Capacidade civil, interdição e curatela: as implicações jurídicas da Lei n. 13.146/2015 para a pessoa com deficiência mental

Autores

  • Iara Antunes Souza Universidade Federal de Ouro Preto
  • Michelle Danielle Cândida Silva Universidade Federal de Ouro Preto

DOI:

https://doi.org/10.22456/0104-6594.77546

Palavras-chave:

Teoria das Incapacidades, Estatuto da Pessoa com Deficiência, Dignidade Humana, Interdição, Curatela, Direito Privado, Direito Civil, Direitos Humanos, Direitos Fundamentais, Pessoas com Deficiência

Resumo

A pesquisa cuidou da investigação do novo paradigma assentado, a partir do Estatuto da Pessoa com Deficiência, qual seja, o reconhecimento da capacidade civil plena e legal às pessoas portadoras de deficiência mental, que, até então, sempre foram reconhecidas pelas normatizações como incapazes; abarcando, dessa forma, o estudo da despatrimonialização da Teoria das Incapacidades, e a sua compressão calcada numa perspectiva existencialista, que reconhece e tutela a autonomia e a dignidade humana.

Através dos estudos, verificou-se que, até a entrada em vigor do EPD, em geral, o ordenamento jurídico pátrio, embora a regra fosse a capacidade, identificava a pessoa com alguma deficiência de ordem mental como absolutamente incapaz para reger suas vida e bens, e a restrição imposta anulava qualquer possibilidade de expressão da autonomia da pessoa considerada “louca”.

A interdição e a curatela não se adequavam aos ditames constitucionais e a decretação da interdição absoluta – sem qualquer gradação – em razão da existência de alguma doença de ordem mental atingia direitos fundamentais do interditando, pois lhe negava a possibilidade de exercer questões existenciais.

A proteção ofertada sofreu profunda alteração, a partir do Estatuto da Pessoa com Deficiência. O Microssistema Legal estabeleceu que a deficiência não suprime a capacidade, sendo a pessoa com deficiência detentora de capacidade legal (art. 84). O EPD afasta a enfermidade ou doença, por si só, como critério de incapacidade. A fim de concretizar as regras estatutárias, dispositivos do Código Civil de 2002 foram alterados e até mesmo revogados pelo EPD.

O contexto jurídico atual conferiu à curatela nova feição, e, atualmente, ela restringir-se-á apenas às relações de natureza patrimonial do curatelado. Verificou-se, ademais, que o EPD introduziu nova figura para promover a proteção do deficiente, qual seja, a tomada decisão apoiada.

Constatou-se, ainda, que o CPC revogou expressamente dispositivos do Código Civil e que de tais modificações, no entanto, não decorre a inexistência do procedimento de interdição no ordenamento jurídico, visto que é através dele que será conferida a proteção dedicada às pessoas que assim necessitem. 

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Biografia do Autor

Iara Antunes Souza, Universidade Federal de Ouro Preto

Doutora e Mestra em Direito Privado pela PUC Minas. Especialista em Direito Processual e Direito Civil. Pesquisadora do Centro de Estudos em Biodireito – CEBID. Professora da Graduação e da Pós-Graduação do Departamento de Direito da Universidade Federal de Ouro Preto. Chefe do DEDIR/EDTM/UFOP. Advogada do NAJOP/UFOP. Vice Coordenadora do Comitê de Ética em Pesquisa da UFOP. Membro do IBDFAM MG e da comissão de Direito de Família da OAB MG.

Michelle Danielle Cândida Silva, Universidade Federal de Ouro Preto

Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Ouro Preto.

Pós-Graduanda em Direito Público. 

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Publicado

2017-12-31

Como Citar

SOUZA, I. A.; SILVA, M. D. C. Capacidade civil, interdição e curatela: as implicações jurídicas da Lei n. 13.146/2015 para a pessoa com deficiência mental. Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, Porto Alegre, v. 1, n. 37, 2017. DOI: 10.22456/0104-6594.77546. Disponível em: https://seer.ufrgs.br/index.php/revfacdir/article/view/77546. Acesso em: 28 mar. 2024.