações populares, e, sim, através da pesquisa destas, construir uma "grafia própria". "Interessante notar que o foco de suas atenções estava na transformação de seus corpos para uma nova dança. Não bastaria um tema, uma música, ou alguns passos autênticos das manifestações em estudo para estruturar suas coreografias" (Navas, 1994, p. 44)13 13 Tradução dos autores. .

Os trabalhos artísticos no método BPI distanciam-se de uma reprodução direta, ou de uma estilização, do que foi pesquisado, pois nesse processo a criação origina-se do encontro de cada intérprete com o campo de pesquisa; encontro este que desencadeia um dinamismo das imagens do intérprete, provindas de sua identidade corporal. Como aponta Vilas (2012VILAS, Paula Cristina. Identidades em Multidimensão: pesquisa e método no campo do patrimônio intangível em América Latina. Conceição | Conception, Campinas, Unicamp, v. 1, n. 1, p. 59-74, dez. 2012., p.63-64), por intermédio das pesquisas de manifestações populares brasileiras pode-se "multiplicar o imaginário" e criar a partir de um espaço de deslocamento tanto do pesquisador quanto do pesquisado:

[...] para além das reproduções redutoras ou das expropriações, buscamos propiciar a multiplicação e não a captura desse imaginário. A performance cênica é espaço para produzir conhecimento sobre o deslocamento e a transformação de si mesmo que supõe o encontro com o 'outro', arte mestra no exercício da alteridade.

A experiência com intérpretes estrangeiros tem demonstrado o quanto o método BPI atua na imagem corporal do sujeito, levando-o a acessar conteúdos de sua própria nacionalidade, embora a sua pesquisa de campo inicial tenha se dado no Brasil. Esse percurso ocorreu, por exemplo, com uma intérprete do Equador que iniciou uma pesquisa de campo no Brasil e o processo nos laboratórios dirigidos - no qual a identidade corporal é trabalhada - fez com que seu corpo trouxesse conteúdos relacionados a segmentos sociais do seu país. A partir desse andamento, houve um direcionamento para que fosse realizada uma pesquisa de campo nesses segmentos.

Dessa maneira, destaca-se que o método BPI está direcionado para a pesquisa de campo de culturas populares brasileiras devido ao seu foco no trabalho com a identidade corporal do intérprete, na potência corporal encontrada nessas manifestações, bem como na proposta de criação de trabalhos cênicos que tragam um olhar para contextos sociais do país no qual o intérprete está inserido:

O fato do processo estar vinculado a um contexto nacional, bojo de várias manifestações culturais, não significa que o seu principal objetivo esteja voltado para uma estética brasileira, mas sim para o que ela nos propicia: o desenvolvimento das potencialidades artísticas numa relação mais direta do bailarino com a vida ao seu redor (Rodrigues, 1997RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. Bailarino-Pesquisador-Intérprete: processo de formação. Rio de Janeiro: Funarte, 1997., p. 147).

Quando o intérprete volta da pesquisa de campo é estabelecido o procedimento de laboratórios dirigidos e aquilo que foi mobilizado em seu corpo a partir da pesquisa começa a ser expresso. No corpo do intérprete há uma profusão de imagens, de sensações, de emoções que nos laboratórios tornam-se movimentos. Nesse momento não há nenhuma preocupação por parte do intérprete e do diretor, nem em interpretar o que está sendo dito no corpo, nem em delinear a dramaturgia.

Nesse fluxo através do movimento há os momentos de silêncio - nos quais os movimentos vistos externamente são mínimos -, num exercício de uma profunda percepção das microrreações corporais. É aos poucos que se tem a clareza do que será a criação artística; ela vai sendo alcançada através da percepção de uma qualidade de movimento que transita do inconsciente para o consciente, tendo relação com algo da história de vida do intérprete em confluência com a pesquisa de campo promovida.

Há uma fase em que o espaço é tomado por objetos - materialização do que antes estava no imaginário - os quais criam um espaço de representações que o intérprete passa a habitar. Na medida em que vai ficando clara a paisagem que se forma nesse espaço e a memória dos sentidos nele depositada, um esboço de roteiro é criado. O intérprete é estimulado pelo diretor a estar atento aos fatos da atualidade, ao que está ocorrendo no mundo, para que isso proporcione uma reflexão que irá ampliar os conteúdos do processo de criação. Esse corpo de alta percepção que o intérprete atingiu até então reorganiza os conteúdos do processo criativo, integrando as múltiplas experiências e reflexões. É importante salientar que o ato de questionar e de refletir é uma constante no método.

Um exemplo pode ser dado a partir do desenvolvimento de um processo criativo envolvendo um grupo de cinco intérpretes que realizaram pesquisas de campo na Bahia, focando principalmente o Candomblé, que culminou no espetáculo Depois daquele canto14 14 Direção de Graziela Rodrigues e Larissa Turtelli, com Carolina Constantino, Igor Manoel, Isadora Buonanni, Juliana Pedroso e Yasmin Berzin. (Figura 2). Nesse processo, delinearam-se cinco personagens bem distintas, no entanto, foi se evidenciando aos poucos um conteúdo em comum entre elas, algo que dizia respeito a uma gente sem lugar, a refugiados, a retirantes de locais que foram destruídos. Uma dinâmica de fugas e buscas de um novo lugar instaurou-se fortemente nessa criação. Havia também aspectos mais diretamente ligados ao campo pesquisado que transpassavam esse processo, porém, o eixo dramatúrgico foi a condição dos sem lugar na qual é preciso sempre deixar algo para trás.

Os espaços construídos individualmente nos laboratórios desse processo de criação eram fartos em objetos significativos para cada personagem. Quando a dinâmica das fugas se instaurou, os objetos foram retirados, mantendo-se apenas aqueles que eram essenciais para as personagens e possíveis de serem carregados no corpo. A estética dessa criação artística veio de uma depuração do corpo pela retirada dos objetos, fortificando uma linguagem em que era identificado um corpo de terreiro em uma situação limite, em um ciclo de eternamente refugiar-se em outros lugares, no qual aquilo de mais significativo era levado consigo na memória do corpo.

Esse processo já ocorria quando a mídia lançou com veemência reportagens a respeito da situação de refugiados Sírios, ao mesmo tempo via-se nas redes sociais notícias de terreiros que haviam sido depredados. Tais acontecimentos tiveram um impacto nos intérpretes dessa criação artística, pois confluíram com os conteúdos que estavam em seus corpos.

Figura 2
Espetáculo Depois daquele canto

É, portanto, a criação artística no método BPI um trânsito do intérprete entre aquilo que é mais recôndito em si, aquilo que ocorre à sua volta (incluindo o que foi pesquisado em campo) e situações mais globais, estando todos contingenciados pelos conteúdos deflagrados na criação artística.

Nesse processo de criação nem todos os conteúdos expressos no corpo do intérprete são desenvolvidos com o objetivo de constituírem as cenas. Os movimentos nos quais se identifiquem os vínculos com as pulsões de morte15 15 O conceito de pulsão de morte designa: "[...] uma categoria fundamental de pulsões que se contrapõe às pulsões de vida e que tendem para a redução completa das tensões, isto é, tendem a reconduzir o ser vivo ao estado anorgânico. Voltadas inicialmente para o interior e tendendo à autodestruição, as pulsões de morte seriam secundariamente dirigidas para o exterior, manifestando-se então sob a forma da pulsão de agressão ou de destruição" (Laplanche; Pontalis, 2000, p. 407). e com os mecanismos de defesa como seus principais impulsionadores são reconhecidos - é aberto um espaço para que o intérprete possa elaborá-los -, porém não são levados para a criação artística.

Por vezes, quando o corpo do intérprete fica com um tônus muscular muito reduzido, com dificuldade de modulação, que impede o intérprete de ter contato consigo mesmo - por exemplo, com os seus sentimentos - e há uma repetição de um mesmo padrão de movimento, isso está relacionado à pulsão de morte. Esse é apenas um dos possíveis exemplos, nem sempre há perda de tônus nos movimentos relacionados à pulsão de morte. Assim, o diretor deve estar atento aos prováveis significados da expressividade dos movimentos do intérprete, para poder dar a ele um feedback a esse respeito. Não é uma leitura fácil, os movimentos ligados à pulsão de morte podem confundir e parecer belos.

Saber o que são os mecanismos de defesa e perceber quando eles ocorrem é importante, pois estes, quando atuam inconscientemente, tendem a impedir o fluxo da criação. Prejudicam, ainda, o contato da pessoa consigo mesma e as relações interpessoais. Quando o intérprete está em um processo de negação de um conteúdo, racionalizando-o, ou forjando algum movimento do seu corpo no sentido de encobrir um conteúdo mais profundo - pelo qual o intérprete nutra alguma rejeição, relacionado a algo doloroso referente à sua história de vida - ele pode estar agindo a partir dos seus mecanismos de defesa, ou seja, estar obstruindo o material criativo que estava emergindo.

Perceber a diferença entre o material criativo e aquele provindo da atuação dos mecanismos de defesa é fundamental no método BPI. Cabe então à direção ter perspicácia para saber quando um mecanismo está atuando e para criar meios de o intérprete tomar consciência de tal fato e sair desse mecanismo.

Nos laboratórios dirigidos o intérprete vivencia em seu corpo em movimento imagens das mais diversas, incluindo aquelas relacionadas às pessoas de sua história de vida, do campo pesquisado e pessoas imaginárias, as quais percorrem diferentes paisagens - lugares onde se desenvolvem experiências de vida que se instauram no corpo (Rodrigues, 1997RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. Bailarino-Pesquisador-Intérprete: processo de formação. Rio de Janeiro: Funarte, 1997.). Essas imagens de distintos espaços, tempos e corpos, confluem para um grande dinamismo das imagens corporais que passam a se modelar no corpo do intérprete, resultando em um determinado conteúdo síntese do processo, ao qual denominamos personagem:

A personagem no BPI não é uma composição de elementos autobiográficos, nem é composta de elementos da pesquisa de campo. A personagem não é um aglomerado de conteúdos. O objetivo do BPI também não é fazer uma personagem. Personagem no BPI significa uma nucleação de sentidos num dado momento de integração de imagens corporais da pessoa em processo. Na personagem há um reconhecimento pela pessoa de outras realidades que fazem parte de si (Rodrigues, 2008RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. Encruzilhada de Sentidos: Avançando com o BPI. In: CONGRESSO ABRACE, 5. 2008, UFMG, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte, 2008. Disponível em: <Disponível em: http://www.portalabrace.org/vcongresso/textos/pesquisadanca >. Acesso em: 23 maio 2016.
http://www.portalabrace.org/vcongresso/t...
, p. 2-3).

Segundo Dolto (2002DOLTO, Françoise. A Imagem Inconsciente do Corpo. São Paulo: Perspectiva, 2002. , p. 38), desde o nascimento do indivíduo, o nome próprio que lhe é dado ajuda na estruturação das suas imagens do corpo, possibilitando o domínio de suas pulsões de vida sobre suas pulsões de morte. A coesão narcísica do indivíduo é assegurada por esse nome que lhe é dado: "[...] entendo, nesse sentido, o narcisismo do sujeito enquanto sujeito do desejo de viver". De forma similar, o conteúdo síntese do processo de criação no BPI - que traz um 'corpo novo' ao intérprete -, ao dar o seu nome, enuncia uma identidade social e simbólica, assumindo no corpo a pulsão de vida. "Uma vez que ocorre a estruturação da personagem, é como se a personagem se 'descolasse' da pessoa do intérprete, ganhando 'vida própria', única e abrangente" (Turtelli, 2009TURTELLI, Larissa Sato. O Espetáculo Cênico no Método Bailarino-Pesquisador-Intérprete: Um Estudo a Partir da Criação e Apresentações do espetáculo Valsa do Desassossego. 2009. 309 f. Tese (Doutorado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2009. , p. 157).

A personagem permite que o intérprete tenha uma outra entrada na trama simbólica referente ao campo por ele pesquisado, pois, além dela ser uma nova identidade, ela é uma síntese, estando assim ligada a uma rede que articula diversos conteúdos. Ela se enuncia 'mais ágil do que o intérprete', para digerir, depurar e reorganizar os conteúdos relacionados ao campo e ao próprio intérprete:

Através da personagem do Método BPI o intérprete vive em si 'um outro' que se forma com algo de si mesmo. Este outro o possibilita conectar-se com realidades palpáveis de contextos sociais específicos de uma forma que seria difícil de acontecer sem a aceitação e construção deste 'outro' em seu corpo. A personagem no BPI é uma estruturação que flexibiliza o eixo do intérprete (Turtelli; Rodrigues, 2012TURTELLI, Larissa Sato; RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. Fina Flor Divino Amor: da gira da Umbanda ao corpo da cena. In: CONFERÊNCIA INTERNACIONAL CORPOS (IM)PERFEITOS NA PERFORMANCE CONTEMPORÂNEA, 2012, Almada. Atas... Almada, Portugal, 2012. P.170-175. (Ed. Ana Maraca, Ana Paula Batalha e Katia Mortari)., p. 174).

O campo emocional trabalhado durante o processo no BPI é vasto e intenso. É preciso que se compreenda e estude as emoções. Estas são trabalhadas visando a consciência daquilo que ainda está no plano do inconsciente e que se torna possível acessar. "Uma vez que se está lidando em um terreno de grande subjetividade é preciso situá-lo com objetividade" (Rodrigues, 2003RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. O Método BPI (Bailarino-Pesquisador-Intérprete) e o Desenvolvimento da Imagem Corporal: reflexões que consideram o discurso de bailarinas que vivenciaram um processo criativo asseado neste método. 2003. 172 f. Tese (Doutorado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2003. , p. 152). Segundo Damásio (2000 DAMÁSIO, António. O Mistério da Consciência: do corpo e das emoções do conhecimento de si São Paulo: Companhia das Letras, 2000., p. 60), a emoção é a mais refinada habilidade humana. Não há como ter consciência sem emoção. Emoção e consciência estão intricadas, ambas fazem parte do corpo (Rodrigues, 2003).

No método, observa-se que a catarse não é uma opção de procedimento, porque ela se instaura e acaba, sem que o intérprete tenha consciência do que estava acontecendo consigo internamente. O estado de quase catarse mencionado por Levine (2012LEVINE, Peter. Uma Voz sem Palavras: como o corpo libera o trauma e restaura o bem-estar. Tradução Carlos Silveira Mendes Rosa e Claudia Soares Cruz. São Paulo: Summus, 2012.), no qual há uma liberação emocional e ao mesmo tempo uma consciência quanto ao que isto possa estar relacionado, é considerado uma alternativa válida em algumas situações específicas:

Para abarcar o corpo das sensações [...] é necessário desenvolver a capacidade de suportar sensações físicas e sentimentos desagradáveis, mas com um importante senso de que estes não se apossem da pessoa. Levine se refere a este ato como sendo o de uma faculdade restauradora. Em nossa prática, tem-se observado que a condição de estar com os canais desobstruídos favorece para que a emoção não tome conta do corpo. O intérprete sente a emoção, sem entrar em catarse, pois ele está no fluxo do movimento, o que requer um dinamismo das transformações de imagens em movimento. No trânsito pelos canais, ao converter sentimento em movimento, a emoção é encurralada, oportunizando que se tome consciência dela (Rodrigues, 2013RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. O Corpo Identificado pelo Fluxo de Sentidos. In: REUNIÃO CIENTÍFICA ABRACE, 7., 2013, UFMG, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte, 2013. Disponível em: <Disponível em: http://www.portalabrace.org/viireuniao/pesquisadanca/RODRIGUES_Graziela.pdf >. Acesso em: 23 maio 2016.
http://www.portalabrace.org/viireuniao/p...
, p. 4).

Quando a criação artística vai para a fase das apresentações públicas, o intérprete já tem conhecidas e apuradas as emoções que estão presentes no trabalho cênico. Isso faz com que ele tenha uma segurança para se entregar à sua atuação. Essas emoções estão elaboradas; ele não precisa temê-las. É originada assim uma força emocional que favorece uma linguagem corporal que, em alguns momentos, pode causar incômodo aos espectadores. Pois, alguns, podem não estar abertos a esse tipo de diálogo tônico, possivelmente por terem medo de acordar em si emoções primitivas, que não desejam contatar.

Recepção

O crítico de dança Fausto Fuser (apud Teixeira, 2014TEIXEIRA, Paula Caruso. A História das Origens da Criação do Método Bailarino-Pesquisador-Intérprete (BPI) e do seu Desenvolvimento no Primeiro Percurso da sua Criadora (1970-1987). 2014. 316 f. Tese (Doutorado em Artes da Cena) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2014. , p. 95), referindo-se aos trabalhos dançados e depois dirigidos por Graziela Rodrigues, comenta: "O trabalho dela é o ser humano sem maquiagem, é o homem nu! É isso, e isso incomoda [...] O trabalho dela não é bonitinho... Não é o que as pessoas querem ver". Questões como fome, miséria, abandono, perdas, violência, preconceito, entre outras, estão presentes nos roteiros dos espetáculos no método BPI desde o início do mesmo. As personagens trazem esses elementos em seus corpos, nas suas falas, em seus cantos. Existe uma intenção clara quanto aos conteúdos que se quer comunicar com os espetáculos. "Temos o intuito de transmitir para as pessoas determinados conteúdos. Neste sentido, temos uma postura engajada, uma preocupação quanto ao que estaremos dizendo às pessoas com a nossa arte" (Turtelli, 2009TURTELLI, Larissa Sato. O Espetáculo Cênico no Método Bailarino-Pesquisador-Intérprete: Um Estudo a Partir da Criação e Apresentações do espetáculo Valsa do Desassossego. 2009. 309 f. Tese (Doutorado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2009. , p. 206-207).

As personagens falam de si, mas metaforicamente essas vozes referem-se também a todo um segmento social:

Eles acha que nós é igual vaca empesteada, trem sem destino. Porcaria de vida. [...] nesse vale da Alvorada de tantas lágrimas... Eu ando por esses barraco onde só tem gente com fome doente, lama, tanta fome [...]16 16 Falas da personagem Graça no espetáculo Graça Bailarina de Jesus ou Sete Linhas de Umbanda, Salvem o Brasil, de autoria de Graziela Rodrigues, João Antônio L. Esteves e Celso Araújo.

Tem-se percebido que tal denúncia social chega aos espectadores de forma contundente, o que fica evidente através dos retornos dados pelos mesmos aos intérpretes e diretores após as apresentações de diferentes espetáculos. Esse fato pode ser ilustrado com os depoimentos de espectadores sobre o espetáculo Fina Flor Divino Amor17 17 Direção de Graziela Rodrigues, com Larissa Turtelli, financiamento Programa de Ação Cultural (ProAC). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=jxBzgL2Dzno>. Acesso em: 23 maio 2016. Pesquisa de recepção do público ligada ao projeto A Dança em Ato com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). (Figura 3):

Me emocionei muito com o espetáculo, por ele sintetizar muitas injustiças contra as mulheres, isso me deixou reflexiva e tocada por um bom tempo e com grande intensidade.

Parece que meu sangue tá pulsando mais forte. Que eu tenho um dever a cumprir junto àquelas mulheres.

Muitas coisas; quantas mulheres não sofreram e sofrem até hoje. O peso de ser mulher na nossa sociedade. O que seria loucura (quando mostra contraste da dor e alegria), a generosidade da intérprete ou o sacrifício para conseguir falar sobre este assunto tão delicado.

Sobre o contexto social a que muitas mulheres estão inseridas, me trazendo questionamentos acerca da própria sociedade em um pólo e das fragilidades e forças das pessoas para continuar a vida em outro.

Sobre a luta de mulheres no mundo todo, contra a fome, machismo, condição social e política...

Pois os sofrimentos diversos da mulher e também do ser humano em geral estão presentes diariamente não só na minha cultura, mas em várias outras também.

Figura 3
Espetáculo Fina Flor Divino Amor

Tem sido uma constante no método BPI o retorno ao campo de pesquisa após o término da criação artística, com o intuito de compartilhá-la com os pesquisados18 18 Exemplo disponível em: <https://vimeo.com/64434127>. Acesso em: 23 maio 2016. . Esta é uma vivência singular, um momento de reencontro entre o intérprete e as pessoas do campo investigado a partir de outra perspectiva. Um espaço cênico é montado em campo e, para muitas das pessoas pesquisadas, será a primeira vez que assistirão a uma apresentação cênica com esse viés espetacular. Por alguns momentos o intérprete será o foco das atenções e, os pesquisados, os observadores.

Nessa situação há uma exposição do intérprete frente às pessoas do campo: ele se dispõe a viver um estado de vulnerabilidade e isso é captado por elas. O conteúdo expresso na criação artística também faz parte delas, com isso, muitas vezes, ocorre uma situação de espelhamento, na qual o pesquisado enxerga-se no pesquisador, aprofundando a relação entre ambos. A partir dessa conjuntura, o pesquisado passa a ver o pesquisador sob um outro prisma.

Para os artistas que se desenvolvem no BPI, tal circunstância é o momento de maior validação de todo o trabalho - incluindo as pesquisas de campo e o espetáculo criado. Os depoimentos de várias pessoas do campo, em relação aos trabalhos artísticos apresentados a elas, demonstram que, além dos pesquisados geralmente se identificarem com as personagens e com o que é dançado, desse modo entendem melhor o processo da pesquisa realizada e o seu porquê. Ao apreciarem os trabalhos artísticos, eles em geral se sensibilizam e sentem-se agraciados.

Desde o primeiro espetáculo criado no método BPI, Graça Bailarina de Jesus ou Sete Linhas de Umbanda, Salvem o Brasil, o retorno ao campo foi realizado. Essa apresentação foi notificada em matéria de jornal da seguinte forma: "Um novo espetáculo da Ensaio Teatro e Dança estreia no Distrito Federal, cercado de uma rara dose de novidade, insolitude e ineditismo. Pela primeira vez no Brasil (e creio que é a primeira vez no mundo) um trabalho é encenado em uma tenda de umbanda [...]" (Farias, 1980FARIAS, Marcílio. O Teatro descobre a Umbanda. Correio Braziliense, Brasília, Caderno Variedades, p. 19, ago. 1980., p. 19).

Já nessa primeira apresentação de retorno ao campo foi dado um depoimento significativo sobre a mesma:

A Tenda Beneficiente Xangô Ayrá do Caboclo Ytajacy sente-se clareada com o fulgor de sua arte. 'Graça Bailarina de Jesus ou Sete Linhas de Umbanda Salvem o Brasil' é uma representação de dor e de salvação; de corpo e de alma; de vida e de morte. É a dança mágica do sofrimento, da miséria, da humilhação e da loucura cotidiana que apesar de tudo isso é, paradoxalmente bela e feiticeiramente divina19 19 Carta do babalorixá Raul de Xangô dada a Graziela Rodrigues após a apresentação do espetáculo em sua tenda de Candomblé e Umbanda. .

Cita-se outros depoimentos das pessoas dos campos pesquisados em relação aos trabalhos artísticos:

Emocionante, porque é a história da nossa família [...] E você em pouco tempo apresentou tudo o que a gente viveu aqui, tudo o que a gente vive (Agricultora em Minas Gerais).

A maior reflexão extraída do espetáculo é o respeito e o entendimento sobre a religião de matriz africana, o respeito às mulheres e a compreensão do tema do espetáculo (Umbandista em Belém).

Sou umbandista e parabenizo este tema estar presente num cenário artístico (Umbandista em Recife).

Não é uma dança como as outras que vocês conhecem. É diferente. É uma dança de sentimento. Dos sentimento do lado das feminina [...] Por exemplo, que sente medo, quando o filho tá doente, que fica triste, das dificuldade que passam, da luta pra superar isso, pra cuidar dos filho. É isso, que traz as coisas que as mulheres passam (Índio Xavante no Mato Grosso).

Com essa sua apresentação [...] o que você tá querendo levar não é uma coisa fácil. É uma coisa difícil. É um desafio com seu povo. Você tá desafiando, você vai desafiar. Mas no começo pode dar problema pra você, mas se as pessoa entender, eles vão procurar você também. Que é uma coisa certa, que é uma coisa forte mesmo (Índio Xavante no Mato Grosso).

Conclusão

Através de exemplos práticos de pesquisas realizadas no método BPI, do respaldo de teorias da psicologia e de descrições de procedimentos do método, procurou-se evidenciar alguns princípios fundamentais do mesmo, como o equilíbrio proposto na pesquisa de campo, a vinculação com a brasilidade, a conjunção entre emoção e consciência e o caráter ético desse método de pesquisa. A respeito da pesquisa de campo, foram evidenciados o foco nas relações interpessoais, que envolvem consentimento e reciprocidade, o caráter dialético das culturas pesquisadas, bem como as ligações da pesquisa com uma identidade corporal do intérprete. Essa identidade corporal também está associada à maneira como a questão da brasilidade se dá no método. Buscou-se ressaltar a importância da consciência ao longo do processo, salientando-se a reflexão e o questionamento. Abarcou-se também a conjunção entre o desenvolvimento pessoal e o artístico no processo de criação dentro do método, o que propicia um cuidado nas relações interpessoais em pesquisa de campo, de forma que elas não sejam pautadas em relações de poder, nem em oportunismo.

Espera-se, assim, ter esclarecido algumas das questões colocadas por Höfling.

Todo processo criativo a partir do corpo envolve conhecimentos difíceis de serem acessados através de palavras. Para uma melhor compreensão desses processos é fundamental vivenciá-los e identificar em si as vivências pelas quais o intérprete passa. A entrada nesse grau de conhecimento é via experiência corporal.

[...] fazer-ciência, aprender, logo ensinar, cuidar... todas as reações que temos com o saber são plurais: existem muitas entradas no conhecimento. Essas entradas são variadas, às vezes sendo classificadas pela academia em termos de 'populares', 'práticas', 'teóricas'. O fazer-ciência é um caminhar: o método (o caminho) cria o tipo de ciência que se possuirá [...] Por isso se diz que o caminho tomado participa do conhecimento produzido. A maneira de entrar no saber define um tipo de saber específico (Gauthier, 1999GAUTHIER, Jacques. O que é pesquisar - entre Deleuze-Guattari e o candomblé, pensando mito, ciência, arte e culturas de resistência. Educação & Sociedade, Campinas, Unicamp, v. 20, n. 69, p. 13-33, dez. 1999. , p. 20).

O corpo no método BPI é visto em sua potência de articular significados, transitando entre lugares íntimos, fronteiriços e apartados; proporcionando deslocamentos e estabelecendo interligações com uma coletividade humana. Esse corpo é o ponto de partida para a construção do saber no método. Em seu movimento criativo ele mergulha em si mesmo, vive o encontro, a cumplicidade, o conflito, o vazio, a efervescência, transforma-se e gesta uma nova vida. O refinamento propiciado por esta arte do movimento ultrapassa os muros dos conhecimentos da própria arte, ampliando o trânsito dos saberes entre as áreas. Quando se percorre a senda desse refinamento do movimento entra-se nos domínios da memória e da emoção.

Referências

  • CAPRA, Fritjof. O Ponto de Mutação. Tradução Newton Roberto Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 1982.
  • CYRULNIK, Boris. Os Patinhos Feios. Tradução Monica Stahel. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
  • DAMÁSIO, António. O Mistério da Consciência: do corpo e das emoções do conhecimento de si São Paulo: Companhia das Letras, 2000.
  • DOLTO, Françoise. A Imagem Inconsciente do Corpo. São Paulo: Perspectiva, 2002.
  • FARIAS, Marcílio. O Teatro descobre a Umbanda. Correio Braziliense, Brasília, Caderno Variedades, p. 19, ago. 1980.
  • GAUTHIER, Jacques. O que é pesquisar - entre Deleuze-Guattari e o candomblé, pensando mito, ciência, arte e culturas de resistência. Educação & Sociedade, Campinas, Unicamp, v. 20, n. 69, p. 13-33, dez. 1999.
  • GOMES, Núbia Pereira Magalhães; PEREIRA, Edimilson de Almeida. Mundo Encaixado: significação da cultura popular. Belo Horizonte: Mazza Edições, 1992.
  • KLEIN, Melanie. Inveja e Gratidão e Outros Trabalhos. Tradução de Elias Mallet da Rocha e Liana Pinto Chaves. Rio de Janeiro: Imago Editora, 1991.
  • LAPLANCHE, Jean; PONTALIS, Jean-Bertrand Lefebvre. Vocabulário de Psicanálise. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000.
  • LEVINE, Peter. Uma Voz sem Palavras: como o corpo libera o trauma e restaura o bem-estar. Tradução Carlos Silveira Mendes Rosa e Claudia Soares Cruz. São Paulo: Summus, 2012.
  • LOBATO, Lúcia Fernandes. A Proposta é a Traição. Conceição | Conception, Campinas, Unicamp, v. 1, n. 1, p. 42-47, dez. 2012.
  • NAVAS, Cássia. Danza nacional en Brasil: aspectos de lo moderno y de locontemporáneo. In: OSSONA, Paulina et al. (Coord.). Itinerario por la Danza Escénica de América Latina. Caracas: CONAC, 1994. P. 33-50.
  • PRUZINSKY, Thomas. Somatopsychic approaches to psychotherapy and personal growth. In: CASH, Thomas; PRUZINSKY, Thomas (Ed.). Body Images: development, deviance, and change. New York: The Guilford Press, 1990. P. 296-315.
  • RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. Bailarino-Pesquisador-Intérprete: processo de formação. Rio de Janeiro: Funarte, 1997.
  • RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. O bailarino-pesquisador-intérprete incorpora uma realidade gestual. In: GREINER, Christine; BIÃO, Armindo (Org.). Etnocenologia: textos selecionados. São Paulo: Editora Annablume, 1999. P.105-108.
  • RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. O Método BPI (Bailarino-Pesquisador-Intérprete) e o Desenvolvimento da Imagem Corporal: reflexões que consideram o discurso de bailarinas que vivenciaram um processo criativo asseado neste método. 2003. 172 f. Tese (Doutorado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2003.
  • RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. Encruzilhada de Sentidos: Avançando com o BPI. In: CONGRESSO ABRACE, 5. 2008, UFMG, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte, 2008. Disponível em: <Disponível em: http://www.portalabrace.org/vcongresso/textos/pesquisadanca >. Acesso em: 23 maio 2016.
    » http://www.portalabrace.org/vcongresso/textos/pesquisadanca
  • RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. As Ferramentas do BPI (Bailarino-Pesquisador-Intérprete). In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL E CONGRESSO BRASILEIRO DE IMAGEM CORPORAL, 1., 2010, UNICAMP, Campinas. Anais... Campinas, 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.fef.unicamp.br/fef/sites/uploads/congressos/imagemcorporal2010/trabalhos/portugues/area3/IC3-28.pdf >. Acesso em: 23 maio 2016.
    » http://www.fef.unicamp.br/fef/sites/uploads/congressos/imagemcorporal2010/trabalhos/portugues/area3/IC3-28.pdf
  • RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. O Corpo Identificado pelo Fluxo de Sentidos. In: REUNIÃO CIENTÍFICA ABRACE, 7., 2013, UFMG, Belo Horizonte. Anais... Belo Horizonte, 2013. Disponível em: <Disponível em: http://www.portalabrace.org/viireuniao/pesquisadanca/RODRIGUES_Graziela.pdf >. Acesso em: 23 maio 2016.
    » http://www.portalabrace.org/viireuniao/pesquisadanca/RODRIGUES_Graziela.pdf
  • RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca; MÜLLER, Regina. Dança dos Brasis: as mulheres das cócoras. Cadernos da Pós-graduação, Campinas, Unicamp, v.8, n.1, p. 129-136, 2006.
  • SCHILDER, Paul. A Imagem do Corpo: as energias constitutivas da psique. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
  • TAVARES, Maria da Consolação Gomes da Cunha Fernandes. Imagem Corporal: conceito e desenvolvimento. São Paulo: Manole, 2003.
  • TEIXEIRA, Paula Caruso. O Santo que Dança: uma vivência corporal a partir do eixo Co-habitar com a Fonte do Método Bailarino-Pesquisador-Intérprete. 2007. 195 f. Dissertação (Mestrado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2007.
  • TEIXEIRA, Paula Caruso. A História das Origens da Criação do Método Bailarino-Pesquisador-Intérprete (BPI) e do seu Desenvolvimento no Primeiro Percurso da sua Criadora (1970-1987). 2014. 316 f. Tese (Doutorado em Artes da Cena) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2014.
  • TURTELLI, Larissa Sato. O Espetáculo Cênico no Método Bailarino-Pesquisador-Intérprete: Um Estudo a Partir da Criação e Apresentações do espetáculo Valsa do Desassossego. 2009. 309 f. Tese (Doutorado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2009.
  • TURTELLI, Larissa Sato; RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. Fina Flor Divino Amor: da gira da Umbanda ao corpo da cena. In: CONFERÊNCIA INTERNACIONAL CORPOS (IM)PERFEITOS NA PERFORMANCE CONTEMPORÂNEA, 2012, Almada. Atas... Almada, Portugal, 2012. P.170-175. (Ed. Ana Maraca, Ana Paula Batalha e Katia Mortari).
  • VILAS, Paula Cristina. Identidades em Multidimensão: pesquisa e método no campo do patrimônio intangível em América Latina. Conceição | Conception, Campinas, Unicamp, v. 1, n. 1, p. 59-74, dez. 2012.
  • 1
    O BPI tem sua principal alocação na Unicamp, aspectos do método são experienciados pelos alunos em disciplinas de cursos de graduação e pós-graduação. O método é vivido na íntegra apenas quando há a escolha da pessoa pelo mesmo, sendo desenvolvido, nesses casos, através de projetos de Trabalhos de Conclusão de Curso, Iniciação Científica, Mestrado, Doutorado, entre outros. O grupo de pesquisa Bailarino-Pesquisador-Intérprete (BPI) e Dança do Brasil, cadastrado no diretório do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), aloja os projetos mencionados.
  • 2
    O Método BPI sustenta-se em três eixos - o Inventário no Corpo, o Co-habitar com a Fonte e a Estruturação da Personagem - e em cinco ferramentas - a Técnica de Dança, a Técnica dos Sentidos, as Pesquisas de Campo, os Laboratórios Dirigidos e os Registros (Rodrigues, 2003RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. O Método BPI (Bailarino-Pesquisador-Intérprete) e o Desenvolvimento da Imagem Corporal: reflexões que consideram o discurso de bailarinas que vivenciaram um processo criativo asseado neste método. 2003. 172 f. Tese (Doutorado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2003. ; 2010RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. As Ferramentas do BPI (Bailarino-Pesquisador-Intérprete). In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL E CONGRESSO BRASILEIRO DE IMAGEM CORPORAL, 1., 2010, UNICAMP, Campinas. Anais... Campinas, 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.fef.unicamp.br/fef/sites/uploads/congressos/imagemcorporal2010/trabalhos/portugues/area3/IC3-28.pdf >. Acesso em: 23 maio 2016.
    http://www.fef.unicamp.br/fef/sites/uplo...
    ).
  • 3
    O termo intérprete será utilizado para designar o artista que está em processo no método BPI. Considera-se intérprete o artista da cena aberto a experienciar em si mesmo toda e qualquer dimensão humana, expandindo dessa maneira a sua capacidade de comunicação com o espectador, pois ele não reproduz ou representa conteúdos e, sim, assume vivê-los em seu corpo.
  • 4
    As pesquisas de campo são o núcleo das experiências do eixo Co-habitar com a Fonte.
  • 5
    Segundo Capra (1982CAPRA, Fritjof. O Ponto de Mutação. Tradução Newton Roberto Eichemberg. São Paulo: Cultrix, 1982., p. 260): "Os sistemas são totalidades integradas, cujas propriedades não podem ser reduzidas às de unidades menores [...] A atividade dos sistemas envolve um processo conhecido como transação - a interação simultânea e mutuamente interdependente entre componentes múltiplos [...] Embora possamos discernir partes individuais em qualquer sistema, a natureza do todo é sempre diferente da mera soma de suas partes".
  • 6
    Segundo Pruzinsky (1990PRUZINSKY, Thomas. Somatopsychic approaches to psychotherapy and personal growth. In: CASH, Thomas; PRUZINSKY, Thomas (Ed.). Body Images: development, deviance, and change. New York: The Guilford Press, 1990. P. 296-315.), os mecanismos de defesa são formas aprendidas para lidar com o mundo, que incluem estratégias cognitivas, emocionais e corporais. Estes mecanismos são empregados repetidamente, internalizados e se tornam inconscientes. Muito depois de a necessi­dade de utilizá-los ter passado, eles continuam atuando.
  • 7
    "Na visão de Schilder [...] a imagem corporal dos seres humanos se constrói a partir da história interna do indivíduo e de suas relações com os outros. Ao longo do desenvolvimento as partes dos corpos dos outros vão fazendo parte da imagem corporal da pessoa (incorporação), assim como as atitudes recebidas em relação a seu corpo vão fazendo parte de sua personalidade (identificação). Um mecanismo importante de ser lembrado aqui é a projeção, pois com frequência se projeta a própria imagem corporal no outro. Há uma intercomunicação de imagens corporais através de partes ou do todo" (Rodrigues, 2003RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. O Método BPI (Bailarino-Pesquisador-Intérprete) e o Desenvolvimento da Imagem Corporal: reflexões que consideram o discurso de bailarinas que vivenciaram um processo criativo asseado neste método. 2003. 172 f. Tese (Doutorado em Artes) - Instituto de Artes, Universidade Estadual de Campinas, 2003. , p. 119).
  • 8
    A identidade corporal, segundo Tavares (2003TAVARES, Maria da Consolação Gomes da Cunha Fernandes. Imagem Corporal: conceito e desenvolvimento. São Paulo: Manole, 2003. , p. 104), está ligada "[...] à vivência e ao reconhecimento de nossas percepções. Isso permite constante coesão dessas percepções e construção de um 'eu corporal' [...] a base do sentido do eu está no reconhecimento do corpo e no desenvolvimento de representações mentais do corpo coerentes com nossa realidade existencial [...] Pelo reconhecimento do mundo externo de forma corporal o sujeito se estrutura como uma identidade corporal".
  • 9
    "O corpo a que nos referimos [...] transcende a soma de todos esses aspectos [corpo e mente, movimentos e percepções, relações afetivas e sociais] pois é um corpo existencial e, por isso, a cada momento se revela inexplicável, fonte inesgotável do 'novo', do 'singular', que, ao mesmo tempo, carrega a vulnerabilidade própria do ser humano" (Tavares, 2003TAVARES, Maria da Consolação Gomes da Cunha Fernandes. Imagem Corporal: conceito e desenvolvimento. São Paulo: Manole, 2003. , p. 118).
  • 10
    Os laboratórios dirigidos são uma das ferramentas do método BPI "[...] são elaborados pelo Diretor de forma individualizada para que ocorra o reconhecimento da memória no eixo Inventário no Corpo, o reconhecimento do material da pesquisa em si mesmo no eixo do Co-habitar com a Fonte e a nucleação da personagem no eixo Estruturação da Personagem" (Rodrigues, 2010RODRIGUES, Graziela Estela Fonseca. As Ferramentas do BPI (Bailarino-Pesquisador-Intérprete). In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL E CONGRESSO BRASILEIRO DE IMAGEM CORPORAL, 1., 2010, UNICAMP, Campinas. Anais... Campinas, 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.fef.unicamp.br/fef/sites/uploads/congressos/imagemcorporal2010/trabalhos/portugues/area3/IC3-28.pdf >. Acesso em: 23 maio 2016.
    http://www.fef.unicamp.br/fef/sites/uplo...
    , p. 2-3).
  • 11
    Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=SinFo62gNDE>. Acesso em: 23 maio 2016.
  • 12
    Imagens corporais são as representações mentais do corpo, relacionadas à identidade corporal, as quais abrangem todas as entradas sensoriais e as experiências vividas, que são processadas e representadas dentro de um aparato de maturação psíquica (Rodrigues, 2003TAVARES, Maria da Consolação Gomes da Cunha Fernandes. Imagem Corporal: conceito e desenvolvimento. São Paulo: Manole, 2003. , p.19). Segundo Schilder (1999SCHILDER, Paul. A Imagem do Corpo: as energias constitutivas da psique. São Paulo: Martins Fontes, 1999. , p.192) "[...] a imagem corporal não é um fenômeno estático, e sim adquirido, construído e estruturado num contato contínuo com o mundo [...] Os processos que constroem a imagem corporal não se dão apenas no campo da percepção mas também têm paralelos com a construção no campo libidinal e emocional".
  • 13
    Tradução dos autores.
  • 14
    Direção de Graziela Rodrigues e Larissa Turtelli, com Carolina Constantino, Igor Manoel, Isadora Buonanni, Juliana Pedroso e Yasmin Berzin.
  • 15
    O conceito de pulsão de morte designa: "[...] uma categoria fundamental de pulsões que se contrapõe às pulsões de vida e que tendem para a redução completa das tensões, isto é, tendem a reconduzir o ser vivo ao estado anorgânico. Voltadas inicialmente para o interior e tendendo à autodestruição, as pulsões de morte seriam secundariamente dirigidas para o exterior, manifestando-se então sob a forma da pulsão de agressão ou de destruição" (Laplanche; Pontalis, 2000LAPLANCHE, Jean; PONTALIS, Jean-Bertrand Lefebvre. Vocabulário de Psicanálise. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2000. , p. 407).
  • 16
    Falas da personagem Graça no espetáculo Graça Bailarina de Jesus ou Sete Linhas de Umbanda, Salvem o Brasil, de autoria de Graziela Rodrigues, João Antônio L. Esteves e Celso Araújo.
  • 17
    Direção de Graziela Rodrigues, com Larissa Turtelli, financiamento Programa de Ação Cultural (ProAC). Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=jxBzgL2Dzno>. Acesso em: 23 maio 2016. Pesquisa de recepção do público ligada ao projeto A Dança em Ato com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP).
  • 18
    Exemplo disponível em: <https://vimeo.com/64434127>. Acesso em: 23 maio 2016.
  • 19
    Carta do babalorixá Raul de Xangô dada a Graziela Rodrigues após a apresentação do espetáculo em sua tenda de Candomblé e Umbanda.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Dez 2016

Histórico

  • Recebido
    26 Maio 2016
  • Aceito
    27 Maio 2016
Universidade Federal do Rio Grande do Sul Av. Paulo Gama s/n prédio 12201, sala 700-2, Bairro Farroupilha, Código Postal: 90046-900, Telefone: 5133084142 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: rev.presenca@gmail.com