Tortura? Como o mecanismo nacional preventivo brasileiro conceitua e analisa práticas de tortura em espaços de privação de liberdade

Autores

DOI:

https://doi.org/10.1590/15174522-95742

Palavras-chave:

tortura, tipificação, Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura

Resumo

A proposta deste artigo é compreender como o Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, órgão do Estado brasileiro em atuação desde 2015, conceitua e analisa as práticas de tortura detectadas em espaços de privação de liberdade visitados no país. Especificamente, pretende-se estudar i) em que circunstâncias este mecanismo identifica determinada violação de direitos como tortura; ii) de que maneira diferencia “tortura” de “maus tratos”; e, por fim, iii) se o órgão estabelece escalas de práticas torturantes, considerando os distintos tipos de estabelecimentos que visitou. A fim de se atingir esses objetivos, foi realizado um estudo dos relatórios produzidos pelo órgão entre 2015 e 2018, o que permitiu concluir que inexiste um padrão de tipificação da prática. A percepção construída pelo órgão sobre tortura é fluida, parecendo estar em disputa e em construção. O artigo propõe que as análises empíricas sobre a atuação do Mecanismo Nacional podem contribuir para a reflexão teórica sobre o fenômeno da tortura, sobretudo no que se refere à questão da prevenção.

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Biografia do Autor

Maria Gorete Marques de Jesus, Universidade de São Paulo

Doutora em Sociologia, pesquisadora de pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade de São Paulo e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo.

Thais Lemos Duarte, Universidade Federal de Minas Gerais

Doutora em Ciências Sociais, pesquisadora de pós-doutorado no Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Universidade Federal de Minas Gerais, pesquisadora do Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública.

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Publicado

2020-12-03

Como Citar

DE JESUS, M. G. M.; DUARTE, T. L. Tortura? Como o mecanismo nacional preventivo brasileiro conceitua e analisa práticas de tortura em espaços de privação de liberdade. Sociologias, [S. l.], v. 22, n. 55, p. 228–260, 2020. DOI: 10.1590/15174522-95742. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/sociologias/article/view/15174522-95742. Acesso em: 19 abr. 2024.