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Crise da Representação, Virada Performativa e Presença: possibilidades rumo a uma Filosofia-Performance

Resumo:

Discute-se aqui a chamada Crise da representação como marca do teatro ocidental e da modernidade. Sua possibilidade de superação, como hipótese central, perpassaria a emergência de um novo paradigma caracterizado por uma virada performativa - no qual performance é entendida em sentido amplo, derivado do Performance Studies. Como referencial teórico utiliza-se, em caráter geral, a ampla bibliografia de autores como Artaud, Derrida, Gumbrecht e Féral e, em caráter específico, no âmbito da Performance Philosophy, de autores como Cull, Grant e outros, evidenciando que explicitar esse novo campo é discutir, também, suas tarefas futuras em direção àquilo que chamamos de uma possível hermenêutica da presença.

Palavras-chave:
Crise da Representação; Theatrum Mundi; Performance; Virada Performativa; Filosofia-Performance

Abstract:

In this paper, the so-called Crisis of Representation is discussed as a hallmark of Western Theatre and Modernity. The key hypothesis of overcoming such a crisis is investigated through the emergence of a performative turn, in which performance is understood in a broader sense derived from Performance Studies. To address this, the paper builds on authors such as Artaud, Derrida, Heidegger, Gumbrecht and Féral for a general theoretical background, and on the work of authors such as Cull, Street and others for a more specific approach concerning the field of Performance Philosophy. This paper argues that a philosophical turn in Performance Studies has happened through a radicalization of ‘Presence’.

Keywords:
Representation Crisis; Theatrum Mundi; Performance; Performative Turn; Performance Philosophy

Résumé:

Dans cet article, la soi-disant crise de représentation est discutée comme une caractéristique du théâtre occidental et de la modernité. L’hypothèse clé de surmonter la crise par l’émergence d’un virage performatif a été étudiée, dans lequel la performance est comprise au sens large par les études de performance. À cette fin, nous nous référons à des auteurs tels que Artaud, Derrida, Heidegger, Gumbrecht et Féral comme cadre théorique général, et à des auteurs tels que Cull, Street et d’autres pour une approche plus spécifique dans le contexte de la philo-performance. Cet article soutenait qu’un tournant philosophique dans les études de performance s’est produit par une radicalisation de la ‘présence’.

Mots-clés:
Crise de la Représentation; Theatrum Mundi; Performance; Virage Performatif; Philo-Performance

À guisa de Introdução...

Comecemos do final: Performance Philosophy11 1 A este respeito consultar a belíssima introdução ao campo e seus desafios, escrita por Laura Cull, que abre este dossiê. . Este termo, de origem inglesa, é de tradução complexa em qualquer língua neolatina, como o português ou o espanhol. Se a princípio poderia parecer indicar algo como uma Filosofia da Performance, a verdade é que seu sentido vem se construindo de forma ampla, se fortalecendo ao longo da última década como um campo que, se não responde - e nem pretende responder - totalmente a pergunta O que é performance?, com certeza a recoloca de forma tão radical que múltiplas e impensadas possibilidades ganharam força. Possibilidades que nos permitem pensar, por exemplo, desde a própria Filosofia como um tipo de Performance (performance do pensamento?) a, sobretudo, uma Performance que é, também, uma forma de filosofar (Cull; Lagaay, 2014CULL, Laura; LAGAAY, Alice (Org.). Encounters in Performance Philosophy. Performance Philosophy Books series. London: Palgrave Macmillan, 2014.; Street; Alliot; Pauker, 2017STREET, Anna; ALLIOT, Julien; PAUKER, Magnolia (Org.). Inter Views in Performance Philosophy: Crossings and Conversations. Performance Philosophy Books series. London: Palgrave Macmillan , 2017. - dentre outros autores), se antes, é claro, nos permitirmos ir além da lógica moderna e das categorias tradicionais do pensamento dito racional.

Filosofia e Performance - ou performar e filosofar - podem, hoje, ser vistos como inextricavelmente conectados. Em ambas as disciplinas, por exemplo, a questão da relação com o real e com o que se faz presente permanece aberta. Novas perspectivas ainda estão se abrindo, em que o pensamento é sempre necessariamente incorporado, isto é, profundamente enraizado no corpo e no mundo, e destes inseparável. Com isso, novas questões, como por exemplo Como a Performance pensa?, dentre outras, estão sendo recolocadas a partir desse novo âmbito que se propõe a pensar para além das dicotomias e estruturas construídas na Modernidade.

Nos últimos 10 anos, alguns pesquisadores, originalmente dentro dos Estudos da Performance (Performance Studies), bem como outros tantos expatriados da Filosofia, expandiram de tal forma o conceito de Performance (que há muito se deslocou dos Estudos do Teatro, por exemplo) que já não é mais possível pensar a Filosofia simplesmente como um método a ser analiticamente empregado no estudo da performance. A independência da performance como campo de estudos, na perspectiva que será desenvolvida aqui, se insere dentro do que considero uma mudança maior de paradigma, na qual a própria pergunta O que é Filosofia? acaba, também, por precisar ser recolocada.

Tais questões implicam no nascimento de um novo campo de estudos - não se trata de uma nova Filosofia da Performance, mas sim de algo radicalmente outro, mais do que uma virada dentro dos Estudos da Performance, um novo campo de pesquisa, investigação e prática artística surge: Filosofia-Performance, propositalmente escrito aqui em português com hífen, de modo a manter a miríade de relações possíveis entre ambos os termos propositalmente em aberto - a Filosofia como Performance; a Performance como Filosofia. Talvez uma Performosofia12 2 Antes de seguirmos adiante, uma nota de tradução se faz ainda necessária. O uso do termo filo-performance (Philo-Performance), por exemplo, já se faz presente em alguns textos em língua francesa (Marrou et al., 2015). Contudo, tenho algumas reticências quanto a seu uso, uma vez que enfatiza mais a philia – ou a busca pelo conhecimento que não se tem – do que propriamente a sophia. Um neologismo mais adequado poderia ser, ao contrário, Performosofia, já que no latim canônico performo remete a algo que ganha forma/se forma através ou por meio de. Essa expressão, então, assim como a filosofia, aponta para uma busca da verdade (a sophia) mas que pode encontrar outras formas de expressões e desvelamento que não dependam apenas do nous, como os gregos denominavam o puro pensamento. Ainda que não faça referência ao uso da expressão Performosofia, indico, para reflexão acerca das diferentes possibilidades de o conhecimento acontecer, além do pensamento abstrato puro (nous), o texto de Stuart Grant (2019) sobre a Performance e os diferentes tipos/possibilidades de conhecimento no mundo grego antigo, no qual ele associa, por exemplo, a Phronesis aristotélica a uma possibilidade de resposta sobre como a performance pensa. Aliás, observo ainda que agradeço a Will Daddario e nossa troca de e-mails pela sugestão inicial que me fez pensar na possibilidade desse neologismo em língua portuguesa. ?

Filosofar e Performar se mostrariam assim tão necessariamente interligados que não podemos pensar senão na hipótese de emergência de uma nova perspectiva, de algum modo relacionado àquilo que Josette Féral nomeou como Performatividade em oposição a uma Teatralidade. No artigo seminal a que me refiro, Féral (2002) relacionaram filosofia e teatro, ou, mais especificamente, fenomenologia e teatralidade, discutindo-os através de duas possibilidades: primeiro, a partir de um tipo de atitude intencional (o olhar do expectador) que enquadra o cotidiano e o desloca, abrindo uma fenda - como um tipo de relação de alteridade com o real, separando o dentro e o fora da representação. Nesse sentido, a representação teatral se mostra como um outro, ou um duplo da realidade, e se estabelece necessariamente como ficção e crise do real, e é o olhar que estabelece, podemos dizer, a própria teatralidade, tendo na ilusão metafórica do proscênio uma fissura radical. Contudo, a autora também discute, sobretudo em outros textos (2015), uma segunda possibilidade, denominada Performatividade e que se dá, justamente, a partir do paradigma emergente (no século XX) da Performance Art, no qual o corpo do performer e a imediatez da arte como obra abrem uma possibilidade diferente de relação com o mundo, que ao invés de ficcionar o real, duplicando-o, busca, ao contrário, presentificá-lo, torná-lo presente - o abrindo em sua verdade.

É a esta possibilidade imediata de presentificação, a ser discutida dentro do arcabouço teórico de uma Filosofia-Performance, que dedicamos este artigo. Feitas estas considerações iniciais, temos o escopo necessário - que polariza, justamente, teatral e performativo - para rediscutir a já tão debatida crise da modernidade (já apontada e diagnosticada por Husserl, Heidegger e Nietzsche, dentre outros) e que agora pode ser recolocada dentro da perspectiva que aqui propomos discutir: como a crise de uma ficção/representação do mundo e possibilidade de superação dessa crise dentro de um paradigma hermenêutico-fenomenológico amplo, que recoloca a arte para além da estética, e que vem se fortalecendo ao longo do século XX, se fazendo presente no trabalho de diversos artistas e performers.

A crise da modernidade como crise da representação é, como pretendemos discutir, a crise de uma certa ficção de mundo subjacente à própria crise - ou fenda - estabelecida por um conceito expandindo de teatralidade. Como veremos a seguir, é bem conhecida a metáfora barroca de um Theatrum Mundi (o grande Teatro do mundo), que fabula a realidade ao comparar o real a um palco. Presente em Shakespeare e Calderón de la Barca, dentre outros, essa ideia se coaduna com a desconfiança moderna quanto ao real, reforçando a impossibilidade metafísica de se conhecer a ‘verdade´, que estaria nos bastidores ou por trás da realidade.

Contudo, esta metáfora - de um Theatrum Mundi, mundo como representação - pode (e deve) ser revisitada, agora à luz de uma virada performativa em direção à presença e à possibilidade do corpo como lugar da epifania da verdade - esta, inclusive, é a hipótese de trabalho deste artigo, agora explicitada de forma clara - a ser desenvolvida dentro da fortuna crítica já acumulada pelos estudos de Filosofia-Performance13 3 Sobre a fortuna crítica já acumulada pelos estudos em Filosofia-Performance, esta se concentra, atualmente, sobretudo em torno de três fontes: o site da própria rede de pesquisadores internacionais, disponível em <http://performancephilosophy.ning.com/>; a série de livros sobre o tema editada pela Palgrave Macmillan, já com 19 títulos publicados e que pode ser conferida em <https://www.palgrave.com/gp/series/14558>; e, principalmente, o Performance Philosophy Journal <https://www.performancephilosophy.org/journal>, periódico online internacional editado desde 2015. .

Feito este longo introito, sigamos adiante.

Sobre Velhas Metáforas e a Crise da Modernidade

Agora sim, chegamos ao início. Na Modernidade, se fará bem conhecida a metáfora de um Theatrum Mundi (o Grande Teatro do Mundo), que fabula a realidade ao comparar o real a um palco. Faz-se já presente em Shakespeare, na peça Como Gostais, de 1603

Todo o mundo é um palco; E todos os homens e mulheres meros atores o são Com suas deixas, entradas e saídas Muitos papéis a cada um atribuídos em seu tempo (Shakespeare, 1994SHAKESPEARE, William. The complete works. Oxford: The Shakespeare head press; New York: Barnes & Noble, 1994., p. 622).

E se consolida, sobretudo, com Calderón de la Barca, autor espanhol que escreve, cerca de trinta anos depois, em 1634, uma peça literalmente chamada O Grande Teatro do Mundo (1990CALDERÓN DE LA BARCA, Pedro. The Great Theatre of the World. Adapted by Adrian Mitchell. London: Dramatic Publishing House, 1990.), na qual o Criador, a criação e as criaturas se encontram antes do abrir das cortinas, em um exercício de Metateatro, no qual Deus, a partir de um enredo de sua autoria, distribui papéis (o Rei, os Servos, o Rico, a Formosura, o Lavrador, o Mendigo etc.). A peça acaba quando os personagens partem para adentrar o palco - o mundo. Como nos alerta Luis Felipe Lima e Ricardo Valle (2008LIMA, Luis Felipe; VALLE, Ricardo. Introdução à vida é sonho. In: CALDERON DE LA BARCA, Pedro. A vida é sonho . São Paulo: Hedra, 2008. P. 9-29., p. 15), em artigo sobre Calderón de la Barca “Tanto o sonho como o teatro, usados como exemplum, deviam alertar aos homens acerca dos enganos do mundo vivido”.

A partir do teatro barroco, o sonho como metáfora se fará cada vez mais presente na modernidade. De Sonho de uma Noite de Verão, de Shakespeare, de 1605, a A vida é sonho, outra peça de Calderón de la Barca, de 1635, e seus célebres versos:

Que é a Vida? Um frenesi. Que é a vida? Uma ilusão Uma sombra, uma ficção O maior bem é tristonho Porque toda a vida é sonho E os sonhos, sonhos são (Calderón de la Barca, 2008CALDERÓN DE LA BARCA, Pedro. A vida é sonho. São Paulo: Hedra, 2008., p. 75).

Temos assim que o sonho, no repertório do século XVII, é comparável ao teatro: ambos apresentam um desfile de imagens fictícias, fantasmagorias, ilusões - ainda que estas possam ser, de algum modo, relacionadas à realidade, não são reais. Pensar o mundo sensível como algo fictício e enganoso, e por isso comparável ao sonho e ao teatro, tem uma longa genealogia: remete-se, claro, já a Platão e sua A Alegoria da Caverna, mas, mais diretamente, a uma longa tradição ocidental - neoplatônica e cristã - que interpretará Platão à luz de suas próprias crenças, considerando as coisas do mundo como enganos dos sentidos, reflexos imperfeitos da Verdade (que seria de outra ordem da realidade, pertencente a outro mundo, divino - anterior e posterior ao abrir das cortinas). Aquilo que os sentidos captam não é o real, mas seu duplo.

Menos de uma década depois de A vida é Sonho, tal inquietação barroca (que tensiona ficcional e real) seria recolocada, agora em forma definitivamente filosófica, por René Descartes na primeira de suas Meditações (1641)14 4 Adrien Baillet, seu primeiro biógrafo, remete a origem do argumento a uma serie de sonhos tida pelo autor em 1619 e registrada em seus diários. :

Quantas vezes me ocorreu de sonhar, à noite, que eu estava neste lugar, que eu estava vestido, que eu estava perto do fogo, ainda que eu estivesse inteiramente nu em meu leito? [...] E, detendo-me neste pensamento, eu vejo tão manifestamente que não há quaisquer indícios conclusivos, nem marcas suficientemente certas pelas quais eu possa distinguir nitidamente a vigília do sonho, que fico inteiramente pasmo; e minha estupefação é tanta que sou quase capaz de me persuadir que durmo... (Descartes, 1999DESCARTES, René. Meditações. In: DESCARTES, René. Descartes: vida e obra. São Paulo: Nova Cultural, 1999. (Coleção Os Pensadores)., p. 251).

Em Descartes, todavia, o argumento do sonho se tornará uma artimanha retórica que apenas parece conduzir a um ceticismo radical. Do ponto de vista da história da metafísica, Descartes é aquele que, através da dúvida hiperbólica, conduz esta (a metafísica) a um novo patamar de radicalidade, graças à virulência de sua argumentação, ao enfatizar que nossas experiências não passam de impressões dos sentidos, não havendo nenhuma diferença substancial entre o sentir, o imaginar sentir ou o sonhar estar sentindo. Descartes (1999, p. 257-258) submete tudo à dúvida:

Presumo então que todas as coisas que vejo são falsas. Fixo-me bem que nada existiu de tudo o que minha memória me representa. Penso não ter nenhum órgão de sentidos. Creio que o corpo, a figura, a extensão, o movimento e o lugar são invenções do meu espírito. Então, o que posso considerar verdadeiro?.

A solução que Descartes encontra é a consciência de si como ser pensante, o famoso cogito que santo Agostinho propusera bem antes, na Cidade de Deus, agora ainda mais radical. Um cogito tão absoluto em si mesmo que, embora não possa duvidar que seja uma coisa que duvida, nem a certeza de sua própria corporalidade tem. Como sair de tamanho solipsismo? Como estabelecer, seguramente, que o mundo exterior também existe, que se tem um corpo e que este não é apenas uma representação do eu? Isso se torna um salto impossível. Descartes, como Agostinho, só consegue realizá-lo passando pela ideia de Deus.

Descartes (1996DESCARTES, René. Meditations on First Philosophy. Cambridge: Cambridge University Press, 1996.), ao considerar o cogito como a certeza de sua própria existência continuada, torna todas as coisas do mundo, e até mesmo seu próprio corpo, em ideias ou representações do mundo, captadas pelos sentidos e cuja validade não pode ser assegurada, sem que se recorra à existência de Deus - o “grande fiador metafisico” - para serem verdadeiras.

Curiosamente, o teatro terá seu próprio fazer também afetado pela perspectiva trazida pelo pensamento cartesiano e se estruturará e hierarquizará na modernidade de forma bem específica, como Gumbrecht explica:

É interessante ver como, durante o século XVII, especialmente em Paris, a forma cênica da commedia dell'arte [...] competia com um novo estilo de teatro francês. [...] Nas tragédias de Corneille ou de Racine, os atores dispunham-se em semicírculo no palco e recitavam textos muito abstratos, na forma pesada do verso alexandrino. Nenhum outro estilo teatral, antes ou depois, foi mais ‘cartesiano’ [...] Descartes - contemporâneo de Racine e de Corneille - foi o primeiro a tornar [...] a existência humana [...] explícita e exclusivamente dependente da capacidade de pensar; em consequência disso, ele subordinou não só o corpo humano, mas todas as coisas do mundo [...] ao pensamento (Gumbrecht, 2004GUMBRECHT, Hans-Ulrich. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto, 2004., p. 54).

Na outra ponta do arco historial metafísico da Modernidade temos Antonin Artaud, vanguardista célebre por pensar justamente a relação do teatro com o que denomina seu duplo, questionando a perspectiva necessariamente metafísica como marca do teatro ocidental. Derrida (1995DERRIDA, Jacques. O Teatro da crueldade e o fechamento da representação. In: DERRIDA, Jacques. A Escritura e a Diferença. São Paulo: Perspectiva, 1995. P. 149-178.), em seu texto O Teatro da Crueldade e o Fechamento da Representação, aprofunda a discussão em torno dessa problemática e sua relação com o pensamento de Antonin Artaud, que ele vê como o grande diagnosticador da decadência ocidental. Podemos assim dizer que Artaud (2006ARTAUD, Antonin. O teatro e seu duplo. São Paulo: Martins Fontes, 2006.), em seu livro O Teatro e seu Duplo (1936), inverte, de forma precursora, a metáfora do Theatrum Mundi, pois não vê o teatro como metáfora do real, mas antes o contrário: o fazer cênico é que responde à visão de mundo moderna, e de fato a duplica. O teatro se tornara o microcosmo da hierarquização metafísica de mundo (o macrocosmo). O palco moderno é teológico, hierarquizado e textocêntrico (que é o mesmo que dizer logocêntrico) e, como tal, num jogo de espelhos, se fez um duplo do próprio real.

O palco é teológico enquanto a sua estrutura comportar, segundo a tradição, os seguintes elementos: um autor-criador que, ausente e distante, armado de um texto, vigia, reúne e comanda o tempo ou o sentido da representação [...]. Atores (são) intérpretes subjugados que representam personagens [...], [representando] mais ou menos diretamente, o pensamento do ‘criador’ (Derrida, 1995DERRIDA, Jacques. O Teatro da crueldade e o fechamento da representação. In: DERRIDA, Jacques. A Escritura e a Diferença. São Paulo: Perspectiva, 1995. P. 149-178., p. 154).

Duplo do duplo, distante ainda mais do real e da verdade. Pura fantasmagoria de um juízo de deus não acabado - sonho platônico realizado. E assim chegamos ao cerne deste artigo: o teatro moderno, assim como as demais construções da modernidade está em crise porque é essencialmente metafísico, outro duplo fantasmagórico do real. Mas nós vivemos no tempo do niilismo: tal como em Esperando Godot (1953), peça de Samuel Beckett (2008BECKETT, Samuel. The Complete Dramatic Works. London: Faber and Faber, 2008.), o teatro esperaria por alguém que não está lá - e jamais irá chegar. Ou como Shakespeare, sempre atual, preconizara, na cena V, ato V, de Macbeth

E todos os nossos ontens não fizeram mais que iluminar para os tolos o caminho que leva ao pó da morte. [...] A vida não passa de uma sombra que caminha, um pobre ator que se pavoneia e se aflige sobre o palco - faz isso por uma hora e, depois, não se escuta mais sua voz. A vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria, significando nada (Shakespeare, 1994SHAKESPEARE, William. The complete works. Oxford: The Shakespeare head press; New York: Barnes & Noble, 1994., p. 882).

A pergunta que temos que fazer aqui é: por que a vida acaba por significar nada na modernidade? Por que a história da metafísica acabaria por necessariamente conduzir ao niilismo, onde nada vale nada e a vida não tem valor em si mesma?

O século XX testemunhou a ascensão do pensamento científico como razão instrumental, o crescimento maciço das cidades, o advento das massas e duas guerras mundiais. A metafísica, na perspectiva heideggeriana, é o grande arcabouço da filosofia ocidental, que, embora em ruínas e em crise, ainda permanece de algum modo determinante da visão de mundo ocidental. Este período de crise pode ser melhor compreendido a partir do diagnóstico genealógico de Nietzsche, tanto na sua crítica fundamental ao racionalismo como na sua suposição de niilismo. Niilismo é, em sua análise, uma característica epocal dos tempos modernos, que se mostra como uma enorme perda de sentido e propósito - a grande perda de todo significado maior. A morte de Deus, preconizada no pensamento nietzschiano, seria, para Heidegger (1978HEIDEGGER, Martin. Nietzsche I und II, GA 06. Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1978. ), uma experiência coletiva corrente no século XX.

A crise da metafísica como niilismo é uma crise percebida e tematizada incessantemente ao longo do século XX, por autores como Husserl e seus herdeiros, como os já citados Heidegger e Derrida, e também por muitos outros, como Foucault (1976FOUCAULT, Michel. Ceci n’est pas une pipe. October Journal, Massachusetts, The MIT Press, v. 1, p. 6-21, Spring 1976. ), Badiou (2002BADIOU, Alain. Pequeno Manual de Inestética. São Paulo: Estação Liberdade, 2002. ) e Gumbrecht (2004GUMBRECHT, Hans-Ulrich. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto, 2004.) - autores que, ainda que apresentem diferenças no diagnóstico (e prognóstico) da época contemporânea, tentam compreender e pensar para além de sua crise. Esta se põe também, nos termos aqui explicitados, como Crise da Representação: crise na qual o nexo entre as palavras (a representação) e as coisas (o representado) parece ter se perdido - e isso não é um cachimbo, diria Foucault ao ecoar Magritte (1976)15 5 A crise da representação, importante dizer, se mostra aqui, então, também como crise da episteme moderna, se produzindo nos mais diversos campos, do metafísico ao estético – e também no político, uma vez que vivemos, ainda, no tempo do niilismo: um tempo indigente e espetacularizado no qual (não posso deixar de mencionar) o simulacro parece substituir o real até mesmo através de fake news. Esse é um tópico sobre o qual, apesar de extremamente atual, não iremos nos estender. Contudo, não deixa de ser curioso observar que a modernidade, na era da técnica, tensionou o ficcional e o real de tal forma que, no momento máximo de sua crise (que mais do que pós-moderna deveria ser considerada como hiper-moderna: o exagero e a maximização das categorias que ainda não conseguimos totalmente ultrapassar), a ficção se potencializou ao máximo a partir da crise da representação, uma vez que a representação não mais precisa corresponder a nada de real – não foi só o fiador metafísico que desapareceu. Jogou-se o bebê fora com a água do banho. Se a era da técnica é a era da indigência, também é a era na qual teríamos perdido o nexo final entre representação e a coisa representada? Como sair desta aporia? .

Enfim, ao falar da crise da representação e da possibilidade de sua superação, Gumbrecht (2004GUMBRECHT, Hans-Ulrich. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto, 2004., p. 70) enfatiza que

[...] nenhum pensador foi mais longe na crítica e na revisão da visão de mundo metafísica do que Martin Heidegger, iniciado com a publicação de Ser e Tempo em 1927, esse esforço logo atraiu a atenção internacional. Heidegger substitui o paradigma sujeito/objeto pelo novo conceito de ‘ser-no-mundo’, que, por assim dizer, deveria devolver a autorreferência humana ao contato com as coisas do mundo [...]. Contra o paradigma cartesiano, Heidegger reafirmava a substancialidade e as dimensões espaciais da existência humana, [e com isso] ele começou a desenvolver a ideia de um ‘desvelamento do Ser’.

Temos assim que o problema da verdade para Heidegger (1997HEIDEGGER, Martin. Vom Wesen der Wahrheit. In: HEIDEGGER, Martin. Wegmarken, GA 9. Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1997.) e seus herdeiros não se apresentará mais como a necessidade de transposição do abismo metafísico entre sujeito e objeto, mas antes como já sendo o esvaziamento desse abismo, na medida em que a autorreferencialidade humana aponta, também, para a vida em sua totalidade, a “vida naquilo que ela tem de irrepresentável” - o irrepresentável aqui como uma dimensão necessária e constitutiva: alètheia16 6 Stuart Grant, aliás, toma a apropriação da alètheia grega por Heidegger como “um exemplo revelador: “[...] o gestual fenomenológico característico de Heidegger pode ser reduzido a uma postura [que é] performativa. [...] Em seus primeiros textos e conferências, Heidegger, em sua redefinição dos gregos, tentou resolver o problema da diferença ontológica por meio de uma virada rumo ao ainda por ser elaborado conceito de performativo” (Grant, 2019, p. 77). grega revisitada, como veremos a seguir.

O Corpo como Acontecimento: o irrepresentável como dimensão constitutiva

Gumbrecht também coloca que

Durante várias décadas, pesquisadores de diferentes áreas apontaram, às vezes com gestos dramáticos de lamento ou de remorso, a perda de uma (crença numa) referência ao mundo. [...] Ao mesmo tempo, pensadores ferozes e artistas de gestos loucos, como [...] Antonin Artaud, acusavam a cultura ocidental de ter perdido também o contato com o corpo humano (Gumbrecht, 2004GUMBRECHT, Hans-Ulrich. Produção de Presença: o que o sentido não consegue transmitir. Rio de Janeiro: Contraponto, 2004., p. 70).

De fato, Antonin Artaud foi uma das mais emblemáticas figuras no cenário artístico do início do século XX, signatário do primeiro Manifesto Surrealista (1924) e seu maior entusiasta no teatro. Suas ideias seriam altamente profícuas e acabariam por transformar radicalmente o fazer cênico ocidental na segunda metade do século XX (Artaud; Sontag, 1988ARTAUD, Antonin; SONTAG, Susan (Org). Antonin Artaud: Selected Writings. Berkley: University of California Press, 1988. ). Artaud quis desconstruir as categorias e hierarquias tradicionais do espetáculo, que considerava esvaziados de sentido, quis romper por exemplo com a separação plateia/palco, tirar o público de seu lugar confortável de espectador passivo em prol de um novo teatro, que denominou Teatro da crueldade. No teatro da crueldade, mais do que o texto, o grito, a voz, a respiração e o gesto, o corpo se torna o lugar primordial do ato teatral, a abrir o espaço cênico: o corpo como o acontecimento poético que o habita, a epifania do corpo. Artaud prioriza, em termos simples, o gesto a voz em sua intensidade física, habilitando o corpo humano àquilo que ele denomina como hieróglifos - figuras materiais cujo significado jamais se esgota e nem podem ser banalizadas através de uma única interpretação.

Por que a vida, em sua totalidade, é irrepresentável, como colocara Derrida (1995DERRIDA, Jacques. O Teatro da crueldade e o fechamento da representação. In: DERRIDA, Jacques. A Escritura e a Diferença. São Paulo: Perspectiva, 1995. P. 149-178.) acerca de Artaud? E isso gera uma segunda questão: é possível pensar uma arte que não seja tão somente representação - e por extensão de sentido -, imitação ou sombra de nada? Que não represente, nem apresente17 7 Importante notar que há uma ambivalência neolatina (logo, também existente em língua portuguesa e da qual nos valemos) quanto ao uso do termo representação, que encontra sua origem na repraesentatio da filosofia medieval. Essa questão tem, em língua alemã, nuances mais peculiares, uma vez que há uma diferenciação entre Vorstellung e Darstellung, conceitos que podem ser traduzidos por representação – ou apresentação, dependendo do contexto. Darstellung no geral se relaciona ao fazer teatral (e aos conceitos da estética em geral) como apresentação, já a Vorstellung, por sua vez, é mais restrito à representação como representação mental ou propositiva, verdade representacional. , mas torne presente? Que a virada em direção à presença se torne uma linha de fuga ao niilismo e à crise da representação na era da técnica, eis a resposta que a emergência de um campo como o da Filosofia-Performance parece buscar. Esse campo de questionamento traz em si a possibilidade de pensar o corpo e suas possibilidades não apenas na tradição, como imagem e representação, mas sobretudo para além de quaisquer determinações metafísicas ou dicotômicas, rumo à possibilidade de um corpo que possa ser o evento poético que o atravessa: a epifania da verdade (como alètheia) no corpo.

Temos assim que, dentre as muitas características da performance (art), podemos por um lado enfatizar o papel central dado ao corpo do performer, considerado como elemento fundador e indispensável de todo ato performativo, capaz de abrir um espaço e instituir uma relação “entre o artista e os espectadores, os espectadores e a obra de arte, a obra de arte e o artista” (Féral, 2015FÉRAL, Josette. Além dos limites: teoria e prática do teatro. São Paulo: Perspectiva, 2015., p. 155). Uma performance vem a ser, pela copresença corporal entre atores e espectadores, pelas relações espaciais e temporais que estabelece - pelo topos hermenêutico que compartilha, imediatez da presença18 8 Uma observação aqui se faz necessária: Imediatez da presença se refere à possibilidade de compreensão no sentido da Befindlichkeit (disposição de ânimo ou afetividade) e da Verstehen (compreensão) heideggeriana: uma experiência imersiva, pré-teórica (e pré-predicativa), que se faz possível a partir do horizonte de um mundo de referenciais compartilhados na forma de um tipo de afetação ou atmosfera (Stimmung) que ressoa entre aqueles que os compartilham. Nós sentimos o mundo antes de interpretá-lo, vivemos no lusco-fusco de sua ambiência: isso não significa ausência de referenciais, pelo contrário. Pensar a imediatez da presença como êxtase se distancia da visão metafísica moderna e dicotômica: somos no mundo, sentimos o mundo, e somos à medida que sentimos, sem separação ou possibilidade outra que não a de ser esse ser aberto que nos atravessa. O pensamento heideggeriano serve aqui de ponto de partida para pensarmos essa possibilidade de verdade não como representação, mas como puro aparecimento ou desvelamento poético do ser: alètheia. Tentar pensar a partir daquilo que se faz presente, a partir necessariamente desse horizonte não metafísico nos possibilita, ainda, recolocar o sentido de palavras desgastadas pela tradição, tais como êxtase, corpo, presença, que apontam, assim, não mais em direção a uma transcendência vazia, mas à pura imanência (Heidegger, 1977; 1994; 1995). . E, como coloca Tilottama Rajan (1995RAJAN, Tilottama. L’anguage, Music and the Body: Nietzsche and deconstruction. In: RAJAN, Tilottama; CLARK, David. Intersections: Nineteenth-Century Philosophy and Contemporary Theory. Albany: State University of New York Press, 1995. P. 147-169. , p. 150) “[...] a imediatez da presença é talvez a imediatez de um êxtase - uma imediatez cuja base é fenomenológica antes de ser metafisica”.

Como não conectar a imediatez da presença, epifania do corpo, com a própria ideia de um acontecimento performativo? Nas palavras de Féral,

[...] por esse fato mesmo, a relação do artista com sua própria performance não é mais a do ator com seu papel. Recusando-se a ser protagonista, o performer não apresenta a si mesmo, assim como não se representa. Sua presença se torna antes fonte de produção [Poiesis], de deslocamento. Convertido no lugar de passagem de fluxos energéticos (gestuais, vocais, libidinais etc.) que o atravessam sem jamais se imobilizar em um sentido ou em uma representação dada, seu jogo de atuação é o de fazer os fluxos operarem, captar as redes. Esses gestos que ele executa não desembocam em nada a não ser nos fluxos de desejo que os põem em ação (Féral, 2015FÉRAL, Josette. Além dos limites: teoria e prática do teatro. São Paulo: Perspectiva, 2015., p. 159).

A performance presentifica a verdade do corpo naquilo mesmo que este tem de abissal e contraditório, hieróglifo não-redutível a uma representação unívoca. Pensar uma hermenêutica da presença se mostra, assim, como uma possibilidade futura: o corpo, matriz de significados, se faz arte - lugar de passagem, de tensões, de epifanias possíveis de sentido e significado, capaz de apontar para o irrepresentável e, ao invés de apagá-lo, negá-lo, o abarcar em uma luta (Urstreit) que é também um êxtase. Produção poética sim, mas no sentido da poiesis heideggeriana: capaz de produzir sentidos, aberta à compreensão e à interpretação, em sentido hermenêutico (Heidegger, 1977HEIDEGGER, Martin. Der Ursprung des Kunstwerkes. In: HEIDEGGER, Martin. Holzwege, GA 05. Frankfurt am Main: Vittorio Klosterman, 1977.).

Algumas Considerações (inconclusivas)

Dando um passo para trás nesta discussão, enfatizamos que Performance é um conceito extremamente alargado e, não podemos esquecer, fortemente marcado pela definição de amplo espectro dada por Richard Schechner (2002SCHECHNER, Richard. Performance Studies, an introduction. London: Routledge , 2002.). E que

[...] não há como negar que o campo de estudos do teatro [já] passou por uma mudança de paradigma. O advento dos estudos do teatro já foi uma inovação para além do estudo do drama pois enfatizou que o sentido do teatro é produzido não somente por meio de seus textos, mas através de todas suas significações e práticas - incluindo treinamento, uso do espaço e tecnologia, estilo de performance e cenografia, por exemplo. Neste contexto, os estudos da performance tornaram-se interdisciplinares, cruzando as belas artes e outros campos críticos tais como feminismo, sociologia e filosofia. Os estudos da performance introduziram novas preocupações críticas [...] que incluem vivacidade e efemeridade da performance [o imediatismo da presença] e novas práticas críticas (Allain; Harvie, 2006ALLAIN, Paul; HARVIE, Jen. The Routledge companion to Theatre and Performance. London: Routledge, 2006., p. 14).

Ao que, recentemente, Street, Alliot e Pauker (2017STREET, Anna; ALLIOT, Julien; PAUKER, Magnolia (Org.). Inter Views in Performance Philosophy: Crossings and Conversations. Performance Philosophy Books series. London: Palgrave Macmillan , 2017., p. 11) reforçaram, “[...] a própria emergência de uma filosofia-performance é em si mesma habilitada pelo desenvolvimento do paradigma da performance e suas aplicações”.

Neste breve texto buscou-se apresentar a crise da modernidade como a crise de uma ficção/representação do mundo e sua tentativa de superação dentro de um paradigma hermenêutico-fenomenológico amplo, que recoloca a arte para além da estética e que vem se fortalecendo ao longo do século XX e se faz presente no trabalho de diversos artistas e performers - dos quais destacamos o caráter seminal de Artaud.

Ao se pensar na emergência de um novo paradigma, velhas dicotomias modernas - entre pensamento e corpo, linguagem e ação, palavra e gesto, arte e realidade - perdem sentido. Com isso, o próprio campo epistemológico das Artes Cênicas (e das Artes e das Humanidades em geral) pode - e precisa - ser radicalmente questionado, na medida em que as (pré-) concepções de origem metafísica precisam ser totalmente superadas e deixadas de lado. John Sallis (1995SALLIS, John. Mimesis and the End of Art. In: RAJAN, Tilottama; CLARK, David. Intersections: Nineteenth-Century Philosophy and Contemporary Theory . Albany : State University of New York Press, 1995. P. 147-169. , p. 77), em artigo intitulado Mimesis and the End of Art, é categórico ao concluir que sem que se reinvoque constantemente a necessidade e a “demanda por presença”, não é possível superar “o velho medo socrático do insidioso poder de engodo e corrupção das fantasmagorias produzidas pela arte”.

Como tarefa futura permanece, portanto, delimitar o arcabouço teórico que concerne a esta mudança de perspectiva sobre o corpo (e a arte) na tradição filosófica, localizando-a, também, dentro da grande mudança ocorrida na teoria da arte no século XX: o fim da concepção (moderna) de arte calcada nas obras de arte e na evolução histórica e linear dos estilos artísticos. Essa perspectiva se esgotou em direção a novas formas de fazer e experienciar arte, como buscamos apresentar. Arthur Danto, em sua conhecida obra Após o fim da arte (2006DANTO, Arthur C. Após o Fim da Arte: A Arte Contemporânea e os Limites da História. São Paulo: Odysseus, 2006.), coloca, por exemplo, que, hoje, a pergunta o que é arte? / isso é arte? perdeu sentido e que antes deveríamos perguntar: quando é arte?, ou, em outras palavras: em que condições a arte acontece? Essa discussão ecoa e amplifica, ainda que sem menção por parte do autor, A Origem da Obra de Arte (1977), texto heideggeriano de 1936, que muito antes já deslocara a pergunta do caráter coisal da obra de arte em direção à arte como acontecimento (Ereignis), isto é, como a possibilidade de reconfiguração e ampliação da abertura do ser que não permite que a arte se sedimente em um único significado, antes se mantém como possibilidade hermenêutica aberta e tensionada entre aquilo que pode ser representado e o irrepresentável, o caráter sempre abissal e indômito, que escapa a qualquer representação. Se o corpo é hieróglifo (como afirmara Artaud), a arte, por sua vez, é símbolo (como nos lembra Heidegger). E a imediatez de sua presença, como êxtase, jamais poderá se esgotar em um único significado representacional dado. É nesse sentido, livre, que usamos a expressão hermenêutica da presença19 9 E com isso também nos afastamos de Gumbrecht (2004) e nos reaproximamos dos escritos tardios de Heidegger (1977; 1994). .

Contudo, é preciso sempre que nos movamos devagar se queremos que uma afirmação tal qual emergência de um novo paradigma relativo a uma virada em direção à performance e ao corpo, como presença, faça sentido. É preciso ainda nos deter um pouco mais, para entender a que isso se refere. Em outras palavras, defendemos aqui que, o que parecia ser apenas uma virada filosófica dentro dos estudos da Performance (que assim cresceu em direção a um novo campo, graças ao surgimento de uma miríade de novas publicações no assunto) é, na verdade, algo que teria se dado, também e sobretudo, por intermédio de um deslocamento radical em direção à presença corporal do performer, na medida em que pensar a Performance como paradigma substitui também a mise-en-scène da representação como metáfora. O teatro deixa de ser o espelho do real, assim como o mundo um reflexo metafísico de outra ordem da realidade. Esse é o ponto central discutido neste artigo e, como tal, aponta uma mudança paradigmática que nos parece, de fato, radical.

E, por outro lado, se parece haver uma virada filosófica nos estudos da performance, por sua vez, uma virada performativa também acontece na Filosofia e nas Humanidades em geral, desde a gênese da fenomenologia husserliana e da última fase do pensamento de Heidegger (1994HEIDEGGER, Martin. Beiträge zur Philosophie: vom Ereignis, GA 65. Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1994. ), que aponta para o Acontecimento (Ereignis) como a origem de toda possibilidade de compreensão e interpretação de mundo, ou melhor dizendo de filosofia (Grant, 2019GRANT, Stuart. The Unnamed Origin of the Performative in Heidegger’s Interpretation of Aristotelian Phronēsis. In: GRANT, Stuart; McNEILLY-RENAUDIE, Jodie; WAGNER, Matthew (Org.). Performance Phenomenology: To the Thing Itself. Performance Philosophy Books series. London: Palgrave Macmillan , 2019. P. 63-83.). Indo mais longe, temos assim que os termos Performance e Filosofia estabelecem uma zona de fricção dentro da qual cada termo precisa ser paradigmaticamente reposicionado, mesmo que nunca em forma definitiva. Há, é claro, não podemos deixar de mencionar, alguns riscos envolvidos. Como Laura Cull (2012CULL, Laura. Performance as Philosophy: Responding to the Problem of ‘Application’. Journal of Theatre Research International, Cambridge, International Federation for Theatre Research, v. 37, n. 1, p. 20-27, 2012., p. 25) destaca:

Dizer que performance é filosofia (ou que performar é pensar) arrisca a tornar ‘filosofia’ um termo que significa tudo e nada; é dissolver completamente a identidade da filosofia. […] Com certeza, como François Laruelle sugeriu, o projeto não é ‘pensar sem filosofia, mas pensar sem a autoridade da filosofia’, desafiar o direito da filosofia de determinar quem ou o quê pensa ou não pensa, onde e quando o pensar está acontecendo e quando não está. Isto é, pode muito bem ser o próprio engajamento com a (não) filosofia de Laruelle que nos encoraja a nos afastar da aplicação dos modelos teóricos que já possuímos e em direção a um encontro corporificado com a materialidade resistente da performance como pensamento: seu pensamento-corporificado, seu pensamento-participativo ou mesmo seu pensamento-duracional - encontros que geram novas ideias sobre o que o pensamento pode ser e sobre onde, quando e como ocorre.

Sem dúvida, abordar as interseções possíveis entre Filosofia e Performance é necessariamente ir além das definições restritas de cada um desses termos, pois todo um novo campo interdisciplinar vem se fortalecendo - e, nesse sentido, não podemos aqui deixar de mencionar os escritos precursores de autores como Friedrich Nietzsche (que pensa o corpo como o lugar do acontecimento filosófico) ou Antonin Artaud (que, ao sugerir que há pensamentos que não podem ser expressos por palavras, nos presenteou com a ideia ainda radical de que há um tipo de linguagem capaz de só encontrar expressão por intermédio não da palavra, mas do gesto e da intensidade corporal). Mais recentemente, autores como Deleuze (e sua visão de Teatro da Filosofia), bem como Alain Badiou, que defende a independência da arte como pensamento e linguagem ou mesmo como uma não-filosofia (em sentido tradicional), como coloca François Laruelle, têm nos ajudado a pensar além dos limites do que a tradição estabeleceu para cada termo. A estrada adiante, contudo, permanece longa.

Finalizando, temos assim a percepção de que o campo da performance - e de uma Performosofia, Filosofia-Performance - como estudo de uma hermenêutica da presença perfaz o caminho de uma pluralidade de influências, estímulos e desafios, que estamos longe de pretender esgotar. A posição assumida por Artaud, ainda nas primeiras décadas do século XX, em prol da construção de uma cena cuja poética não dependa das palavras, e a sinalização, em Nietzsche, de que as categorias modernas, como a razão e a ênfase no discurso, bem como o sujeito, entraram em crise, mostram uma tendência - uma virada na maré - que se mostrará dominante ao longo de quase todo o final do século XX e começo do XXI, uma virada em direção à corporalidade como presença. Essa percepção será ainda ecoada por muitos outros artistas e pensadores. Essa é apenas a ponta do iceberg. Se a virada performativa em direção à presença como epifania do corpo (e, por consequência, também como emergência de um novo paradigma hermenêutico, capaz de se pôr para além de velhas e desgastadas dicotomias metafísicas) de fato se mostrará capaz de superar o niilismo como crise da representação ou crise da episteme moderna - só o tempo dirá.

References

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  • STREET, Anna; ALLIOT, Julien; PAUKER, Magnolia (Org.). Inter Views in Performance Philosophy: Crossings and Conversations. Performance Philosophy Books series. London: Palgrave Macmillan , 2017.
  • 1
    A este respeito consultar a belíssima introdução ao campo e seus desafios, escrita por Laura Cull, que abre este dossiê.
  • 2
    Antes de seguirmos adiante, uma nota de tradução se faz ainda necessária. O uso do termo filo-performance (Philo-Performance), por exemplo, já se faz presente em alguns textos em língua francesa (Marrou et al., 2015MARROU, Flore Garcin et al. What Is Philo-Performance? A roundtable. Performance Philosophy Journal, v. 1, n. 1, p. 148-160, 2015.). Contudo, tenho algumas reticências quanto a seu uso, uma vez que enfatiza mais a philia – ou a busca pelo conhecimento que não se tem – do que propriamente a sophia. Um neologismo mais adequado poderia ser, ao contrário, Performosofia, já que no latim canônico performo remete a algo que ganha forma/se forma através ou por meio de. Essa expressão, então, assim como a filosofia, aponta para uma busca da verdade (a sophia) mas que pode encontrar outras formas de expressões e desvelamento que não dependam apenas do nous, como os gregos denominavam o puro pensamento. Ainda que não faça referência ao uso da expressão Performosofia, indico, para reflexão acerca das diferentes possibilidades de o conhecimento acontecer, além do pensamento abstrato puro (nous), o texto de Stuart Grant (2019) sobre a Performance e os diferentes tipos/possibilidades de conhecimento no mundo grego antigo, no qual ele associa, por exemplo, a Phronesis aristotélica a uma possibilidade de resposta sobre como a performance pensa. Aliás, observo ainda que agradeço a Will Daddario e nossa troca de e-mails pela sugestão inicial que me fez pensar na possibilidade desse neologismo em língua portuguesa.
  • 3
    Sobre a fortuna crítica já acumulada pelos estudos em Filosofia-Performance, esta se concentra, atualmente, sobretudo em torno de três fontes: o site da própria rede de pesquisadores internacionais, disponível em <http://performancephilosophy.ning.com/>; a série de livros sobre o tema editada pela Palgrave Macmillan, já com 19 títulos publicados e que pode ser conferida em <https://www.palgrave.com/gp/series/14558>; e, principalmente, o Performance Philosophy Journal <https://www.performancephilosophy.org/journal>, periódico online internacional editado desde 2015.
  • 4
    Adrien Baillet, seu primeiro biógrafo, remete a origem do argumento a uma serie de sonhos tida pelo autor em 1619 e registrada em seus diários.
  • 5
    A crise da representação, importante dizer, se mostra aqui, então, também como crise da episteme moderna, se produzindo nos mais diversos campos, do metafísico ao estético – e também no político, uma vez que vivemos, ainda, no tempo do niilismo: um tempo indigente e espetacularizado no qual (não posso deixar de mencionar) o simulacro parece substituir o real até mesmo através de fake news. Esse é um tópico sobre o qual, apesar de extremamente atual, não iremos nos estender. Contudo, não deixa de ser curioso observar que a modernidade, na era da técnica, tensionou o ficcional e o real de tal forma que, no momento máximo de sua crise (que mais do que pós-moderna deveria ser considerada como hiper-moderna: o exagero e a maximização das categorias que ainda não conseguimos totalmente ultrapassar), a ficção se potencializou ao máximo a partir da crise da representação, uma vez que a representação não mais precisa corresponder a nada de real – não foi só o fiador metafísico que desapareceu. Jogou-se o bebê fora com a água do banho. Se a era da técnica é a era da indigência, também é a era na qual teríamos perdido o nexo final entre representação e a coisa representada? Como sair desta aporia?
  • 6
    Stuart Grant, aliás, toma a apropriação da alètheia grega por Heidegger como “um exemplo revelador: “[...] o gestual fenomenológico característico de Heidegger pode ser reduzido a uma postura [que é] performativa. [...] Em seus primeiros textos e conferências, Heidegger, em sua redefinição dos gregos, tentou resolver o problema da diferença ontológica por meio de uma virada rumo ao ainda por ser elaborado conceito de performativo” (Grant, 2019, p. 77).
  • 7
    Importante notar que há uma ambivalência neolatina (logo, também existente em língua portuguesa e da qual nos valemos) quanto ao uso do termo representação, que encontra sua origem na repraesentatio da filosofia medieval. Essa questão tem, em língua alemã, nuances mais peculiares, uma vez que há uma diferenciação entre Vorstellung e Darstellung, conceitos que podem ser traduzidos por representação – ou apresentação, dependendo do contexto. Darstellung no geral se relaciona ao fazer teatral (e aos conceitos da estética em geral) como apresentação, já a Vorstellung, por sua vez, é mais restrito à representação como representação mental ou propositiva, verdade representacional.
  • 8
    Uma observação aqui se faz necessária: Imediatez da presença se refere à possibilidade de compreensão no sentido da Befindlichkeit (disposição de ânimo ou afetividade) e da Verstehen (compreensão) heideggeriana: uma experiência imersiva, pré-teórica (e pré-predicativa), que se faz possível a partir do horizonte de um mundo de referenciais compartilhados na forma de um tipo de afetação ou atmosfera (Stimmung) que ressoa entre aqueles que os compartilham. Nós sentimos o mundo antes de interpretá-lo, vivemos no lusco-fusco de sua ambiência: isso não significa ausência de referenciais, pelo contrário. Pensar a imediatez da presença como êxtase se distancia da visão metafísica moderna e dicotômica: somos no mundo, sentimos o mundo, e somos à medida que sentimos, sem separação ou possibilidade outra que não a de ser esse ser aberto que nos atravessa. O pensamento heideggeriano serve aqui de ponto de partida para pensarmos essa possibilidade de verdade não como representação, mas como puro aparecimento ou desvelamento poético do ser: alètheia. Tentar pensar a partir daquilo que se faz presente, a partir necessariamente desse horizonte não metafísico nos possibilita, ainda, recolocar o sentido de palavras desgastadas pela tradição, tais como êxtase, corpo, presença, que apontam, assim, não mais em direção a uma transcendência vazia, mas à pura imanência (Heidegger, 1977HEIDEGGER, Martin. Der Ursprung des Kunstwerkes. In: HEIDEGGER, Martin. Holzwege, GA 05. Frankfurt am Main: Vittorio Klosterman, 1977.; 1994; 1995HEIDEGGER, Martin. Sein und Zeit, GA 02. Frankfurt am Main: Vittorio Klostermann, 1995.).
  • 9
    E com isso também nos afastamos de Gumbrecht (2004) e nos reaproximamos dos escritos tardios de Heidegger (1977; 1994).
  • Este texto inédito também se encontra publicado em inglês neste número do periódico.
  • Editor-responsável: Gilberto Icle
  • Editora-responsável: Laura Cull Ó Maoilearca

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    24 Jan 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    04 Maio 2019
  • Aceito
    01 Out 2019
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