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‘Não fala o nome dele, senão ele vai aparecer aqui’: interseccionalidade e performance em narrativas de crianças pequenas

‘Ne dis pas son nom, sinon il va se montrer ici’: intersectionnalité et performance dans les récits de jeunes enfants

RESUMO

Este artigo parte de um evento narrativo ocorrido entre crianças de 5 e 6 anos numa turma de Educação Infantil de uma escola pública do Distrito Federal, no qual foram evocados personagens como Deus e Zé Pelinda (entre outros), para promover um debate sobre como crianças pequenas acionam marcadores sociais da diferença. Questões religiosas, étnico-raciais e de gênero emergem de suas performances narrativas num cruzamento interseccional de distinções, o que permite depreender como esses marcadores, e as políticas do medo que frequentemente os impõem, operam na vida social das crianças desde uma idade muito precoce.

Palavras-chave:
Estudos da Performance; Narrativas Orais; Educação Infantil; Marcadores Sociais da Diferença; Interseccionalidade

RÉSUMÉ

Cet article part d’un récit collectif qui s’est déroulé entre des enfants de 5 et 6 ans dans une classe d’éducation préscolaire d’une école publique du District Fédéral - Brésil, dans lequel des personnages Deus et Zé Pelinda (entre autres) ont été évoqués, pour promouvoir un débat sur la façon dont les jeunes enfants utilisent des marqueurs sociaux de la différence. Les enjeux religieux, ethnico-raciaux et de genre émergent de leurs performances narratives dans un croisement intersectionnel de distinctions, ce qui permet de comprendre comment ces marqueurs, et les politiques de peur qui les imposent, opèrent dans la vie sociale des enfants dès le plus jeune âge.

Mots-clés:
Performance Studies; Récits Oraux; Éducation de la Petite Enfance; Marqueurs Sociaux de la Différence; Intersectionnalité

ABSTRACT

This paper is based on a narrative event that took place among 5 and 6-year-old children at a Brasília/Brazil public kindergarten, in which characters such a s God and Zé Peli nda (among others) were evoked, to promote a debate about how young children use social markers of difference. Religious, ethnic-racial and gender issues arise from their narrative performances in intersectional distinctions, which enable us to understand how these markers, and the politics of fear that often impose them , operate in children’s social liv es from a very early age.

Keywords:
Performance Studies; Oral Narratives; Early Childhood Education; Social Markers of Difference; Intersectionality

Entrando na Toca da Coruja: sobre o contexto teórico e metodológico da pesquisa

‘Não tem o bicho do Harry Potter? Ele fez assim ó’ (Godzila, 6 anos).

Neste artigo, partiremos de nossas experiências com professoras, pesquisadoras, escutadoras e contadoras de histórias para promover um debate sobre como crianças pequenas acionam marcadores sociais da diferença. Assumindo que nosso campo de atuação se situa no entrelaçamento entre os Estudos da Performance e a Educação, faremos uso do conceito de performance narrativa para investigar a poética e os sentidos da troca discursiva das crianças1 1 Em coerência com essa perspectiva analítica, portanto, substituiremos o que comumente chamamos de conversa por performance narrativa. .

Entendemos que as performances narrativas compõem eventos complexos que envolvem, entre outros elementos, desempenho corporal e vocal dos narradores, organização e transformação de experiências, interações comunicativas, entretenimento, sociabilidade, criação poética/estética e construção compartilhada de conhecimentos. As performances narrativas, portanto, são momentos privilegiados da experiência social que promovem a emergência de significados (Langdon, 2006LANGDON, Esther Jean. Performance e sua Diversidade como Paradigma Analítico: A Contribuição da Abordagem de Bauman e Briggs. Ilha – Revista de Antropologia, Florianópolis, v. 8, n. 1-2, p. 162-183, 2006.).

Na confluência com a Educação, a abordagem da performance nos impele a não operar no registro do ensinar, mas sim de observar, interrogar, descobrir, desconfiar, experimentar, vivenciar, compartilhar pedagogias críticas que estão sempre em processo e que só são possíveis na relação, de acordo com a especificidade de cada contexto. Como aponta Icle (2013, p. 20)ICLE, Gilberto. Da performance na educação: perspectiva para a pesquisa e a prática. In: PEREIRA, Marcelo de Andrade (Org.). Performance e Educação: (des)territorializações pedagógicas. Santa Maria: Ed. da UFSM, 2013. P. 09-22., conjugando de forma dinâmica as dimensões do ser e do fazer e enfatizando o caráter criativo das relações humanas, a performance permite que a própria prática educativa seja pensada como invenção. Ou seja, neste artigo não apenas abordamos a interação comunicativa das crianças sob a perspectiva da performance, mas nossa própria ação de pesquisa, realizada por meio da partilha de histórias com as crianças, é e será pensada como performance2 2 Temos chamado essa perspectiva metodológica, em fase de aprimoramento, de etnografia performativa (Hartmann; Sousa; Castro, 2020). .

Como temos feito em outros trabalhos (Hartmann, 2021HARTMANN, Luciana. Crianças contadoras de histórias. Brasília: Editora da UnB, 2021.; Hartmann; Silva, 2019HARTMANN, Luciana; SILVA, Sonaly Torres. Pequenas resistências: contação de histórias, performance e protagonismo infantil na escola. Urdimento, Florianópolis, v. 1, n. 34, p. 19-35, 2019.), dialogaremos aqui com a noção de criança performer, tal como vem sendo proposta e debatida por Marina Marcondes Machado (2010MACHADO, Marina Marcondes. A criança é performer. Educação & Realidade, Porto Alegre, v. 35, n. 2, p. 115-137, 2010.; 2015MACHADO, Marina Marcondes. Só Rodapés: Um glossário de trinta termos definidos na espiral de minha poética própria. Revista Rascunhos, Uberlândia, v. 2, n. 1, p. 53-67, 2015.; 2017MACHADO, Marina Marcondes. Guerra de maçãs e seus desdobramentos: a escola como paisagem performativa. Cadernos Cedes, Campinas, v. 37, n. 101, p. 65-82, 2017.), pois nos interessa a forma como a autora insere a performance no âmbito das ações da criança na vida cotidiana, e como, por meio dessas, ela presentifica aspectos de si, dos pais, da cultura ao redor. Investigar como relações interseccionais são performadas por seis crianças pequenas em um curto, porém emblemático evento narrativo, é nosso desafio neste artigo.

A performance aqui enfocada, portanto, tem como protagonistasperformers as crianças, que com suas vozes, palavras, gestos e identidades nos oferecem um acesso privilegiado aos seus “mundos de vida” (Brandão, 2015BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Olhar o mundo e ver a criança: ideias e imagens sobre ciclos de vida e círculos de cultura. Crítica Educativa, Sorocaba, v. 1, n. 1, p. 108-132, jan./jun. 2015.). Neste processo, no qual nos propomos a evitar a perpetuação da subalternização das crianças, entendemos que a contextualização dos sujeitos e de sua conjuntura é fundamental. Como defendem Faria et al. (2015, p. 17)FARIA, Ana Lúcia Goulart de et al. (Org.). Infâncias e pós-colonialismo: pesquisas em busca de pedagogias descolonizadoras. Campinas: Leitura Crítica/ALB, 2015., na introdução do livro Infâncias e Pós-Colonialismo (2015):

[...] não é suficiente problematizar a educação vigente e analisar as influências da hegemônica herança colonial trazida do continente europeu; é essencial perceber as especificidades locais e culturais onde residem essas crianças, considerando sua classe social, sua ancestralidade, suas linguagens e seus preconceitos, compreendendo as especificidades dos povos criança.

Buscando compreender as especificidades dos povos criança, encontramos inspiração também na Pedagogia das Encruzilhadas, proposta por Luiz Rufino, que compreende “[...] um complexo de experiência, práticas, invenções e movimentos que enredam presenças e conhecimentos múltiplos e se debruça sobre a problemática humana e suas formas de interação com o meio” (Rufino, 2019, p. 74RUFINO, Luiz. Pedagogia das Encruzilhadas. Rio de Janeiro: Mórula Editorial, 2019.). Faremos uso, assim, de teorias e autores de diferentes tradições e campos do saber, pois esses encontros (ou, como diz Rufino, esses cruzos) mobilizam processos educativos comprometidos com a diversidade de conhecimentos. Para nos ajudar a pensar sobre as avenidas identitárias que se interseccionam na performance das crianças, traremos para a conversa pensadoras e artistas que, acreditamos, podem contribuir para enriquecer a discussão aqui proposta.

Passemos ao contexto: o evento narrativo analisado no artigo foi registrado durante a pesquisa de campo do mestrado de uma das autoras (Vieira, 2015VIEIRA, Débora Cristina Sales da Cruz. A imaginação na produção narrativa de crianças: contando, recontando e imaginando histórias. 2015. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade de Brasília, Brasília, 2015.), realizada no Centro de Educação Infantil do Riacho Fundo 2, uma das 33 Regiões Administrativas do Distrito Federal (também chamadas de cidades-satélites). Localizado a cerca de 20 km da zona central do Plano Piloto, o Riacho Fundo 2 foi fundado na década de 1990 como parte da política de moradia desenvolvida pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Distrito Federal (Codhab), que priorizava as cooperativas habitacionais de diversos setores da sociedade civil na constituição da cidade, e atualmente tem cerca de 100 mil habitantes. A atividade econômica da região é baseada nos setores de comércio e serviços e boa parte da população se desloca diariamente para outras regiões do DF para trabalhar, o que a caracteriza como uma cidade-dormitório. A região abriga uma cooperativa de reciclagem de resíduos sólidos, a reserva ambiental da Embrapa e o Parque Ecológico do Riacho Fundo. Na cidade há diversos equipamentos públicos, como escolas, postos de saúde e postos policias, contudo, diante da explosão demográfica ocorrida na última década, há falta de escolas para estudantes do ensino fundamental e do ensino médio, que precisam se deslocar para o Riacho Fundo 1 e para o Núcleo Bandeirante para estudar.

Participaram como colaboradoras da pesquisa oito crianças de uma turma do 2º período da Educação Infantil. Todas tinham entre 5 e 6 anos de idade e eram oriundas de famílias com renda média de 1 a 5 salários mínimos. Das oito crianças, cinco eram negras e 3 brancas.

Durante a pesquisa foram realizados encontros semanais com as crianças, com duração de 5 horas, ao longo dos meses de maio a dezembro. Os encontros aconteciam na sala de leitura Toca da Coruja, chamada dessa maneira em função do grande número de corujas que habitavam a escola. Faziam parte das dinâmicas dos encontros a realização de oficinas de contação e escuta de histórias, leitura de livros, dramatização das histórias ouvidas, recontos orais, registros pictóricos das histórias e muita conversa com as crianças. Com essas estratégias buscamos seguir a perspectiva de Manuel Sarmento (2005, p. 370)SARMENTO, Manoel Jacinto. Gerações e alteridade: Interrogações a partir da sociologia da infância. Educação & Sociedade, Campinas, v. 26, n. 91, p. 361-378, 2005., evitando uma “colonização adultocentrada dos modos de expressão e de pensamento das crianças”.

Diante da imersão das crianças nesse universo literário vivenciado nas oficinas, e do envolvimento contínuo com personagens da cultura infantil, as crianças escolheram os nomes pelos quais queriam ser identificadas na pesquisa, pois, acompanhando a perspectiva de Campos (2008)CAMPOS, Maria Malta. Por que é importante ouvir a criança? A participação das crianças pequenas na pesquisa científica. In: CRUZ, Sílvia Helena (Org.). A criança fala: a escuta de crianças em pesquisas. São Paulo: Cortez, 2008. P. 35-42., havíamoslhes explicado que, por questões éticas, seus nomes originais não seriam revelados3 3 O projeto foi aprovado e autorizado pelo setor responsável pelo acompanhamento de pesquisas em instituições educativas públicas da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF). As famílias e responsáveis pelas crianças colaboradoras da pesquisa autorizaram a participação delas por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e tinham ciência de todos os procedimentos e instrumentos que seriam utilizados durante o processo empírico. . Esse processo de escolha se deu no momento final da pesquisa empírica e acabou por agregar outro elemento para a análise, pois oportunizou a cada criança revelar o quanto o nome escolhido traduzia suas preferências. Assim, no evento aqui enfocado, teremos a presença de Godzila (5 anos), Barbie (6 anos), Pinóquio (6 anos), Branca de Neve (5 anos), Aline Barros (5 anos) e Rapunzel (6 anos) – duas crianças não compareceram nesse dia. É importante ainda mencionar que performances narrativas, como a que será aqui analisada, ocorriam sobretudo nos momentos de deslocamento das crianças pela escola e ao realizarem os registros pictóricos das histórias partilhadas nas oficinas. Nessas ocasiões, os diálogos das crianças tematizavam desde o que tinha sido o lanche daquele dia, acontecimentos cotidianos da sala de aula e de suas casas, até comentários sobre os programas de televisão, nos quais eram manifestas suas percepções de mundo, evidenciando em muitos casos, como pretendemos defender aqui, suas concepções acerca de marcadores sociais da diferença como religião, gênero e raça, entre outros.

E quem somos nós, adultas “na busca de trocas entre gesto e palavra” (Machado, 2017MACHADO, Marina Marcondes. Guerra de maçãs e seus desdobramentos: a escola como paisagem performativa. Cadernos Cedes, Campinas, v. 37, n. 101, p. 65-82, 2017.) com as crianças? Nossas trajetórias acadêmicas e profissionais se cruzaram na estrada que liga as infâncias e as narrativas orais (também nos encontramos, portanto, na encruzilhada). Ambas entendemos que fazer pesquisa com crianças, numa abordagem dialógica e de autoria compartilhada, é mais pertinente e relevante que fazer pesquisa sobre crianças. Nesse encontro, ambas temos buscado compreender as crianças em sua inteireza e nas singularidades histórica e socialmente dadas, entender os hiatos existentes na relação entre adultos e crianças, de modo que nossas relações sejam plena de sentidos, fundadas na troca de visões de mundo e sensibilidades (Galzerani, 2002GALZERANI, Maria Carolina Bovério. Imagens entrecruzadas de infância e de produção de conhecimento histórico em Walter Benjamin. In: FARIA, Ana Lúcia Goulart de et al. (Org.). Por uma cultura da infância: metodologias de pesquisa com crianças. Campinas: Autores Associados, 2002.). Temos procurado, assim, des/decolonizar nossas pesquisas, escapando de modelos e lugares hegemônicos que centralizam sentidos, normas e estéticas dominantes, entendendo, porém, como nos alertam Abramowicz e Rodrigues (2014)ABRAMOWICZ, Anete; RODRIGUES, Tatiane Cosentino. Descolonizando as pesquisas com crianças e três obstáculos. Educação & Sociedade, Campinas, v. 35, n. 127, p. 461-474, abr./jun. 2014., que esse é um processo que enfrenta diversos obstáculos, a começar pela lógica produtivista/neoliberal que vigora cada vez com mais força em nossas universidades, pelo desejo de pedagogias prescritivas (que menos questionem e mais forneçam modelos) e pela própria dificuldade em lidar com a diferença (frequentemente mascarada ou suavizada pelo discurso da diversidade).

A adoção dessa perspectiva de partilha de saberes e desierarquização das relações, portanto, configura-se como um desafio teórico-metodológico para a realização de pesquisas com crianças, pois torna necessário romper com muitas barreiras, simbólicas e concretas, que separam e afastam adultos e crianças, especialmente no contexto escolar. Nossa perspectiva, nesse sentido, é nos aproximarmos com respeito e sobretudo sensibilidade desses povos-criança, reconhecendo suas experiências e vivências singulares e geopoliticamente situadas.

E como viabilizamos isso? Com muita escuta. Escuta que se dá em processos de partilha de histórias, tanto da literatura infantil quanto do cotidiano, histórias pessoais, inventadas ou sonhadas. Nossa perspectiva metodológica, portanto, é sempre atravessada por histórias, pois, assim acreditamos, o próprio evento narrativo, sempre que permita a alternância entre narradores e ouvintes, pode proporcionar uma desierarquização dos papéis socialmente instituídos. Como diz a antropóloga Constantina Xavier Filha (2014, p. 16)XAVIER FILHA, Constantina. Ver e ‘Desver’ o mundo em pesquisas com crianças. Textura – Revista de Educação e Letras, São Leopoldo, n. 32, p. 45-63, 2014.: “As crianças têm muito a dizer; para as escutar, porém, é preciso propiciar espaços e condições”. É sobre os espaços e condições de escuta desta pesquisa que trataremos a seguir.

‘Existe sim!’: uma performance narrativa de medos compartilhados

A performance narrativa objeto deste artigo aconteceu numa tarde ensolarada e seca, e foi registrada em formato de áudio durante a realização de uma atividade da oficina de histórias. Todas as seis crianças e a pesquisadora estavam sentadas em torno de uma grande mesa. Como a mobília não era adaptada ao tamanho das crianças (era destinada a adultos), algumas delas, como Godzila e Pinóquio, desenhavam ajoelhadas na cadeira. Uma conversa animada se desenrolava enquanto elas desenhavam em um papel sulfite, utilizando giz de cera. Eis que surge uma pergunta:

Rapunzel: Tia, não é que Deus não gosta de briga?

Pinóquio: Se brigar, ele dá uma chicotada.

Barbie: É mesmo.

Godzila: Não é! Deus não bate. Deus não bate. Né, tia?

Pinóquio: Só bota de castigo.

Branca de Neve: Se bater nos outros...

Godzila: O Deus, ele fica triste e manda lá prá baixo.

Barbie: E Jesus que vai escolher.

Rapunzel: Tia, não é que tem uns bichinhos aqui embaixo, que eles comem o nosso corpo?

Godzila: É o... É o...

Barbie: Godzila, não fala, não fala!

Godzila: O besta, o diabinho.

Pinóquio: Tia, não é que não pode falar o nome feio? Daquele que fica lá embaixo?

Godzila: Tia, um dia... Sabia o namorado da minha prima? O nome dela é Carol. O namorado dela falou que... O pai dele, quando ia dormir... Não tem o bicho do Harry Potter? Ele fez assim ó (faz uma expressão assustadora com rosto e com as mãos). A casa dele era mal-assombrada. Lá morava um macumbeiro e ele vendeu a casa pro diabo. E ele foi lá e aí ele viu uma palavra lá e falou pro pai dele. E quando o pai dele dormiu, aí e ele foi lá e acordou e o bicho do Harry Potter tava lá! Branca de Neve: Tia, o Pinóquio disse: ‘Não fala que é diabinho’.

Godzila: Tia, tem um dia...

Pinóquio: É outro bicho, só que eu não vou falar, senão ele pode aparecer.

Aline Barros: Não aparece, né tia?

Barbie: Quem é, então?

Pinóquio: Ele é lá de baixo e ele aparece. Eu vou falar, só que ele vai aparecer.

Branca de Neve: Tia, eu tô com medo.

Pinóquio: Eu vou falar, mas ele vai aparecer. Pode falar? Você quer que eu fale o nome dele?

Godzila, Barbie e Branca de Neve: Sim!!!

Pinóquio: É Zé Pelinda.

Rapunzel: Eu vou contar prá tia Camila!

Pinóquio: É o Zé Pelinda.

Godzila: Ei, o que é isso?

Pinóquio: Ele é... O Maxuel gosta do Zé Pelinda, eles dois são namorados.

Godzila: Eita!

Pinóquio: É um homem mais um homem.

Pesquisadora: E quem te contou isso?

Pinóquio: Eu que sei.

Pesquisadora: Eu sei que você sabe, mas quem te contou essa história?

Pinóquio: Tia, eu que sei há muito tempo.

Godzila: Foi no ano passado. Você falou no ano passado que ele é viado, né? Ele não namora com mulher. Como é o nome dele mesmo?

Pinóquio: Não fala o nome dele, senão ele vai aparecer aqui.

Barbie: Para com isso, ele aparece!

Godzila: Calma! É só uma lenda. Ele nem existe!

Pinóquio: Existe sim!

(Vieira, 2015, p. 118-119VIEIRA, Débora Cristina Sales da Cruz. A imaginação na produção narrativa de crianças: contando, recontando e imaginando histórias. 2015. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade de Brasília, Brasília, 2015.).

‘Existe sim!’. A palavra em performance afeta, produz sentidos. Interessa-nos aqui perceber como marcadores identitários bastante diversos (religiosos, étnico-raciais e de gênero) emergem das performances das crianças e que sentidos produzem para elas. Antes de iniciar a análise da performance, no entanto, levantaremos alguns dos principais conceitos e referências que nos acompanharão neste processo.

Comecemos pelo conceito de interseccionalidade, cunhado em 1989 em artigo publicado pela professora e pesquisadora dos direitos civis Kimberlé Crenshaw, no qual se inaugura um novo paradigma teórico e metodológico da tradição feminista negra, no sentido de promover não apenas uma crítica às condições estruturais do racismo, dos sexismos e de suas consequentes violências, como também promover ações concretas no sentido de promover a garantia dos direitos daquelas parcelas da população mais discriminadas (Akotirene, 2019AKOTIRENE, Carla. O que é Interseccionalidade. Rio de Janeiro: Polen Editora, 2019.; Henning, 2015HENNING, Carlos Eduardo. Interseccionalidade e pensamento feminista: As contribuições históricas e os debates contemporâneos acerca do entrelaçamento de marcadores sociais da diferença. Mediações, Londrina, v. 20, n. 2, p. 97-128, 2015.). Embora o termo não fosse exatamente esse, no Brasil, Lélia Gonzalez, em 1988, já trazia a noção de amefricanidade para referir-se à experiência de mulheres e homens negros na diáspora e à experiência de mulheres e homens indígenas contra a dominação colonial. Contemporaneamente, pensadores brasileiros como Carla Akotirene e Renato Noguera têm complexificado o debate sobre a interseccionalidade, numa perspectiva que engloba a crítica ao colonialismo, ao imperialismo e ao monopólio epistêmico ocidental (estadunidense e centroeuropeu). Akotirene (2019, p. 47)AKOTIRENE, Carla. O que é Interseccionalidade. Rio de Janeiro: Polen Editora, 2019. aponta: “A Interseccionalidade nos permite partir da avenida estruturada pelo racismo, capitalismo e cisheteropatriarcado, em seus múltiplos trânsitos, para revelar quais são as pessoas realmente acidentadas pela matriz de opressões”. Como argumentaremos abaixo, é possível perceber no evento narrativo em questão que mesmo as crianças pequenas já estão inseridas nessa matriz de opressões.

Acreditamos que o entrelaçamento dos estudos da performance na educação com uma abordagem interseccional da infância pode trazer novas possibilidades de escuta das crianças, que permitam entender seu lugar não somente como crianças (ou seja, inseridas em um marcador etário), mas também como meninos/meninas/trans/etc. (ou seja, com gêneros diversos), bem como situadas em termos étnico-raciais, de classe ou deficiência, entre outras (Alanen, 2016ALANEN, Leena. ‘Intersectionality’ and Other challenges to theorizing childhood – Editorial. Childhood, v. 23, n. 2, p. 157-161, 2016.).

No artigo Toward a Field of Intersectionality Studies: Theory, Applications, and Praxis, Cho, Crenshaw e McCall (2013)CHO, Sumi; CRENSHAW, Kimberlé Willians; MCCALL, Leslie. Toward a Field of Intersectionality Studies: Theory, Applications, and Praxis. Signs, v. 38, n. 4, p. 785-810, 2013. referem-se às três maneiras de uso da interseccionalidade: a primeira aplica quadros de análise interseccionais à pesquisa; a segunda chama a atenção para a interseccionalidade como teoria e metodologia; e a terceira explora a interseccionalidade como práxis que se estende para além da academia. Em nossa proposta, em maior ou menor medida, trabalharemos com a interseccionalidade nesses três âmbitos.

Recentemente tem sido publicado no Brasil uma série de estudos sobre as potencialidades do encontro da interseccionalidade com os estudos da infância, com destaque para os dossiês lançados em 2021: ‘Interlocuções Sul-Sul: Infâncias, Interseccionalidade e Pensamento Decolonial’, publicado nos Cadernos de Gênero e Diversidade, da UFBA; ‘Gênero, Sexualidade, Infância e Educação’, na Revista Debate Insubmissos, da UFPE e ‘Interseccionalizando em educação: lutas sociais e direito à diferença’, na Revista Brasileira de Estudos da Homocultura, da UFMT. Em diálogo com estudos estrangeiros, salientamos o artigo de Konstantoni & Emejulu (2017)KONSTANTONI, Kristina; EMEJULU Akwugo. When intersectionality met childhood studies: the dilemmas of a travelling concept. Children's Geographies, v. 15, n. 1, p. 6-22, 2017., no qual elas sustentam a importância do reconhecimento da história intelectual e da luta das mulheres negras no sentido de que se preserve a integridade da interseccionalidade como da práxis radical de emancipação do conhecimento e ação coletiva para a justiça social. Ou seja, mais do que um conceito, uma ferramenta analítica, a interseccionalidade pressupõe uma prática de luta contra a desigualdade, o preconceito e as opressões, que, como pretendemos defender neste texto, operam desde a infância. A interseccionalidade contribui, portanto, para pensar (e agir com) a infância também em termos de relações de poder e de desigualdades estruturais (Benatti et al., 2021BENATTI, Barbara Duarte et al. ‘Cabelo de Bombril’ ou ‘Cabelo Alisabel’?: reflexões sobre memória, infâncias e identidade negra. Revista Humanidades & Inovação, Palmas, v. 8, n. 58, p. 218-229, 2021.).

Procuramos dialogar também com o filósofo e educador Renato Noguera, que tem uma vasta produção na qual propõe um projeto decolonial baseado em uma infância em afroperspectiva, oferecendo ferramentas analíticas e metodológicas que visam promover, com base no brincar e no narrar, outras formas de compreensão e ação sobre a realidade, pautadas em perspectivas pluriversais4 4 Pluriversal, segundo Noguera (2019a), é uma menção à perspectiva ontológica do pensador Mogobe Ramose que se opõe à ideia de universal, que supõe a existência de uma perspectiva única e monolítica. de mundo (Noguera, 2019aNOGUERA, Renato. Infância em afroperspectiva: articulações entre sankofa, ndaw e terrixistir. Revista Sul-Americana de Filosofia e Educação, Brasília, n. 31, p. 53-70, maio/out. 2019a.; 2019bNOGUERA, Renato. O poder da infância em afroperspectiva: espiritualidade e política em afroperspectiva. Momento: diálogos em educação, Rio Grande, v. 28, n. 1, p. 127-142, jan./abr. 2019b.).

Percebemos no que Noguera e Luciana Alves tratam como brincar e narrar uma possibilidade de conexão com os estudos da performance na educação. Durante a realização da performance aqui enfocada, por exemplo, observamos que algumas crianças, à medida que se envolviam no debate, iam parando de desenhar e complexificando as questões ali postas. Isso se deu, em grande parte, pela inclusão de novos personagens na trama, como analisaremos abaixo. Outras, como Barbie e Aline Barros, participaram de forma mais ativa e corporalmente – fazendo menção de irem para baixo da mesa ou se aproximarem da pesquisadora. Em ambos os casos brincadeira e narrativa se combinavam. Como dizem Noguera & Alves (2020, p. 542)NOGUERA, Renato; ALVES, Luciana Pires. Exu, A Infância e o Tempo: Zonas De Emergência de Infância (ZEI). Revista Educação e Cultura Contemporânea, Rio de Janeiro, v. 17, n. 48, p. 533-554, 2020.: “A infância cozinha receitas de brincadeira e de narrativa. Sem elas, viver tornar-se um desgosto. Por exemplo, a política e a religião não deixam de ser narrativas; os esportes são brincadeiras. Brincar e narrar tornam a vida abundante”5 5 Nesse artigo, com uma complexidade muito maior do que teremos condições de abordar aqui, Noguera e Alves propõem a noção de Zonas de Emergência de Infância (ZEI), partindo de narrativas dos orixás Exu e Iroco, tomados como heterônimos da infância e do tempo. As ZEI emergiriam pelas linhas de força do narrar e do brincar, “como comunidade lúdica e temporária de retomada do estado de infância e devir-criança”. .

Pensamos que os estudos da performance na educação, ao investir em processos de vivência, contextualização e análise de eventos expressivos, buscando seus sentidos na poética, nas potencialidades criativas que emergem das fricções e encontros com o outro, seja ele/ela adulto ou criança, podem enriquecer ainda mais as pesquisas sobre interseccionalidade e infância. Como dizem Jean Carlos Gonçalves e Michelle Gonçalves (2018, p. 141)GONÇALVES, Jean Carlos; GONÇALVES, Michelle Bocchi. Teatralidade e Performance na pesquisa em Educação: do corpo e da escrita em perspectiva discursiva. Educar em Revista, Curitiba, v. 34, n. 67, p. 139-155, jan./fev. 2018., no artigo Teatralidade e Performance na pesquisa em Educação: do corpo e da escrita em perspectiva discursiva:

Estudar Performance é interessar-se por marcas identitárias que remodulam e ressignificam sujeitos, considerando seus corpos e suas narrativas com base em diferentes papéis sociais que exercem e/ou lugares sociais que ocupam. É aí que se torna central compreender a Performance como fronteira entre arte e vida, na qual há lugar para resistências, diferenças e críticas culturais.

A partir da performance narrativa descrita, buscamos, portanto, refletir sobre os papéis e lugares sociais ocupados tanto pelas crianças narradoras quanto pelos personagens narrados, ou seja, analisaremos a performance tanto no sentido do evento narrado (o conteúdo das histórias – O QUE é narrado) quanto do evento narrativo (a situação discursiva da sua narração – COMO é narrado) (Bauman, 1977BAUMAN, Richard. Verbal art as performance. Rowley and Mass: Newbury House Publishers, 1977.; Hartmann, 2016HARTMANN, Luciana. História, memória e performance em narrativas orais de crianças. In: RODEGHERO, Carla Simone; GRINBERG, Lúcia; FROTSCHER, Méri (Org.). História oral e práticas educacionais. Porto Alegre: Oikós, 2016.; 2021HARTMANN, Luciana. Crianças contadoras de histórias. Brasília: Editora da UnB, 2021.). Procuramos, assim, investigar possibilidades de escuta e compreensão da performance narrativa das crianças a partir dessa encruzilhada, ou desse cruzo entre teorias, sujeitos e personagens.

Infâncias, interseccionalidade e performance

Como é possível perceber, a performance narrativa aqui em questão é deflagrada por meio de uma pergunta feita por uma das crianças à Tia, no caso, a pesquisadora. A pergunta traz para a cena um personagem, seguido por uma série de outros que passam a constituir os argumentos narrativos das crianças. Por esse motivo, optamos em organizar nossa análise da performance a partir da sequência de personagens que compõem o evento.

Retomemos o início da performance:

Rapunzel: Tia, não é que Deus não gosta de briga?

Pinóquio: Se brigar, ele dá uma chicotada.

Barbie: É mesmo.

Godzila: Não é! Deus não bate. Deus não bate. Né, tia?

Pinóquio: Só bota de castigo.

1º personagem: Deus

Deus não gosta de briga, mas se brigar ele dá uma chicotada. Deus não bate, só bota de castigo... Quem seria esse deus, presente de formas tão concretas (e, por que não dizer, opressoras) na vida das crianças? As crianças iniciam o evento narrativo em questão conversando sobre suas hipóteses do relacionamento de Deus com as pessoas, denotando o contexto social e religioso em que estão inseridas, no qual fica evidente a influência de preceitos cristãos. Como diz Rogoff (2005)ROGOFF, Bárbara. A natureza cultural do desenvolvimento humano. Porto Alegre: Artmed, 2005., as crianças aprendem a narrar em suas comunidades, ou seja, a cultura, em suas variadas formas de manifestações, exerce um importante papel na constituição narrativa das suas narrativas. Entre as crianças presentes na performance, Deus é evocado em seu poder disciplinador (vigia e pune): ‘Branca de Neve: Se bater nos outros...’; ‘Godzila: O Deus, ele fica triste e manda lá prá baixo’. O Deus pai todo poderoso das religiões católicas e evangélicas parece fazer parte do cotidiano das seis crianças. Deus – que também é pai – bota de castigo, dá chicotada, manda lá prá baixo. Deus dá medo.

2º personagem: o Diabo

Em oposição à figura de Deus, surge na fala de Godzila ‘aquele que fica lá embaixo’, ou seja, o Diabo. Barbie então fez um apelo fervoroso para que esse nome não fosse pronunciado. O apelo de Barbie comprova aquilo que Austin (1990)AUSTIN, John Langshaw. Quando dizer é fazer. Trad. de Danilo Marcondes de Souza Filho. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990. procurou há muito demonstrar: “dizer é fazer”. Ou seja, a criança compreende que a palavra em performance não apenas representa, mas também cria a realidade. O Diabo, na própria invocação de seu nome, dá medo.

3º personagem: o Bicho do Harry Potter

A entrada do Diabo agrega uma atmosfera de mistério e assombro à conversa, que é complexificada pela inclusão de um novo elemento: uma casa assombrada pelo Bicho do Harry Potter. Este faz menção ao personagem Lord Voldemort, da saga Harry Potter, escrita pela inglesa J. K. Rowling, considerado o bruxo das trevas mais poderoso de todos os tempos. Este tem como característica física um rosto disforme, o qual Godzila performatiza para o seu público, potencializando o caráter assustador da história. Com sua performance o narrador evoca a memória de seus colegas, engendrando, na interação, uma nova experiência do assombro. Godzila é um narrador que, como diria Benjamin (1986)BENJAMIN, Walter. O narrador. In: BENJAMIN, Walter. Magia e Técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Trad. Sérgio Paulo Rouanet. 2. ed. São Paulo: Brasiliense, 1986., fundamenta o que conta em sua própria experiência ou na experiência relatada/mostrada por outros (poderíamos pensar aqui nos filmes da série Harry Potter), incorporando também aos fatos narrados a experiência viva dos ouvintes. E todos sabem: o Bicho do Harry Potter dá medo.

4º personagem: o Macumbeiro

Mas o rol dos personagens amedrontadores não para por aí: a casa do namorado da prima de Godzila, onde vivia o Bicho do Harry Potter, ‘era mal-assombrada. Lá morava um macumbeiro e ele vendeu a casa para o Diabo’. Ao destacar que a casa era mal-assombrada e foi vendida ao Diabo por um macumbeiro, Godzila traz à tona a intolerância religiosa de sua comunidade com adeptos de religiões de matriz africana. Ao aproximar o macumbeiro do próprio Diabo, rechaça a experiência religiosa de outros grupos diferentes do seu. A macumba dá medo. A diferença dá medo.

Falemos um pouco da macumba. A macumba vem sendo historicamente alvo de preconceito e intolerância religiosa por parte do discurso hegemônico brasileiro. Como argumenta o historiador Luiz Antonio Simas (2020)SIMAS, Luiz Antônio. Macumba. Revista Serrote, n. 27, 2020. Disponível em: https://www.revistaserrote.com.br/2020/02/macumba-por-luiz-antonio-simas/. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://www.revistaserrote.com.br/2020/0...
, no verbete Macumba, publicado na Revista Serrote: “Acredito que o preconceito contra a macumba e o repúdio ao adjetivo ‘macumbeiro’ se inserem nessa teia ardilosa do racismo brasileiro”. Em uma perspectiva contrahegemônica, Simas e Luiz Rufino, em Fogo no Mato – a ciência encantada das macumbas (2018), desafiam essas concepções arraigadas historicamente e propõem uma nova semântica para o termo macumbeiro:

Macumbeiro: definição de caráter brincante e político que subverte sentidos preconceituosos atribuídos de todos os lados ao termo repudiado e admite as impurezas, contradições e rasuras como fundantes de uma maneira encantada de encarar e ler o mundo no alargamento das gramáticas. O macumbeiro reconhece a plenitude da beleza, da sofisticação e da alteridade entre as gentes. A expressão ‘macumba’ vem muito provavelmente do quicongo kumba, ‘feiticeiro’. Kumba também designa os encantadores das palavras, poetas. Macumba seria, então, a terra dos poetas do feitiço; os encantadores de corpos e palavras que podem fustigar e atazanar a razão intransigente e propor maneiras plurais de reexistência e ‘descacetamento’ urgente pela radicalidade do encanto, em meio às doenças geradas pela retidão castradora do mundo como experiência singular de morte (Simas; Rufino, 2018, p. 4SIMAS, Luiz Antônio; RUFINO, Luiz. Fogo no Mato – a ciência encantada das macumbas. Rio de Janeiro: Mórula, 2018.).

Interessante pensar que o macumbeiro descrito por Godzila vende a casa para o Diabo, mas quem vem assombrá-la é o bicho do Harry Potter. Pura macumba, cheia de mistérios, encantos, impurezas e alteridades.

Ao longo da performance narrativa das crianças, há uma combinação de diferentes universos (ficcionais e/ou religiosos) que convivem no mesmo espaço-tempo narrativo. Há, no entanto, uma palavra que ainda não foi revelada. Diz Godzila: ‘E ele foi lá e aí ele viu uma palavra e falou pro pai dele’. Ele viu uma palavra. Assume então o protagonismo Pinóquio, operando na mesma chave de entendimento de que as palavras criam a realidade: ‘É outro bicho, só que eu não vou falar, senão ele pode aparecer’. Com sua fala, Pinóquio provoca uma mobilização afetiva em todas as crianças do grupo. Até Aline Barros, que havia permanecido calada nos primeiros momentos da conversa, pede para a adulta/pesquisadora confirmação sobre a não aparição daquele personagem. Pinóquio reforça: ‘Ele é lá de baixo e ele aparece. Eu vou falar, só que ele vai aparecer’. A performance de Pinóquio estabelece um pacto entre ele e sua plateia, que fica totalmente envolvida na história, amalgamando a expectativa e o medo da aparição.

5º personagem: Zé Pelinda

Mais um personagem passa a compor o evento narrativo: o nome Zé Pelinda é pronunciado, não uma, mas duas vezes. Há um breve silêncio e os meninos começam a explicar quem é esse personagem tão temido.

Mas, afinal, quem é Zé Pelinda? Já que ele foi evocado na performance das crianças, falemos dele. A antropóloga Vânia Cardoso (2007)CARDOSO, Vânia Zikán. Narrar o mundo: Estórias do povo da rua e a narração do imprevisível. Mana, Rio de Janeiro, v. 13, p. 317-345, 2007. explica que o Zé Pilintra faz parte dos povos da rua, espíritos de malandros e de prostitutas que em vida teriam ocupado espaços socialmente marginalizados. Os povos da rua são conhecidos pelo poder de aparecer onde desejam e por sua capacidade de interferência no cotidiano de maneira inesperada e constantemente temida. Zé Pilintra é um malandro reconhecido por andar sempre vestido com um impecável terno branco e com a aba do chapéu cobrindo os olhos, visita inesperadamente rodas de capoeira, nas quais participa com seus golpes ágeis, e depois some pelas ruas do centro do Rio de Janeiro. Zé Pelinda dá medo.

Ao narrarem coletivamente sobre a possível aparição do Zé Pelinda, as crianças estabeleceram um espaço simbólico que promoveu manifestações de curiosidade, ansiedade e temor. Pinóquio trouxe a presença de Zé Pelinda àquele grupo de crianças, retirando-o da margem e trazendo-o ao centro do diálogo. Embora fosse apresentado como uma espécie de trunfo pelo menino (afinal, ele tinha o poder de evocá-lo ou não), o Zé Pelinda também era um ser ameaçador. Mas por que exatamente? A explicação é dada pelo próprio menino, ao inserir o último personagem de nossa performance: ‘Ele é... O Maxuel gosta do Zé Pelinda. Eles dois são namorados’. Godzila exclama em resposta: ‘Eita!’.

6º personagem: o Viado

Mais uma avenida identitária é então aberta na performance narrativa aqui abordada. No cruzamento com as questões religiosas e étnico-raciais, as crianças agregam outro elemento: a discussão sobre gênero e, mais especificamente, sobre homossexualidade. Ela ganha novos contornos no momento em que Pinóquio explica a Godzila: ‘É um homem mais um homem’, Godzila complementa, acrescentando uma nova definição: ‘Você falou no ano passado que ele é viado, né? Ele não namora com mulher’. Viado dá medo.

Érica Renata de Souza nos ajuda a refletir sobre como a linguagem, em suas variadas formas, exerce um papel fundamental na criação e manutenção das regras de gênero socialmente aceitas. A partir da obra de Joan Swann, intitulada Girls, boys and language, ela comenta:

[...] a criança constrói um ‘sistema interno de regras de gênero’ a partir de sua experiência e das representações disponíveis na cultura em que está inserida. Através da linguagem escrita e falada e das imagens linguísticas e nãolinguísticas com as quais interage, a criança aprende as expectativas para seu comportamento. Contudo, a autora (Swann) não sugere que a criança seja um recipiente passivo de mensagens sociais, determinada pelas estruturas da linguagem, mas argumenta que ‘as crianças estão também (re)negociando relações com outros e (re)interpretando as imagens que encontram’ (Souza, 2006, p. 172SOUZA, Érica Renata de. Marcadores sociais da diferença e infância: relações de poder no contexto escolar. Cadernos Pagu, Campinas, n. 26, p. 169-199, 2006.).

De diferentes formas e nos distintos contextos sociais que frequentam as crianças vão aprendendo sobre as regras, normas, hierarquias de gênero (assim como de outros marcadores identitários) – e podemos pensar no importante lugar que a escola ocupa na experiência infantil e na manutenção dos papéis de gênero hegemônicos/tradicionais, sobretudo neste momento em que o governo brasileiro é ocupado por lideranças ultraconservadoras. Pinóquio e Godzila sabem bem o que estão negociando com os colegas e com a pesquisadora: homem mais homem é viado. Viado não namora com mulher. E eles, com 6 anos, já sabem disso há muito tempo...

No final da conversa/performance as crianças retomam o perigo da exortação. Pinóquio se exalta: ‘Não fala o nome dele, senão ele vai aparecer aqui’ – Barbie se desespera: ‘Para com isso, ele aparece!’, ao que Godzila responde: ‘Calma! É só uma lenda. Ele nem existe!’. Pinóquio, entretanto, não aceita que o outro determine se Zé Pelinda é real ou não, pois, quando Godzila afirma que é uma lenda, ele não recua e afirma categoricamente ‘Ele existe sim!’.

Mas afinal quem existe: Maxuel? Zé Pelinda? E como existem: no mundo natural ou como fenômeno da experiência? Como diz Daniele Silva (2012, p. 93)SILVA, Daniele Nunes Henrique. Imaginação, criança e escola. São Paulo: Summus, 2012.: “A composição dos personagens pelas crianças relaciona-se com as suas percepções sobre a realidade social circundante”. Fato é que na performance/em performance, todos eles existem.

Deus, Diabo, Macumbeiro, Bicho do Harry Potter, Zé Pelintra, Viado... todos esses seres estão nos falando de marcadores sociais da diferença. Chaveiro e Minella nos alertam que as vivências das crianças podem estar sendo limitadas em função do racismo e sexismo. Segundo elas,

[...] na sociedade ocidental estas hierarquizações se consolidam estruturalmente a partir da manutenção intencional de valores euro centrados transmitidos às crianças. Sendo assim, visto que se trata de um processo constante e influenciado por múltiplos fatores, talvez não seja possível identificar precisamente o momento em que os elementos raciais e de gênero passam a constituir as identidades nas crianças, pois é importante considerar a ancestralidade e os aspectos transgeracionais, principalmente ao analisar experiências afro diaspóricas. Entretanto, é pertinente afirmar que tais elementos, atuando como marcadores sociais da diferença, ocorrem desde as primeiras vivências de crianças, principalmente em territórios marginalizados historicamente (Chaveiro; Minella, 2021, p. 106CHAVEIRO, Maylla Monnik Rodrigues de Sousa; MINELLA, Luzinete Simões. Infâncias Decoloniais, Interseccionalidades e Desobediências Epistêmicas. Cadernos de Gênero e Diversidade, Salvador, v. 07, n. 01, p. 99-117, jan./mar. 2021.).

Até o momento vimos como esses marcadores atuam nos eventos narrados na performance. Agora vejamos como eles se manifestam no próprio evento narrativo, ou seja, nas performances das crianças. Para começar, será preciso relembrar da escolha dos nomes pelos quais as crianças queriam ser identificadas na pesquisa: Pinóquio, o boneco de madeira que vira gente e mente para seu criador Gepeto, é um menino negro. Godzila, um monstro gigante criado na explosão de uma bomba nuclear, semelhante a um dinossauro, é um menino negro. Rapunzel, a princesa das longas tranças, presa numa torre, é uma menina branca. Branca de Neve, a princesa de pele branca como a neve, perseguida por sua madrasta, é uma menina branca. Barbie, a boneca com forma de mulher, magra, esguia e loira, é uma menina negra. Aline Barros, uma cantora e pastora evangélica, é uma menina branca.

Como performances e políticas do medo operam no fortalecimento dos padrões hegemônicos

Ao longo do artigo procuramos demonstrar como diferentes concepções religiosas, étnico-raciais e de gênero aparecem na performance verbal e corporal das crianças, por meio da descrição de personagens e fatos que não apenas são alvo de um debate sobre sua existência, mas despertam um afeto bem específico. Branca de Neve explicita: ‘Tia, eu tô com medo’.

Para finalizar este texto, vamos levantar duas perspectivas de abordagem sobre o medo, que também podem se encontrar num cruzo: o medo como narrativa/performance e o medo como afeto político.

Para tratar da primeira, lembramos aqui do belo trabalho desenvolvido por Guilherme Fians no livro Entre Crianças, personagens e monstros, de 2015. Em sua etnografia, realizada em uma escola de Educação Infantil do Rio de Janeiro, Fians também se depara com episódios vividos-narrados pelas crianças que tematizam o medo do desconhecido, e se inspira, entre outros autores, em Tim Ingold para analisá-los. No artigo Caminhando com dragões: em direção ao lado selvagem, Ingold (2012, p. 19)INGOLD, Tim. Caminhando com dragões: em direção ao lado selvagem. In: STEIL, Carlos Alberto; CARVALHO, Isabel (Org.). Cultura, percepção e ambiente: diálogos com Tim Ingold. São Paulo: Terceiro Nome, 2012. P. 15-19. defende que, embora determinadas criaturas (como dragões ou, poderíamos dizer, na performance aqui enfocada, o Bicho do Harry Potter) possam não existir como elementos do mundo natural, existem como fenômenos da experiência. É por esse motivo que despertam medo. Para Fians (2015, p. 153)FIANS, Guilherme. Entre crianças, personagens e monstros: uma etnografia de brincadeiras infantis. Rio de Janeiro: Editora Ponteio, 2015.: “Parece que é a própria narração de histórias envolvendo o ser em questão que traz à tona a possibilidade de sua existência e manifestação no mundo, e é essa possibilidade que torna relevante a discussão sobre essa entidade e seus atributos”.

Se por um lado, como já percebemos em outros contextos (Hartmann, 2013HARTMANN, Luciana. Medo e encantamento em narrativas orais contadas por crianças. Revista Cerrados, Brasília, v. 22, p. 49-69, 2013.), o medo pode se combinar com o encantamento manifesto na estratégia performativa das crianças (o evento narrativo), por outro lado aparece aqui como uma reação de preconceito e negação do universo religioso afrobrasileiro ou da homossexualidade.

Em diálogo com Sílvio de Almeida, reconhecemos uma “política do medo” que impera na constituição das subjetividades adaptadas ao ambiente necropolítico (Almeida, 2019ALMEIDA, Silvio Luiz de. Racismo estrutural. São Paulo: Pólen, 2019.), presente desde a infância. É aqui que entra nossa segunda perspectiva: o medo como afeto político. O medo como parte daqueles mecanismos chamados por Foucault de biopolítica: um conjunto de estratégias de gestão da população por meio do controle dos corpos, ideias, subjetividades, em resumo, da vida em todas as suas esferas, desde o seu nascimento até a sua morte (Foucault, 1979FOUCAULT, Michel. Microfísica do Poder. Rio de Janeiro: Graal, 1979.; 2008FOUCAULT, Michel. O Nascimento da Biopolítica. Curso no Collège de France (1978-1979). São Paulo: Martins Fontes, 2008.). A biopolítica utiliza do biopoder como técnica para produzir corpos economicamente ativos e politicamente dóceis. A biopolítica é, em última instância, uma política do medo, lembra Zizek (2014, p. 45)ZIZEK, Slavoj. Violência. São Paulo: Boitempo editorial, 2014.. A gestão social é viabilizada através do medo, critica Safatle (2015)SAFATLE, Vladimir. O circuito dos afetos: corpos políticos, desamparo e o fim do indivíduo. São Paulo: Cosac Naify, 2015.. “O colonialismo é a política do medo. É criar corpos desviantes e dizer que nós temos que nos defender deles”, diz Grada Kilomba (2019)KILOMBA, Grada. Entrevista para o El País, Brasil, 11 set. 2019. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2019/08/19/cultura/1566230138_634355.html#:~:text=Uma%20semana%20depois%20da%20conversa,narra%20hist%C3%B3rias%20de%20racismo%20cotidiano. Acesso em: 02 jun. 2021.
https://brasil.elpais.com/brasil/2019/08...
, em entrevista para o El País, acrescentando o colonialismo ao debate.

O medo está presente do início ao fim da performance narrativa aqui abordada, manifesto de distintas formas em todos os personagens que vão se apresentando. O medo é o fio invisível que perpassa um evento cotidiano, ocorrido numa tarde qualquer em um centro de Educação Infantil da periferia de uma grande cidade brasileira. O medo cria padrões, reforça estruturas, mantém a ordem hegemônica. Mas não esqueçamos, o medo, como nos mostram as crianças, também pode ser narrativa e brincadeira. E, na encruzilhada do narrar como brincar, resistências podem se revelar, estruturas podem se transformar, a potência da infância pode imaginar/criar outros mundos.

Lidar com o racismo, o sexismo, a homofobia, com os preconceitos religiosos, de classe, exige lidar com o medo, medo do outro, medo do diferente. Infelizmente na época da pesquisa ainda não dispúnhamos do livro de Emicida, E foi assim que eu a escuridão e ficamos amigas, dedicado à sua filha Teresa, que finaliza assim: “[...] tudo é uma questão de olhar. Às vezes o que nos assusta tem muito da gente (só que é um pouco diferente)” (Emicida, 2020, s. pEMICIDA. E foi assim que eu e a escuridão ficamos amigas. Ilustrações de Aldo Fabrini. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2020.).

Notas

  • 1
    Em coerência com essa perspectiva analítica, portanto, substituiremos o que comumente chamamos de conversa por performance narrativa.
  • 2
    Temos chamado essa perspectiva metodológica, em fase de aprimoramento, de etnografia performativa (Hartmann; Sousa; Castro, 2020HARTMANN, Luciana; SOUSA, Jonielson Ribeiro de; CASTRO, Ana Carolina de Sousa. Luta pela terra, performance e protagonismo infantil no I Encontro Nacional das Crianças Sem Terrinha (Brasília – 2018). Tomo, Aracajú, v. 37, p. 253-286, jul./dez 2020.).
  • 3
    O projeto foi aprovado e autorizado pelo setor responsável pelo acompanhamento de pesquisas em instituições educativas públicas da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEEDF). As famílias e responsáveis pelas crianças colaboradoras da pesquisa autorizaram a participação delas por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e tinham ciência de todos os procedimentos e instrumentos que seriam utilizados durante o processo empírico.
  • 4
    Pluriversal, segundo Noguera (2019a)NOGUERA, Renato. Infância em afroperspectiva: articulações entre sankofa, ndaw e terrixistir. Revista Sul-Americana de Filosofia e Educação, Brasília, n. 31, p. 53-70, maio/out. 2019a., é uma menção à perspectiva ontológica do pensador Mogobe Ramose que se opõe à ideia de universal, que supõe a existência de uma perspectiva única e monolítica.
  • 5
    Nesse artigo, com uma complexidade muito maior do que teremos condições de abordar aqui, Noguera e Alves propõem a noção de Zonas de Emergência de Infância (ZEI), partindo de narrativas dos orixás Exu e Iroco, tomados como heterônimos da infância e do tempo. As ZEI emergiriam pelas linhas de força do narrar e do brincar, “como comunidade lúdica e temporária de retomada do estado de infância e devir-criança”.

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Editado por

Editoras responsáveis: Taís Ferreira; Melissa Ferreira; Fabiana de Amorim Marcello

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    02 Dez 2022
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    10 Maio 2022
  • Aceito
    30 Ago 2022
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