Acessibilidade / Reportar erro

Estudo experimental do efeito do ruído de miniventiladores em salas de estudos coletivas

Experimental study of the noise effects of mini fans in collective study rooms

Resumo

Salas de estudos são ambientes coletivos do tipo panorâmico, os quais possuem diversas estações de trabalho separadas ou não por divisórias. Neste trabalho, são analisadas a interferência na inteligibilidade da fala e as condições de conforto acústico em salas de estudos coletivas devido ao ruído produzido por miniventiladores de mesa (de plástico e metal) e ar-condicionado (split e de janela). Seis salas de estudos coletivas foram avaliadas em 11 configurações, variando o uso do equipamento de resfriamento, por meio das curvas de ruído NC e RC Mark II, tempo de reverberação (TR), tempo de decaimento inicial (EDT), índice de transmissão da fala (STI) e definição (D50). Os resultados da curva de ruído demonstram que todas as situações analisadas com osminiventiladoresatendem a NC40 (45 dB) para escritórios coletivos, o que não ocorreu com o uso dosaparelhos de ar-condicionado. Todas as configurações consideradas com os equipamentos de resfriamento apresentaram curva RC Mark II com característica de chiado (espectro desbalanceado em alta frequência). Além disso, observa-se que as condições físicas das salas, destacando-se a pouca área de absorção sonora, geram valores de parâmetros acústicos considerados impróprios para atividades de estudos coletivas, sendo as salas com maior volume os piores resultados.

Palavras-chave:
Salas de estudos coletivas; Ruído de ventilador; Inteligibilidade da fala; Conforto acústico

Abstract

Study rooms are collective open-plan spaces with several workstations, either separated or not separated by partitions. This study analyses the interference in speech intelligibility and the conditions of acoustic comfort in collective study rooms caused by the noise produced by desk mini fans (plastic and metal) and air conditioning (split and window units). Six collective study rooms were evaluated in 11 configurations, varying the use of cooling equipment, through the NC and RC Mark II noise curves, reverberation time (TR), early decay time (EDT), speech transmission index (STI) and definition (D 50 ). The noise curve results show that all situations with the mini fans met the NC40 (45 dB) standard for collective offices, which did not occur with the use of air conditioning units. The study room configurations with that cooling equipment presented RC Mark II curves with hissy characteristic (unbalanced spectrum at high frequency). In addition, the physical conditions of the room, especially the small area of sound absorption, generated acoustic parameter values considered inappropriate for collective study activities, with the rooms with the highest volume having the worst results.

Keywords:
Study rooms; Mini fan noise; Speech intelligibility; Acoustical comfort

Introdução

Ambientes coletivos do tipo panorâmico, os quais possuem divisórias baixas ou nenhuma, podem ser usados para trabalho individual, compartilhando apenas o espaço físico, ou para trabalhos colaborativos.

Há diversas pesquisas sobre o impacto do ruído nesses ambientes e esse ruído se propaga livremente pela falta de barreiras físicas. Nesses escritórios, também denominados de planta livre ou open-plan, os funcionários relatam insatisfação principalmente com conversas indesejadas e falta de privacidade no ambiente de trabalho (DANIELSSON; BODIN, 2009DANIELSSON, C. B.; BODIN, L. Difference in satisfaction with office environment among employees in different office types. Journal of Architecture and Planning Research, v. 26, n. 3, 2009.; HAAPAKANGAS et al., 2018HAAPAKANGAS, A. et al. Benefits of quiet workspace in open-plan offices: evidence from two office relocations. Journal of Environmental Psychology, v. 56, p. 63-75, 2018.; JENSEN; ARENS; ZAGREUS, 2005JENSEN, K.; ARENS, E.; ZAGREUS, L. Acoustical quality in office workstations, as assessed by occupant surveys. Indoor Air, p. 2401-2405, 2005.; KIM; DEAR, 2013KIM, J.; DEAR, R. Workspace satisfaction: The privacy-communication trade-off in open-plan offices. Journal of Environmental Psychology , v. 36, p. 18-26, 2013. ; PIERRETTE et al., 2014PIERRETTE, M. et al. Noise effect on comfort in open-space offices: development of an assessment questionnaire. Ergonomics , v. 58, n. 1, p. 96-106, 2014. ). Inclusive na análise de um escritório de planta livre brasileiro sem tratamento acústico, Passero e Zannin (2009)PASSERO, C.; ZANNIN, P. H. O conforto acústico em escritórios panorâmicos: estudo de caso em um escritório real. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 9, n. 1, p. 93-105, jan./mar. 2009. destacaram que a faixa de frequência predominante é correspondente à da voz humana.

Essa configuração de salas coletivas também pode ser encontrada em ambientes de ensino, como é o caso de salas de estudos - espaços informais de aprendizagem, onde o aluno pode estudar individualmente ou em pequenos grupos com auxílio de livros e outros materiais (SCANNELL et al., 2016SCANNELL, L. et al. The role of acoustics in the perceived suitability of, and well-being in informal learning spaces. Environment and Behavior, v. 48, n. 6, p. 769-795, 2016.). Na pesquisa de Braat-Eggen et al. (2017)BRAAT-EGGEN, E. et al. Noise disturbance in open-plan study environments: a field study on noise sources, student tasks and room acoustic parameters. Ergonomics, v. 60, n. 9, p. 1297-1314, 2017., os usuários de salas de estudos também relataram insatisfação com o elevado ruído de fundo, originário, sobretudo, de conversas paralelas e da movimentação de pessoas. O estudo de Liu, He e Qin (2021)LIU, H.; HE, H.; QIN, J. Does background sounds distort concentration and verbal reasoning performance in open-plan office? Applied Acoustics , v. 172, 2021. também constatou que nesse formato de escritório o tipo e intensidade do som tiveram efeitos significativos na precisão e eficiência da concentração e raciocínio verbal.

Tradicionalmente, esses ambientes possuem a altura muito menor do que as outras duas dimensões (MACCHIE; SECCHI; CELLAI, 2018MACCHIE, S. D.; SECCHI, S.; CELLAI, G. Acoustic issues in open plan offices: a typological analysis. Buildings, v. 8, n. 161, 2018.) e pouca absorção sonora. Em virtude disto, há a necessidade de implementação de um projeto acústico que inclua: divisórias, materiais absorvedores e controle do ruído de fundo (KERӒNEN; HAKALA; HONGISTO, 2020KERӒNEN, J.; HAKALA, J.; HONGISTO, V. Effect of sound absorption and screen height on spatial decay of speech: experimental study in an open-plan office. Applied Acoustics , v. 166, 2020.; KERӒNEN; VIRJONEN; HONGISTO, 2008KERӒNEN, J.; VIRJONEN, P.; HONGISTO, V. Characterization of acoustics in open offices - four case studies. In: ACOUSTICS, 8., Paris, 2008. Proceedings [...] Paris, 2008.; MACCHIE; SECCHI; CELLAI, 2018MACCHIE, S. D.; SECCHI, S.; CELLAI, G. Acoustic issues in open plan offices: a typological analysis. Buildings, v. 8, n. 161, 2018.; TROCKA-LESZCZYNSKA; JABLONSKA, 2021TROCKA-LESZCZYNSKA, E.; JABLONSKA, J. Contemporary architectural design of offices in respect of acoustics. Applied Acoustics , v. 171, p. 107541, 2021.; WENMAEKERS; VAN HOUT, 2019WENMAEKERS, R.; VAN HOUT, N. How ISO 3382-3 acoustic parameter values are affected by furniture, barriers and sound absorption in a typical open plan office. In: INTERNATIONAL CONGRESS ON ACOUSTICS, 23., Aachen, 2019. Proceedings [...] Aachen, 2019.).

Petersen e Ramussen (2012)PETERSEN, C. M.; RASMUSSEN, B. Acoustic design of open-plan schools and comparison of requirements. In: BALTIC-NORDIC ACOUSTICS MEETING, Odense, 2012. Proceedings [...] Odense, 2012. analisaram alguns parâmetros acústicos em uma escola dinamarquesa desse modelo após o tratamento acústico. Alcançaram-se valores de tempo de reverberação entre 0,36 e 0,40 s, um aumento em 50% de área de absorção e um STI entre grupos menor que 0,2 com a sala em uso - priorizando a incompreensão das conversas de terceiros. Segundo questionários aplicados houve um aumento na satisfação das condições acústicas com o novo projeto.

A NBR ISO 3382-3 (ABNT, 2017cASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-3: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 3: escritórios de planta livre. Rio de Janeiro, 2017c.), que trata sobre a medição de parâmetros de acústica de salas em escritórios de planta livre, propõe a análise de grandezas que comprovem a satisfação das condições acústicas percebidas pelos usuários. Por meio da aferição em diversas estações de trabalho do STI e do nível de pressão sonora (NPS), indica-se a avaliação da distância da distração - rD, da taxa de decaimento espacial da fala - D2,S, do NPS da fala a 4 m da fonte - Lp,A,S,4 m - e o NPS residual (ABNT, 2017bASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-2: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 2: tempo de reverberação em salas comuns. Rio de Janeiro, 2017b.). Um estudo feito por Wenmaekers e Van Hout (2019)WENMAEKERS, R.; VAN HOUT, N. How ISO 3382-3 acoustic parameter values are affected by furniture, barriers and sound absorption in a typical open plan office. In: INTERNATIONAL CONGRESS ON ACOUSTICS, 23., Aachen, 2019. Proceedings [...] Aachen, 2019. selecionou diversos escritórios open-plan com seus parâmetros disponíveis na literatura e classificou de acordo com as normas alemã e finlandesa, as quais utilizam os mesmos parâmetros da NBR ISO 3328-3. A maioria dos espaços encontra-se nas piores classificações, poucos são os que conseguem a avaliação máxima, o que é um problema recorrente nesses espaços.

Na norma brasileira NBR 10152 (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.) se definem os níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações; nela, os ambientes panorâmicos são representados por escritórios coletivos e devem possuir um LAeq de 45 dB, com uma tolerância de até 5 dB (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.). A revisão literária de Navai e Veitch (2003NAVAI, M.; VEITCH, J. A. Acoustic satisfaction in open-plan offices: review and recommendations. Ottawa: Institute for Research in Construction, 2003.) também recomenda esses valores com base na aceitação do usuário desses espaços referente a diversas pesquisas. Nos países nórdicos, há a indicação de um LAeq de até 35 dB para ruídos de equipamentos, entre outros quesitos a serem atingidos (PETERSEN; RASMUSSEN, 2018PETERSEN, C. M.; RASMUSSEN, B. Acoustic design of open-plan offices and comparison of requirements in the Nordic countries. In: BALTIC-NORDIC ACOUSTICS MEETING, Reykjavik, 2018. Proceedings [...] Reykjavik, 2018.). Esse parâmetro acústico, também citado na NBR ISO 3382, é de fundamental importância e deve ser mensurado sem a presença dos usuários, durante o horário de funcionamento, destacando-se os ruídos dos sistemas de ar-condicionado e provenientes do exterior. Vide o estudo de um espaço de aprendizagem na Finlândia com design aberto, em que as medições de LAeq ultrapassaram o indicado devido ao ruído dos equipamentos de ventilação (PÄÄKKÖNEN et al., 2015PÄÄKKÖNEN, R. et al. Acoustics and new learning environment: a case study. Applied Acoustics , v. 100, p. 74-78, 2015.).

Outro motivo de descontentamento dos usuários desses ambientes é o conforto térmico (KIM; DEAR, 2013KIM, J.; DEAR, R. Workspace satisfaction: The privacy-communication trade-off in open-plan offices. Journal of Environmental Psychology , v. 36, p. 18-26, 2013. ). Grandes espaços tornam difícil o controle da temperatura de maneira uniforme e o alto número de usuários consiste em diferentes noções de conforto térmico. Como resultado, o sistema de aquecimento e resfriamento de um local panorâmico pode gerar um alto consumo de energia.

Uma solução seria o uso de equipamentos individualizados ou para pequenos grupos, conhecidos como sistemas de conforto personalizados - PCS (Personal Comfort Systems). Um deles é o ventilador de mesa: aparelho pequeno e portátil de baixa potência que funciona por energia elétrica, conexão USB ou pilha. Ele é uma alternativa simples que pode ser facilmente introduzida em qualquer ambiente. Seu uso promove resfriamento individualizado e possibilita retardar o acionamento do ar-condicionado no ambiente, e, consequentemente, proporciona a diminuição do consumo de energia da edificação (RAJ et al., 2018RAJ, U. et al. Personal cooling strategies to improve thermal comfort in warm indoor environments: comparison of a conventional desk fan and air ventilation clothing. Energy & Buildings , v. 174, p. 439-451, 2018.). As pesquisas de André, De Vecchi e Lamberts (2020)ANDRÉ, M.; DE VECHHI, R.; LAMBERTS, R. Feasibility of using personal fans for increasing thermal comfort in mixed-mode shared workspaces in Brazil: a field study. In: WINDSOR 2020 RESILIENT COMFORT, London, 2020. Proceedings [...] London, 2020. e He et al. (2017)HE, M. et al. The influence of personally controlled desk fan on comfort and energy consumption in hot humid environments. Building and Environment, v. 123, p. 378-389, 2017. demonstraram que esses aparelhos podem ser aproveitados em locais de clima quente e úmido para aumentar a sensação de conforto térmico ou satisfação térmica dos usuários por meio do aumento da velocidade do ar local. Entretanto, assim como o ruído do ar-condicionado, o ruído desses aparelhos também pode incomodar os usuários, inclusive a ponto de mantê-lo desligado ou usá-lo apenas na menor velocidade (ANDRÉ; DE VECCHI; LAMBERTS, 2020ANDRÉ, M.; DE VECHHI, R.; LAMBERTS, R. Feasibility of using personal fans for increasing thermal comfort in mixed-mode shared workspaces in Brazil: a field study. In: WINDSOR 2020 RESILIENT COMFORT, London, 2020. Proceedings [...] London, 2020.).

Nesta pesquisa é analisado o efeito do ruído de dois formatos de miniventiladores de mesa - fabricados em plástico e metal - além de sistemas de ar-condicionado, do tipo split e de janela, na inteligibilidade da fala e nas condições de conforto acústico de salas de estudo coletivas. Destaca-se que tal pesquisa visa apenas o conforto acústico e excluem-se questões relacionadas ao conforto térmico dos usuários, o qual depende de vários fatores não inclusos no trabalho.

Referencial teórico

Ruído em ambientes de aprendizagem

Os escritórios panorâmicos foram tão propagados que seu modelo de estilo migrou para outros espaços, principalmente os educacionais. Salas open-plan divergem das tradicionais ao possuírem um espaço maior e flexível, onde a separação de ambientes é feita por mobiliário em vez de paredes (ALTMAN; WOHLWILL, 1978ALTMAN, I.; WOHLWILL, J. Children and the environment: advances in theory and research. Nova York: Plenum Press, 1978.). Há também o encorajamento para métodos de ensino diferentes e aprendizagem colaborativa entre os alunos (SHIELD; GREENLAND; DOCKRELL, 2010SHIELD, B.; GREENLAND, E.; DOCKRELL, J. Noise in open plan classrooms in primary schools: a review. Noise Health, v. 12, 2010.). Ao analisar duas escolasdinamarquesas de planta livre com boas condições acústicas, Petersen e Ramussen (2012)PETERSEN, C. M.; RASMUSSEN, B. Acoustic design of open-plan schools and comparison of requirements. In: BALTIC-NORDIC ACOUSTICS MEETING, Odense, 2012. Proceedings [...] Odense, 2012. concluíram que a solução resulta em ambientes com condições anecoicas, indicando aumentar as áreas de absorção sonora, incluir divisórias, distanciar os usuários das aberturas e aumentar a atenuação entre os grupos de alunos.

Além das salas de aulas, há os espaços informais de aprendizado, assim classificados por não possuírem a figura do professor, ao contrário dos espaços formais onde são realizadas as aulas. São ambientes em que o aluno pode estudar individualmente ou em pequenos grupos com auxílio de livros e outros materiais, e nos quais a aprendizagem é feita por meio da escrita, memorização e resolução de problemas (SCANNELL et al., 2016SCANNELL, L. et al. The role of acoustics in the perceived suitability of, and well-being in informal learning spaces. Environment and Behavior, v. 48, n. 6, p. 769-795, 2016.).

Braat-Eggen et al. (2019)BRAAT-EGGEN, E. et al. Auditory distraction in open-plan study environments: effects of background speech and reverberation time on a collaboration task. Applied Acoustics , v. 154, p. 148-160, 2019. relacionaram algumas diferenças entre os espaços de estudos panorâmicos com os escritórios do mesmo tipo. Entre elas está a idade dos usuários e a maior liberdade no horário de uso, além, é claro, da não obrigatoriedade de permanência no local. Estudantes incomodados com o ruído podem procurar outro local para estudar.

Andrade (2012)ANDRADE, J. M. F. M. Caracterização do conforto acústico em escolas. Porto, 2012. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Universidade do Porto, Porto, 2012. indica tratar salas de estudo e bibliotecas como salas de aulas, recomendando baixo nível de ruído de fundo e tempo de reverberação, sendo imprescindível a realização de projetos acústicos para esses ambientes. Com base em diversas normas sobre acústica em ambiente escolar, Andrade (2012)ANDRADE, J. M. F. M. Caracterização do conforto acústico em escolas. Porto, 2012. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Universidade do Porto, Porto, 2012. indica um TR entre 0,4 e 0,6 s e STI maior ou igual que 0,75. Greenland e Shield (2011)GREENLAND, E. E.; SHIELD, B. M. A survey of acoustic conditions in semi-open plan classrooms in the United Kingdom. Journal of theAcoustical Society of America, v. 130, n. 3, p. 1399-1410, 2011. recomendaram como estratégia de design acústico um TR máximo de 0,4 s e STI de pelo menos 0,7, em ambos os casos com a sala de aula open-plan desocupada. E de modo geral, para garantir a inteligibilidade da fala em espaços, Rossing (2007)ROSSING, T. D. (ed). Springer handbook of acoustics. New York: Springer Science & Business Media, 2007. indica um STI maior que 0,6.

Na literatura, há poucas pesquisas sobre os espaços informais de aprendizado, como bibliotecas e salas de estudos coletivas. Inclusive, Scannell et al. (2016)SCANNELL, L. et al. The role of acoustics in the perceived suitability of, and well-being in informal learning spaces. Environment and Behavior, v. 48, n. 6, p. 769-795, 2016. salientam a importância de analisar outros ambientes além das salas de aula, pois são nesses locais onde ocorre boa parte do aprendizado dos alunos. O estudo acústico de tais espaços é feito, então, com base em ambientes que possuam características de uso similares. Logo, para esse caso, a escolha mais prática seria utilizar as normas e estudos relacionados a escritórios panorâmicos, apesar de possíveis divergências em relação a características físicas e atividades realizadas.

Parâmetros de qualidade acústicos

O tempo de reverberação (TR) corresponde ao tempo necessário que leva para o NPS do ambiente decair 60 dB em relação ao NPS do estado estacionário, após o fim da emissão do som no ambiente, podendo, também, ser analisado em 20 ou 30 dB (ABNT, 2017bASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-2: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 2: tempo de reverberação em salas comuns. Rio de Janeiro, 2017b.).

Em ambientes coletivos prioriza-se uma maior área de absorção sonora (PETERSEN; RAMUSSEN, 2012PETERSEN, C. M.; RASMUSSEN, B. Acoustic design of open-plan schools and comparison of requirements. In: BALTIC-NORDIC ACOUSTICS MEETING, Odense, 2012. Proceedings [...] Odense, 2012.). Logo o ideal são valores baixos de TR, como reforçam as normas para ambientes coletivos dos países nórdicos e do Reino Unido. Islândia e Suécia indicam até 0,5 s para escritórios e 0,4 s para escolas.

Características do ambiente influenciam no cálculo do tempo de reverberação. A fórmula de Eyring é aplicada em ambientes com coeficiente médio de absorção sonora superior a 0,3. A Equação 1 apresenta a fórmula com base no volume da sala (V), na área total das superfícies presentes no ambiente (S) e no coeficiente médio de absorção sonora (α m ) (ABNT, 1992ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 12179: tratamento acústico em recintos fechados. Rio de Janeiro, 1992.).

TR = 0,161 V - 2,3 S log log ( 1 - α m ) Eq. 1

Outro parâmetro é o tempo de decaimento inicial (EDT), o qual corresponde às primeiras reflexões do ambiente, muitas vezes irregular (LONG, 2006LONG, M. Architecture Acoustic. California: Elsevier Academic Press, 2006.). Informação importante para a inteligibilidade da fala no local (HONGISTO; KERӒNEN; LARM, 2004HONGISTO, V.; KERӒNEN, J.; LARM, P. Simple model for the acoustical design of open-plan offices. Acta Acustica United with Acustica, v. 90, p. 481-495, 2004.). A pesquisa de Greenland e Shield (2011)GREENLAND, E. E.; SHIELD, B. M. A survey of acoustic conditions in semi-open plan classrooms in the United Kingdom. Journal of theAcoustical Society of America, v. 130, n. 3, p. 1399-1410, 2011. indica que para uma boa sala de aula o EDT médio de 500, 1.000 e 2.000 Hz não deve exceder 0,35 s.

O índice de transmissão da fala (STI) condiz com a inteligibilidade da fala em ambientes, ou seja, o entendimento da voz humana. É representado por uma escala de 0 a 1. Quanto mais próximo de 1, maior será o entendimento e clareza da fala no ambiente, segundo consta na NBR IEC 60268-16 (ABNT, 2018ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR IEC 60268-16: equipamentos de sistemas de som. parte 16: avaliação objetiva da inteligibilidade da fala pelo índice de transmissão da fala. Rio de Janeiro, 2018.). Seu valor depende do TR e da relação sinal-ruído (Signal to Noise Ratio - SNR). Esta última é a diferença entre o nível sonoro da fala humana e o ruído de fundo do ambiente, sendo limitada a ±15 dB (LONG, 2006LONG, M. Architecture Acoustic. California: Elsevier Academic Press, 2006.). Aumento no tempo de reverberação ocasiona menor fator de modulação, ou seja, maior interferência na fala humana. E o oposto acontece para a análise da SNR - maior valor de SNR indica que a fala sobrepõe-se ao ruído de fundo, e, consequentemente, facilita a inteligibilidade no ambiente, determinando maior fator de modulação (MÜLLER, 2005MÜLLER, S. Medir o STI. In: SEMINÁRIO DE MÚSICA CIÊNCIA TECNOLOGIA, 2., São Paulo, 2005. Anais [...] São Paulo, 2005.). Essa relação pode ser averiguada na Equação 2, a qual representa a função de transferência de modulação e simplifica o cálculo do STI excluindo o uso da resposta ao impulso. Ele é calculado em relação a 14 frequências de modulação (0,63 Hz a 12,5 Hz) e a 7 frequências de banda de oitava, entre 125 Hz e 8.000 Hz, totalizando 98 combinações (HONGISTO; KERӒNEN; LARM, 2004HONGISTO, V.; KERӒNEN, J.; LARM, P. Simple model for the acoustical design of open-plan offices. Acta Acustica United with Acustica, v. 90, p. 481-495, 2004.).

m ( f m ) = 1 1 + 2 π f m T 60 13,8 2 1 1 + 10 - 0,1 SNR Eq. 2

Esse valor é utilizado para extrair o nível de sinal-ruído aparente, o qual seria o resultado do impulso com as distorções (Equação 3). A ele será aplicado a correção das frequências de 125Hz a 8.000 Hz (Equação 4). Todos os valores serão sintetizados e o resultado será o índice de transmissão (Equação 5).

L SNapp = 10 log m 1 - m [ dB ] Eq. 3

L SNapp ̅ = i = 1 7 w i L S Napp i [ dB ] Eq. 4

IT = L SNapp ̅ + 15 30 Eq. 5

Galbrun e Kitapci (2014)GALBRUN, L.; KITAPCI, K. Accuracy of speech transmission index predictions based on the reverberation time and signal-to-noise ratio. Applied Acoustics , v. 81, p. 1-14, 2014. demonstraram que a maior variação do STI ocorre quando a relação sinal-ruído varia entre -10dB e 10 dB, considerando também diferentes valores do tempo de reverberação. Os autores ainda apontam que as maiores imprecisões da previsão do STI são devido a dados de entrada, especialmente se coeficientes de absorção sonora inadequados forem usados para estimar o tempo de reverberação.

Nesses ambientes coletivos, há uma relação interessante para o STI. Como o espaço pode ser ocupado por diversos grupos (individuais ou pequenos), é necessária uma boa inteligibilidade da fala dentro desses grupos almejando uma boa comunicação, ou seja, um valor alto do STI. Entretanto, entre os grupos o ideal é um valor de STI baixo para evitar que conversas de terceiros atrapalhem o desempenho em tarefas complexas, como comprovado por Hongisto (2005)HONGISTO, V. A model predicting the effect of speech of varying intelligibility on work performance. Indoor Air, v. 15, p. 458-468, 2005.. Além do que a baixa inteligibilidade da fala acarreta maior nível de privacidade.

A inteligibilidade do ambiente também está relacionada com a definição (D50), caracterizada por identificar os 50 ms das primeiras reflexões. Segundo Brandão (2018)BRANDÃO, E. Acústica de salas: projeto e modelagem. São Paulo: Blucher , 2018., pode ser calculada pela Equação 6, a depender da velocidade do som (c0), área das superfícies presentes no meio (S), coeficiente médio de absorção sonora / e volume do ambiente (V):

D 50 = 1 - e - c o S α ̅ 4 V 0,05 Eq. 6

Seu valor máximo é 1, o qual representa o melhor resultado. Um valor menor que 0,5 indica que as reflexões tardias no ambiente possuem muita energia, o que acarretariaprejuízo à inteligibilidade (BRANDÃO, 2018BRANDÃO, E. Acústica de salas: projeto e modelagem. São Paulo: Blucher , 2018.). Rocha (2004)ROCHA, L. Estudo e análise da acústica de ambientes submetidos a sistemas de áudio. Porto Alegre, 2004. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004. sugere avaliar preferencialmente as médias frequências por estarem relacionadas à fala humana. Reforça-se na literatura um valor alto, em torno de 0,65, como adequado para sala destinada à fala (ANSAY; ZANNIN, 2016ANSAY, S.; ZANNIN, P. H. Using the parameters of definition, D50, and reverberation time, TR, to investigate the acoustic quality of classrooms. Canadian Acoustics, v. 44, n. 4, 2016.; CUSTÓDIO; GERGES, 2006CUSTÓDIO, M.; GERGES, S. Qualidade sonora através de ensaios experimentais em centro de convenção multiuso. In: ENCONTRO NACIONAL DE TECNOLOGIA NO AMBIENTE CONSTRUÍDO, 11., Florianópolis, 2006. Anais [...] Florianópolis, 2006.; ROCHA, 2004ROCHA, L. Estudo e análise da acústica de ambientes submetidos a sistemas de áudio. Porto Alegre, 2004. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004.), inclusive para salas de aula open-plan (OZCEVIK; YÜKSEL, 2005OZCEVIK, A.; YÜKSEL, Z. Acoustical requirements in architectural design studios. In: FORUM ACUSTICUM, Budapest, 2005. Proceedings [...] Budapest, 2005.).

Análise por meio de curvas de ruído

Curvas critério de ruído

As curvas NC (Noise Criteria) baseiam-se na análise das frequências de63 Hz a 8.000 Hz do ambiente. O valor da curva obtido pelo método tangencial pode ser associado a uma avaliação subjetiva do ambiente, variando entre muito silencioso e extremamente ruidoso.

Ao analisar diversos espaços informais de aprendizagem, Scannell et al. (2016)SCANNELL, L. et al. The role of acoustics in the perceived suitability of, and well-being in informal learning spaces. Environment and Behavior, v. 48, n. 6, p. 769-795, 2016. encontraram valores entre NC15 e NC45 em ambientes desocupados. O estudo cita que a norma americana de avaliação de ruído de salas - ANSI S12.2-1995 (AMERICAN..., 1995AMERICAN NATIONAL STANDARDS INSTITUTE. ANSI S12.2-1995: american national standard criteria for evaluatin room noise. Nova York, 1995.) - recomenda um valor máximo de NC40 para esses casos. A NBR 10152 (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.) sugere o mesmo valor para escritórios coletivos.

As curvas NC são de fácil aplicação, porém descartam frequências abaixo de 63 Hz. Portanto, não são recomendadas para caracterizar ruídos de ambientes internos relacionados ao sistema de ar-condicionado (BISTAFA, 2018BISTAFA, S. Acústica aplicada ao controle de ruído. 3. ed. São Paulo: Blucher, 2018.). Outro ponto negativo é que a classificação apenas pelo método tangencial não identifica possíveis desbalanceamentos do espectro (AMERICAN..., 2007AMERICAN SOCIETY OF HEATING, REFRIGERATING AND AIR-CONDITIONING ENGINEERS. Applications handbook: sound and vibration control. Atlanta, 2007. Cap. 48.).

Curvas critério de avaliação de salas

As curvasRoom Criteria Mark II apresentam uma análise do ruído interno mais detalhada do que as curvas NC, tanto de modo qualitativo como quantitativo.

Tais curvas contemplam um espectro sonoro de 16 Hza 4.000 Hz (dividido em baixa, média e alta frequência) e permitem o diagnóstico do ruído, caso a curva esteja desbalanceada, mediante o QAI (Quality Assessment Index).

Por essas características, o manual da Ashrae (Associação Americana de Engenheiros de Aquecimento, Refrigeração e Ar-condicionado) considera esse método como a melhor forma de avaliação para sistemas de climatização (AMERICAN..., 2007AMERICAN SOCIETY OF HEATING, REFRIGERATING AND AIR-CONDITIONING ENGINEERS. Applications handbook: sound and vibration control. Atlanta, 2007. Cap. 48.).

A curva RC Mark II utiliza o PSIL (Preferred Speech Interference Level)para indicar a curva de referência, e a partir dele calcula-se os desvios espectrais por faixa de frequência (diferença entre o valor da curva de referência e curva da medição).

O QAI é a diferença entre o maior e menor desvio espectral encontrado. A depender desse valor teremos um ruído de classificação neutra ou que provoque um incômodo parcial ou total no usuário. As características do ruído são determinadas pela faixa de frequência em destaque - retumbante (rumble) para baixas frequências, rugido (roar) para médias frequências ou chiado (hiss) para altas frequências.

Caso a curva da medição tenha valores superiores a 65dB e 75 dB nas frequências de 16 Hz ou 31,5 Hz,o ambiente pode sercaracterizado com vibração moderadamenteou claramente perceptível.

Normas acústicas referentes a ruído em ambientes coletivos

Normas brasileiras

No Brasil, a NBR 10152 (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.) descreve os procedimentos de medição e valores de referência em relação ao NPS e curva NC. Ela indica para escritórios coletivos 45 dB e curva NC40, ambos com uma tolerância de 5 dB.

Para complementar, a ISO 3382-3 (ABNT, 2017cASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-3: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 3: escritórios de planta livre. Rio de Janeiro, 2017c.) pode ser usada paras espaços coletivos de aprendizagem com as características já mencionadas. A norma indica valores apenas para os parâmetros: D2,S≥ 7 dB, Lp,A,S,4 m ≤ 48 dB e rD ≤ 5 m baseados em análises de escritórios nórdicos. Esses parâmetros demonstram ser mais sensíveis à introdução de absorção sonora no teto e em divisórias do que o tempo de reverberação (KERӒNEN; VIRJONEN; HONGISTO, 2008KERӒNEN, J.; VIRJONEN, P.; HONGISTO, V. Characterization of acoustics in open offices - four case studies. In: ACOUSTICS, 8., Paris, 2008. Proceedings [...] Paris, 2008.).

Infelizmente as duas normas citadas não são o suficiente para a criação de um bom projeto acústico no Brasil. O impedimento está na falta de valores e de estudos sobre o tema relacionados com os usuários brasileiros, como apontado na pesquisa de Camargo et al. (2018)CAMARGO, D. et al. Development and application of questionnaires to assess acoustic environment in open plan offices. In: EURONOISE, Grécia, 2018. Proceedings [...] Grécia, 2018., que indica a necessidade de aprofundamento sobre o assunto. Os valores recomendados devem representar o que os usuários entendem por aceitável acusticamente e atender suas expectativas, como indica o estudo de Larrieu e Harvie-Calrk (2017)LARRIEU, F.; HARVIE-CALRK, J. Contrasting open plan office design implications from emerging French, German and Finnish standards. In: INTERNATIONAL CONGRESS ON SOUND AND VIBRATION, 24., Londres, 2017. Proceedings [...] Londres, Inglaterra, 2017.. O estudo demonstra as diferentes abordagens em relaçãoàs normas da França, Alemanha e Finlândia para esses ambientes, resultando em classificações, parâmetros e valores distintos, assim como sugestões de intervenções.

Normas internacionais referentes a ambiente coletivo de aprendizagem

Ambientes escolares do tipo coletivo são habituais nos países nórdicos e Reino Unido, logo suas normas indicam valores de referência para parâmetros acústicos. O Quadro 1sintetiza alguns casos com base em artigos de publicações científicas (DEPARTMENT..., 2015DEPARTMENT FOR EDUCATION. United Kingdom. Building Bulletin 93: acoustic design of schools: performance standards. London, 2015.; PETERSEN; RAMUSSEN, 2012PETERSEN, C. M.; RASMUSSEN, B. Acoustic design of open-plan schools and comparison of requirements. In: BALTIC-NORDIC ACOUSTICS MEETING, Odense, 2012. Proceedings [...] Odense, 2012.).

A norma inglesa referente à acústica em edificações escolares - Building Bulletin 93 (BB93) - possui ambientes open-plan como um dos tipos de salas escolares. O tempo de reverberação indicado pela BB93 pode ser calculado de duas maneiras: a média das frequências por banda de oitava de 500Hz a 2.000 Hz ou a média entre as frequências de um terço de banda de oitava de 400 Hz a 2.500 Hz. Ambas as situações devem ser calculadas nos ambientes mobiliados, prontos para uso e desocupados. Em ambientes panorâmicos de ensino, o tempo de reverberação deve ser no máximo 0,5 s, para outras atividades no mesmo espaço o limite é ampliado para 1,2 s.

Em relação ao STI, a norma indica dois valores para espaços panorâmicos. Em locais que pessoas estejam trabalhando colaborativamente, o STI deve ser maior ou igual a 0,6. Fora desses espaços, indica-se um valor menor ou igual a 0,3 nos momentos de atividades mais críticas (DEPARTMENT..., 2015DEPARTMENT FOR EDUCATION. United Kingdom. Building Bulletin 93: acoustic design of schools: performance standards. London, 2015.). Ou seja, reconhece-se que esses ambientes possuem diversas funções, porém os níveis mínimos devem corresponder aos momentos mais críticos.

Método

No total,seis salas de estudos de diferentes prédios de uma universidade foram selecionadas neste trabalho. As medições ocorreram em dias úteis, entre 8 e 14 h, durante o período de restrição das atividades presenciais dentro da universidade em razão da pandemia do coronavírus.

Caracterização dos materiais

Salas de estudos coletivas

Os ambientes serão identificados pelos números de 1 a 6, sendo agrupados em três modelos (A, B e C) de acordo com semelhanças entre si, como descrito na Tabela 1.

Quadro 1
Parâmetros acústicos para ambientes escolares panorâmicos identificados em normas internacionais

Tabela 1
Descrição e informações sobre as salas de estudo coletivas

A sala 1 apresenta 13 baias individuais, enquanto a sala 2 apresenta 15.Todas as salas possuemmateriais similares em sua composição, como parede de alvenaria, piso de granilite, mobiliário de madeira, cadeiras estofadas e janela com vidro comum. Divergem as salas 2 e 6 com acabamento das paredes e teto em reboco liso. Outra diferença foi a presença de armários metálicos e lousa de vidro nas salas 3, 4 e 6.

Esse tipo de materiais e superfícies impactam no coeficiente de absorção sonora médio de cada ambiente. Com base em valores de coeficientes de absorção sonora das frequências de 125Hza 4.000 Hz apresentados por Bistafa (2018)BISTAFA, S. Acústica aplicada ao controle de ruído. 3. ed. São Paulo: Blucher, 2018., podemos calcular uma média da absorção presente em cada sala de acordo com o cálculo proposto por Eyring. As salas do modelo A são as que apresentam maior absorção sonora (sala 1 - 12,2 m2 e sala 2 - 14,5 m2), em seguida as do modelo C (sala 5 - 10,1 m2 e sala 6 - 9,3 m2) e por fim as do modelo B (sala 3 - 8,9 m2 e sala 4 - 9,1 m2).

A Figura 1 relaciona todas as salas analisadas com suas respectivas plantas baixas e a Figura 2 exemplifica por foto três delas.

Figura 1
Planta baixa das salas do modelo A, B e C

Figura 2
Imagens das salas dos modelos A, B e C

Equipamentos: miniventiladores e ar-condicionado

Dentre os diversos modelos disponíveis no mercado, foram utilizados dois tipos de miniventiladores para a medição, sendo um deles denominado miniventilador metálico por sua composição, que possui a estrutura vazada e hélice de 4 pás com diâmetro de 96 mm. Funciona apenas por conexão USB - o que em algumas medições trouxe limitações para seu posicionamento no ambiente. O modelo também permite ajuste de posição de 360o no sentido horizontal.

O outro aparelho é fabricado em plástico duro e possui três opções de velocidade de acionamento. Funciona com pilha recarregável de li-ion 3,7 V ou por cabo USB. Sua hélice de 5 pás possui 85 mm de diâmetro. A Figura 3 mostra os miniventiladores do tipo metálico e de plástico.

Os níveis de potência sonora (Lw,A) dos miniventiladores foram determinados na faixa de bandas de frequência de terço de oitava, entre 50 Hz e 20k Hz com ponderação da curva A, em câmara reverberante segundo a ISO 3741/2010 determina. Os valores de Lw,A estão apresentados na Figura 4, sendo o miniventilador metálico denominado VM e o miniventilador de plástico representado pela velocidade de acionamento - V1, V2 e V3. Ambos os modelos de miniventiladores apresentam os maiores valores de potência sonora na faixa de frequência entre 250 Hz e 4.000 Hz. Observa-se que até a frequência de 500 Hz, os valores de todos os miniventiladores apresentam muitas variações e máximos de potência sonora relacionados a rotação e número de pás. Como esperado para o ventilador de plástico, temos em V3 os maiores valores de potência sonora, e, assim como todas as situações, há um declínio constante na potência sonora a partir de 1.250 Hz. Em relação aos valores totais de potência sonora ponderada em A, o miniventilador metálico possui a menor potência (40 dB). O miniventilador de plástico apresenta um aumento da potência sonora de aproximadamente 5 dB ao aumentar a velocidade de rotação das pás, sendo o maior valor global de 60 dB do miniventilador V3.

Todas as salas possuíam aparelhos de ar-condicionado instalados e seu uso é recorrente. Os aparelhos da sala 1 (30.000 BTU), 3 a 5 (24.000 BTU) e 6 (60.000 BTU) são do modelo split, a sala 2 é a única que possui um ar-condicionado do tipo janela (18.000 BTU). Para este trabalho, os aparelhos split foram analisados com a mesma configuração - setpoint de 21 oC, palhetas fixas, modo frio e velocidade máxima do vento.

Medições acústicas nas salas de estudo coletivas

As medições de nível de pressão sonora foram realizadas nas salas, com o sonômetro Analyzer 2270 Brüel &Kjær e seguiram as recomendações daNBR 10152 (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.). Foram utilizados 3 pontos de medição nas salas 1, 2 e 4, enas outras salas considerou-se 1 ponto a mais.As alturasde posição do microfone variaram entre 1,10 m e 1,40 m. Em todas as salas, as medições acústicas duraram 30 segundos e foram realizadas em várias configurações, como explicitado no Quadro 2.

A medição da resposta ao ruído interrompido foi baseada na NBR 3382-2 (ABNT, 2017bASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-2: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 2: tempo de reverberação em salas comuns. Rio de Janeiro, 2017b.), além do sonômetro foram utilizados uma fonte sonora omnidirecional DCC-100 com potência de 300 W da GROM e um amplificador PSC2.400 da Hypex electronics. O microfone foi posicionado a 1,2 m de altura, enquanto a fonte esteve em duas alturas: 1,2 e 1,6 m. As salas do modelo A receberam 2 pontos de microfone, as salas B receberam um ponto a mais, e as salas C mais dois pontos em virtude de suas dimensões. Em cada posição de fonte e microfone foram registradas 2 interrupções de ruído.

Os dados T30 e EDT, nas frequências de 400 Hz a 2.500 Hz, foram comparados com o indicado pela norma inglesa BB93 para salas de aula open-plan. A norma estipula um tempo de reverberação médiomenor ou igual a 0,5 s.

Os parâmetros acústicos STI e D50 foram calculados de acordo com o expresso na seção:parâmetros de qualidade acústicos. O STI foi calculado pelo método indireto considerando o TR mensurado e o valor da relação sinal-ruído de 10 dB, este sendo apresentado por Galbrun e Kitapci (2014)GALBRUN, L.; KITAPCI, K. Accuracy of speech transmission index predictions based on the reverberation time and signal-to-noise ratio. Applied Acoustics , v. 81, p. 1-14, 2014. como o valor máximo da faixa de SNR, o qual gera grandes variações no valor de STI. Ressalta-se que essa simplificação do método indireto do STI gera valores menores do que quando mensurado no ambiente, sendo variações perceptíveis. Todavia, os autores indicaram que os resultados das previsões do STI são mais conservativos baseados nos dados de entrada de T60 e SNR. Para a obtenção da definição (D50) foi utilizada a Equação 6, considerando as bandas de frequências de oitava de 500 Hz e 1.000 Hz segundo a NBR 3382-1 (ABNT, 2017aASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-1: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 1: salas de espetáculos. Rio de Janeiro, 2017a. ).

As curvas de ruído NC e RC Mark II foram calculadas a partir dasmedições do nível de pressão sonora, sendo comparadas respectivamente com o indicado pela NBR 10152 (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.) para escritórios coletivos e com o manual da Ashrae para sistemas de climatização.

Figura 3
Miniventiladores utilizados na medição

Figura 4
Níveis de potência sonora (Lw,A), em bandas de frequência de terço de oitavas, representativos dos miniventiladores VM, V1, V2 e V3

Quadro 2
Descrição das configurações de medição acústica nas salas de estudo coletivas

Os parâmetros rD, D2,S e Lp,A,S,4 m indicados na NBR 3382-3 (ABNT, 2017cASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-3: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 3: escritórios de planta livre. Rio de Janeiro, 2017c.) não foramavaliados neste estudo por serem inviáveis para as salas de estudos coletivas em análise, as quais têm dimensões pequenas quando comparadas aos escritórios de planta livre descritos na norma. Além disso, a pesquisa de Braat-Eggen et al. (2017)BRAAT-EGGEN, E. et al. Noise disturbance in open-plan study environments: a field study on noise sources, student tasks and room acoustic parameters. Ergonomics, v. 60, n. 9, p. 1297-1314, 2017. nesses ambientes não identificou relação significativa entre os parâmetros e o incômodo sonoro dos usuários com base nas limitações do tema.

Resultados e discussões

NPS nas salas de estudo coletivas

A Figura 5 demonstra os valores médios do nível de pressão sonora equivalente (LAeq) por sala em cada configuração de medição, conforme descrita no Quadro 2, com destaque em cinza para valores considerados aceitáveis em escritórios coletivos segundo a NBR 10152 (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.).

Percebe-se que à medida que são adicionadosminiventiladores à sala, aumenta o LAeq independente do modelo dominiventilador. O modelo de plástico apresenta ainda outra característica, o aumento da velocidade de rotação das pás também impacta o NPS do ambiente, principalmente na condição 1V3, 3V1, 6V1 e 3V13V2. Ao compararmos um miniventilador com a menor e maior velocidade, temos uma diferença máxima de 4 dB nas salas de número 1, 3 e 5. A configuração com 3 miniventiladores na velocidade 1 e 3 equipamentos na velocidade 2 apresenta uma diferença de apenas 1 dB em relação à configuração de 6 miniventiladores na velocidade 1.

Os casos 1V3 (salas 1 a 4) e 3V1 (salas 2 a 4), além de todas as salas com 6 miniventiladores de plástico, encontram-se na faixa de tolerância. Esse valor é ultrapassado nas salas do modelo A e C ao acionarmos o ar-condicionado.

A análise por tipo e quantidade de miniventilador evidencia que o modelo de plástico é mais ruidoso do que o metálico, o que está correlacionado por esse aparelho ter uma potência sonora até 20 dB menor do que o aparelho de plástico na sua maior velocidade e possuir um espectro de potência sonora com menores variações do Lw,A na região abaixo de 500 Hz (vide Figura 4).

Observa-se também na Figura 5 que as salas de cada modelo, ou seja, com características similares entre si, apresentam a mesma tendência nos valores de LAeq. E dentre os modelos, os menores valores de LAeq são apresentados nas salas com maiores volumes - modelo C (salas 5 e 6).

As curvas das Figuras 6 a 9 mostram o espectro sonoro médio (LAeq) representativo de todas as salas avaliados por configuração. A incerteza expandida de medição do NPS foi calculada com base na NBR 10152 (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.), sendo utilizados valores pertinentes ao equipamento sonoro do tipo classe 1. Ela foi representada por barras nas Figuras 6 a 9, os maiores valores foram registrados nas baixas frequências (50 Hz a 200 Hz), com ocorrências entre 2dB e 6 dB. O valor máximo do desvio padrão nas bandas de frequências superiores a 250 Hz foi de 5 dB.

Figura 5
Valores de LAeq obtidos na configuração de medição acústica para cada sala de estudo coletiva

Figura 6
Média dos LAeq, em bandas de frequência de terço de oitava, para som residual e ar-condicionado, e a incerteza expandida de medição

Figura 7
Média dos LAeq, em bandas de frequência de terço de oitava, para som residual, ar-condicionado e miniventilador metálico, e a incerteza expandida de medição

Figura 8
Média dos LAeq, em bandas de frequência de terço de oitava, para som residual, ar-condicionado e com 1 miniventilador de plástico, e a incerteza expandida de medição

Figura 9
Média dos LAeq, em bandas de frequência de terço de oitava, para som residual, ar-condicionado e com 3 e 6 miniventiladores de plástico, e a incerteza expandida de medição

Ambos os miniventiladores possuem predominância do LAeqnas bandas de frequências de 250 Hz a 4.000 Hz, condizentes com a análise da potência sonora apresentada (ver Figura 4). Por outro lado, o espectro sonoro do ar-condicionado demonstra-se mais estável, com menos variações no LAeq, destacando-se as médias frequências (200 Hz a 2.000 Hz), valores que podem vir a interferir na comunicação dentro do ambiente, pois segundo a Ashrae (AMERICAN..., 2007AMERICAN SOCIETY OF HEATING, REFRIGERATING AND AIR-CONDITIONING ENGINEERS. Applications handbook: sound and vibration control. Atlanta, 2007. Cap. 48.) o alcance de interferência na fala é a região entre 500 Hz e 2.000 Hz.

Também confirmado em uma análise de espectros de escritórios que apresentaram um grande incômodo por fala, a qual demonstrou maior diferença na região de 500 Hz ao comparar os espectros do ambiente apenas com sistema de ar-condicionado e durante seu funcionamento (TANG; WONG, 1998TANG, S. K.; WONG, C. T. Performance of noise indices in office environment dominated by noise from human speech. Applied Acoustics , v. 55, n. 4, p. 293-305, 1998.).

Vale ressaltar que o espectro sonoro da sala 2, na configuração ar-condicionado, divergiu da mesma configuração em outras salas ao apresentar maior valor de NPS nas baixas frequências como também maior variação nas médias e altas frequências. Isso provavelmente se deve ao fato de que o aparelho é do modelo de janela, enquanto os outros equipamentos analisados eram do tipo split.

O histograma da incerteza expandida de medição do LAeq médio das bandas de frequência de terço de oitava, apresentado na Figura 10, confirma que a introdução de mais miniventiladores no ambiente não remete a um impacto significativo no NPS de acordo com o tipo de sala. Para os dois modelos de equipamento analisados, maior quantidade do mesmo tipo indica um aumento da ocorrência de desvio padrão de até 2 dB.

Parâmetros de qualidade acústicos

A Tabela 2 apresenta os dados médios do STI, TR30, EDT e D50, considerando os pontos de medição em cada sala. Salienta-se que os valores de TR30 e EDT correspondem à média das bandas de frequências de terço de oitava entre 400 Hz e 2.500 Hz e para o D50 a média entre as bandas de frequências de oitava de 0,5 kHz e 1 kHz. O desvio padrão do TR30 foi calculado com base na NBR 3382-2 (ABNT, 2017bASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-2: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 2: tempo de reverberação em salas comuns. Rio de Janeiro, 2017b.) e considerou 4 combinações de posições fonte-receptor nas salas do tipo A, 6 nas salas B e 8 combinações nas salas C.

Os resultados demonstram-se longe do especificado pela norma inglesa BB93, a qual sugere um TR máximo de 0,5 s, e pelas normas de alguns países nórdicos, que são mais rigorosas e consideram o valor de 0,4 s. Nesses ambientes, o intuito do projeto acústico é priorizar o som direto e diminuir as reflexões. Um valor alto desses parâmetros demonstra a necessidade de intervenção e uso de materiais absorvedores sonoros.

As salas 1 e 4 apresentam menores valores, em contrapartida as salas 5 e 6 do modelo C, as quais possuem os maiores volumes e mais mobiliário, são exatamente as salas com os maiores tempo de reverberação.

Figura 10
Histograma da incerteza expandida de medição em relação às medições do LAeq médio em bandas de frequência efetuadas por configuração

Os valores de EDT seguem a tendência do T30 e podem ser considerados altos quando comparados com os 0,35 s recomendados por Greenland e Shield (2011)GREENLAND, E. E.; SHIELD, B. M. A survey of acoustic conditions in semi-open plan classrooms in the United Kingdom. Journal of theAcoustical Society of America, v. 130, n. 3, p. 1399-1410, 2011.. Esses resultados significam que as salas analisadas possuem pouca absorção sonora, contribuindo para a permanência do som no ambiente. A norma dinamarquesa exige uma área de absorção sonora superior ou igual a 1,3 vez a área de piso das salas de aula open-plan. Ao avaliarmos esse quesito com as salas em análise, temos que as salas 1 e 2 do modelo A apresentam 50,2% e 52%, respectivamente, de área de absorção acústica, já a sala 3 possui 30,2%, e a sala 4 31%, ambas do modelo B, e, por fim, as salas 5 com 24,1% e 6com 19,1% - do modelo C. Essa relação é muito inferior ao indicado pela norma, o que corrobora os elevados valores de T30 e EDT.

As salas do modelo A caracterizam-se pela presença de baias, o resultado dos dados e o fato de que ambas as salas possuem uma grande diferença de volume (44,5 m3) não torna viável estabelecer uma relação entre essa característica e os dados mensurados.

Em cada sala, obteve-se, por meio do T30, os valores máximos de STI (Equação 5) possíveis de acordo com as características físicas do ambiente e da relação sinal-ruído, considerando os pontos de medição e o ambiente em geral. A BB93 e as normas da Dinamarca e Islândia indicam valores de STI acima de 0,6 para áreas de trabalho em grupo e que requerem comunicação. Percebe-se que em nenhuma sala esse valor é atingido, o qual pode estar subestimado de acordo com o método de cálculo. De acordo com a NBR IEC 60268-16 (ABNT, 2018ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR IEC 60268-16: equipamentos de sistemas de som. parte 16: avaliação objetiva da inteligibilidade da fala pelo índice de transmissão da fala. Rio de Janeiro, 2018.), a inteligibilidade da fala seria considerada razoável no ambiente. Os piores resultados estão nas salas com o maior volume, o que impacta no tempo de reverberação. Segundo a norma inglesa, valores abaixo de 0,3 são indicados para ambientes que exigem concentração, visto que o entendimento de conversas paralelas prejudica a concentração e desempenho do trabalhador. Outrossim, baixo valor de STI representa maior nível de privacidade no ambiente. Tal parâmetro, entretanto, além de ser avaliado juntamente com o tempo de reverberação, deve ser analisado espacialmente, para não interferir nas pessoas que realizam atividades que exigem concentração, ou ainda facilitar a compreensão em momentos de interação. Na análise por ponto a diferença máxima foi de 0,01, ou seja, as salas apresentam valores uniformes de inteligibilidade, visto que Bradley, Reich e Norcross (1999)BRADLEY, J. S.; REICH, R.; NORCROSS, S. A just noticeable difference in C50 for speech. Applied Acoustics , v. 58, p. 99-108, 1999. apontaram uma diferença mínima de 0,1 no valor do STI como perceptível nas condições da fala do ambiente.

Os valores de definição (D50) calculados em todas as salas são menores que 0,65, sendo menores nas salas 5 e 6 do modelo C, além disso foi observado que no cálculo das médias esses valores decrescem à medida que a frequência aumenta. Esses dados implicam que o som direto e das primeiras reflexões no ambiente é prejudicado pelas reflexões tardias, desfavorecendo a inteligibilidade, como sugere Brandão (2018)BRANDÃO, E. Acústica de salas: projeto e modelagem. São Paulo: Blucher , 2018., o que corrobora os baixos valores de STI mensurados para cada sala de estudos coletivas.

De modo geral, os parâmetros acústicos avaliados indicam que os ambientes estudados são impróprios para a realização de estudos com concentração, quer sejam atividades individuais, quer sejam em grupo.

Tabela 2
Resumo dos parâmetros acústicos objetivos obtidos nas salas de estudo coletivas

Curvas de ruído

Em todas as configurações com os miniventiladores a análise das curvas de ruído NC demonstra que o ruído de fundo do ambiente (condição som residual - SR) atende ao estipulado pela NBR 10152 (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.), ou seja, adequado até a curva NC40, sendo aceitável a NC45 (ver Figura 11), o que divergiu com o acionamento dos aparelhos de ar-condicionado (condição AR) - nas salas do modelo A e C - quando esse valor foi ultrapassado. Acima da curva NC50, o ambiente já é classificado como muito ruidoso, o que pode interferir nas atividades desenvolvidas no local.

Por outro lado, a análise das curvas RC Mark II com o uso dos miniventiladores indica em todas as salas um incômodo parcial ou total causado pelas altas frequências, tornando o ruído desagradável. Isso também foi constatado na pesquisa de Ayr, Cirillo e Martellotta (2001)AYR, U.; CIRILLO, E.; MARTELLOTTA, F. An experimental study on noise indices in air-conditioned offices. Applied Acoustics, v. 62, p. 633-643, 2001., sendoencontrado em escritórios panorâmicos italianos com ar-condicionado o ruído com característica de chiado em 83% dos ambientes. Além disso, Yadav et al. (2021)YADAV, M. et al. Sound in occupied open-plan offices: objective metrics with a review of historical perspectives. Applied Acoustics , v. 177, 2021. reportaram 40 escritórios open-plan na Austrália com desbalanceamento em alta frequência e apenas 3 neutros, porém o valor da curva foi mensurado com a presença dos funcionários durante o expediente.

As classificações mais críticas registradas pela curva RC Mark II foram as situações com ar-condicionado e com 6 miniventiladores de plásticos em velocidades diferentes (3V13V2), já as mais brandas foram a som residual e com 1 miniventilador metálico (1VM). Em nenhuma situação analisada, a curva RC Mark II indicou a presença de vibração proveniente de baixa frequência.

As salas 2 (S2), 5 (S5) e 6 (S6) na situação som residual foram as únicas que apresentaram condições normais, todas as outras salas apresentaram desbalanceamento em alta frequência, o que pode impactar negativamente a percepção do usuário. A presença de um espectro desbalanceado em alta frequência no uso de um sistema de mascaramento sonoro, por meio do ruído de ventilação, foi relacionada a uma menor satisfação acústica dos usuários em função de outros espectros sonoros desbalanceados em um estudo controlado feito por Veitch et al. (2002)VEITCH, J. et al. Masking speech in open-plan offices with simulated ventilation noise: noise level and spectral composition effects on acoustic satisfaction. Ottawa: Institute for Research in Construction , 2002..

Conclusão

Com base nos resultados percebemos que, dentre as opções estudadas, o miniventilador metálico é a melhor solução para salas de estudos coletivas, de acordo com o conforto acústico no ambiente. Seus resultados apresentaram-se dentro do estipulado pela NBR 10152 (ABNT, 2020ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.), que contempla o nível de pressão sonora e curva NC, apesar da curva RC Mark II indicar desbalanceamento em alta frequência com o uso desse aparelho. Nesse caso, seu ruído não seria um empecilho para seu uso, pois estaria em conformidade com a norma brasileira. Sugere-se averiguar questões subjetivas relativas à percepção do conforto acústico com usuários de salas de estudo coletivas.

Em relação aos parâmetros acústicos mensurados, temos valores inadequados para o uso da sala, associadosà baixa absorção sonora de cada sala de estudos coletivos, a qual está diretamente relacionada ao alto valor de T30 e EDT, além dos baixos valores de D50. Os valores de STI considerados razoáveis são inferiores aos indicados pelas normas e indicam que as salas proporcionam baixa inteligibilidade da fala, dificultando a comunicação entre seus usuários. Isso também pode ser interpretado ao analisarmos o espectro sonoro com a presença dos miniventiladores em cada sala, o qual se destaca pelos altos valores nas bandas de frequências de 500 a 2.000 Hz.

A comparação dos resultados em relação aos modelos de sala evidencia que as salas do modelo C (as quais possuem maior volume) apresentam os piores índices de qualidade acústica. Por causa dessa mesma caraterística, as salas C apresentam menor NPS e melhor classificação das curvas de ruído com o acionamento dos miniventiladores em relação às outras salas. Não foi possível observar diferenças explícitas entre as salas com (modelo A) e sem baias (modelo B e C).

Figura 11
Valores das curvas de ruído identificados por sala (S) e configuração (centro do círculo)

Recomenda-se a execução de um projeto acústico nas salas avaliadas para auxiliar na obtenção de índices apropriados. Isso indica que o problema das salas open-plan é intrínseco aos sistemas de resfriamento, reforçando a necessidade de parâmetros e estudos voltados para os padrões brasileiros.

Agradecimentos

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES), código de financiamento 001.

Referências

  • ALTMAN, I.; WOHLWILL, J. Children and the environment: advances in theory and research. Nova York: Plenum Press, 1978.
  • AMERICAN SOCIETY OF HEATING, REFRIGERATING AND AIR-CONDITIONING ENGINEERS. Applications handbook: sound and vibration control. Atlanta, 2007. Cap. 48.
  • ANDRADE, J. M. F. M. Caracterização do conforto acústico em escolas. Porto, 2012. Dissertação (Mestrado em Engenharia Civil) - Universidade do Porto, Porto, 2012.
  • ANDRÉ, M.; DE VECHHI, R.; LAMBERTS, R. Feasibility of using personal fans for increasing thermal comfort in mixed-mode shared workspaces in Brazil: a field study. In: WINDSOR 2020 RESILIENT COMFORT, London, 2020. Proceedings [...] London, 2020.
  • ANSAY, S.; ZANNIN, P. H. Using the parameters of definition, D50, and reverberation time, TR, to investigate the acoustic quality of classrooms. Canadian Acoustics, v. 44, n. 4, 2016.
  • AMERICAN NATIONAL STANDARDS INSTITUTE. ANSI S12.2-1995: american national standard criteria for evaluatin room noise. Nova York, 1995.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 10152: acústica: níveis de pressão sonora em ambientes internos a edificações. Rio de Janeiro, 2020.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 12179: tratamento acústico em recintos fechados. Rio de Janeiro, 1992.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR IEC 60268-16: equipamentos de sistemas de som. parte 16: avaliação objetiva da inteligibilidade da fala pelo índice de transmissão da fala. Rio de Janeiro, 2018.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-1: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 1: salas de espetáculos. Rio de Janeiro, 2017a.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-2: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 2: tempo de reverberação em salas comuns. Rio de Janeiro, 2017b.
  • ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR ISO 3382-3: acústica: medição de parâmetros de acústica de salas: parte 3: escritórios de planta livre. Rio de Janeiro, 2017c.
  • AYR, U.; CIRILLO, E.; MARTELLOTTA, F. An experimental study on noise indices in air-conditioned offices. Applied Acoustics, v. 62, p. 633-643, 2001.
  • BISTAFA, S. Acústica aplicada ao controle de ruído. 3. ed. São Paulo: Blucher, 2018.
  • BRAAT-EGGEN, E. et al Auditory distraction in open-plan study environments: effects of background speech and reverberation time on a collaboration task. Applied Acoustics , v. 154, p. 148-160, 2019.
  • BRAAT-EGGEN, E. et al Noise disturbance in open-plan study environments: a field study on noise sources, student tasks and room acoustic parameters. Ergonomics, v. 60, n. 9, p. 1297-1314, 2017.
  • BRADLEY, J. S.; REICH, R.; NORCROSS, S. A just noticeable difference in C50 for speech. Applied Acoustics , v. 58, p. 99-108, 1999.
  • BRANDÃO, E. Acústica de salas: projeto e modelagem. São Paulo: Blucher , 2018.
  • CAMARGO, D. et al Development and application of questionnaires to assess acoustic environment in open plan offices. In: EURONOISE, Grécia, 2018. Proceedings [...] Grécia, 2018.
  • CUSTÓDIO, M.; GERGES, S. Qualidade sonora através de ensaios experimentais em centro de convenção multiuso. In: ENCONTRO NACIONAL DE TECNOLOGIA NO AMBIENTE CONSTRUÍDO, 11., Florianópolis, 2006. Anais [...] Florianópolis, 2006.
  • DANIELSSON, C. B.; BODIN, L. Difference in satisfaction with office environment among employees in different office types. Journal of Architecture and Planning Research, v. 26, n. 3, 2009.
  • DEPARTMENT FOR EDUCATION. United Kingdom. Building Bulletin 93: acoustic design of schools: performance standards. London, 2015.
  • GALBRUN, L.; KITAPCI, K. Accuracy of speech transmission index predictions based on the reverberation time and signal-to-noise ratio. Applied Acoustics , v. 81, p. 1-14, 2014.
  • GREENLAND, E. E.; SHIELD, B. M. A survey of acoustic conditions in semi-open plan classrooms in the United Kingdom. Journal of theAcoustical Society of America, v. 130, n. 3, p. 1399-1410, 2011.
  • HAAPAKANGAS, A. et al Benefits of quiet workspace in open-plan offices: evidence from two office relocations. Journal of Environmental Psychology, v. 56, p. 63-75, 2018.
  • HE, M. et al The influence of personally controlled desk fan on comfort and energy consumption in hot humid environments. Building and Environment, v. 123, p. 378-389, 2017.
  • HONGISTO, V. A model predicting the effect of speech of varying intelligibility on work performance. Indoor Air, v. 15, p. 458-468, 2005.
  • HONGISTO, V.; KERӒNEN, J.; LARM, P. Simple model for the acoustical design of open-plan offices. Acta Acustica United with Acustica, v. 90, p. 481-495, 2004.
  • JENSEN, K.; ARENS, E.; ZAGREUS, L. Acoustical quality in office workstations, as assessed by occupant surveys. Indoor Air, p. 2401-2405, 2005.
  • KERӒNEN, J.; HAKALA, J.; HONGISTO, V. Effect of sound absorption and screen height on spatial decay of speech: experimental study in an open-plan office. Applied Acoustics , v. 166, 2020.
  • KERӒNEN, J.; VIRJONEN, P.; HONGISTO, V. Characterization of acoustics in open offices - four case studies. In: ACOUSTICS, 8., Paris, 2008. Proceedings [...] Paris, 2008.
  • KIM, J.; DEAR, R. Workspace satisfaction: The privacy-communication trade-off in open-plan offices. Journal of Environmental Psychology , v. 36, p. 18-26, 2013.
  • LARRIEU, F.; HARVIE-CALRK, J. Contrasting open plan office design implications from emerging French, German and Finnish standards. In: INTERNATIONAL CONGRESS ON SOUND AND VIBRATION, 24., Londres, 2017. Proceedings [...] Londres, Inglaterra, 2017.
  • LIU, H.; HE, H.; QIN, J. Does background sounds distort concentration and verbal reasoning performance in open-plan office? Applied Acoustics , v. 172, 2021.
  • LONG, M. Architecture Acoustic. California: Elsevier Academic Press, 2006.
  • MACCHIE, S. D.; SECCHI, S.; CELLAI, G. Acoustic issues in open plan offices: a typological analysis. Buildings, v. 8, n. 161, 2018.
  • MÜLLER, S. Medir o STI. In: SEMINÁRIO DE MÚSICA CIÊNCIA TECNOLOGIA, 2., São Paulo, 2005. Anais [...] São Paulo, 2005.
  • NAVAI, M.; VEITCH, J. A. Acoustic satisfaction in open-plan offices: review and recommendations. Ottawa: Institute for Research in Construction, 2003.
  • OZCEVIK, A.; YÜKSEL, Z. Acoustical requirements in architectural design studios. In: FORUM ACUSTICUM, Budapest, 2005. Proceedings [...] Budapest, 2005.
  • PÄÄKKÖNEN, R. et al Acoustics and new learning environment: a case study. Applied Acoustics , v. 100, p. 74-78, 2015.
  • PASSERO, C.; ZANNIN, P. H. O conforto acústico em escritórios panorâmicos: estudo de caso em um escritório real. Ambiente Construído, Porto Alegre, v. 9, n. 1, p. 93-105, jan./mar. 2009.
  • PETERSEN, C. M.; RASMUSSEN, B. Acoustic design of open-plan offices and comparison of requirements in the Nordic countries. In: BALTIC-NORDIC ACOUSTICS MEETING, Reykjavik, 2018. Proceedings [...] Reykjavik, 2018.
  • PETERSEN, C. M.; RASMUSSEN, B. Acoustic design of open-plan schools and comparison of requirements. In: BALTIC-NORDIC ACOUSTICS MEETING, Odense, 2012. Proceedings [...] Odense, 2012.
  • PIERRETTE, M. et al Noise effect on comfort in open-space offices: development of an assessment questionnaire. Ergonomics , v. 58, n. 1, p. 96-106, 2014.
  • RAJ, U. et al Personal cooling strategies to improve thermal comfort in warm indoor environments: comparison of a conventional desk fan and air ventilation clothing. Energy & Buildings , v. 174, p. 439-451, 2018.
  • ROCHA, L. Estudo e análise da acústica de ambientes submetidos a sistemas de áudio. Porto Alegre, 2004. Dissertação (Mestrado em Engenharia Mecânica) - Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2004.
  • ROSSING, T. D. (ed). Springer handbook of acoustics. New York: Springer Science & Business Media, 2007.
  • SCANNELL, L. et al The role of acoustics in the perceived suitability of, and well-being in informal learning spaces. Environment and Behavior, v. 48, n. 6, p. 769-795, 2016.
  • SHIELD, B.; GREENLAND, E.; DOCKRELL, J. Noise in open plan classrooms in primary schools: a review. Noise Health, v. 12, 2010.
  • TANG, S. K.; WONG, C. T. Performance of noise indices in office environment dominated by noise from human speech. Applied Acoustics , v. 55, n. 4, p. 293-305, 1998.
  • TROCKA-LESZCZYNSKA, E.; JABLONSKA, J. Contemporary architectural design of offices in respect of acoustics. Applied Acoustics , v. 171, p. 107541, 2021.
  • VEITCH, J. et al Masking speech in open-plan offices with simulated ventilation noise: noise level and spectral composition effects on acoustic satisfaction. Ottawa: Institute for Research in Construction , 2002.
  • WENMAEKERS, R.; VAN HOUT, N. How ISO 3382-3 acoustic parameter values are affected by furniture, barriers and sound absorption in a typical open plan office. In: INTERNATIONAL CONGRESS ON ACOUSTICS, 23., Aachen, 2019. Proceedings [...] Aachen, 2019.
  • YADAV, M. et al Sound in occupied open-plan offices: objective metrics with a review of historical perspectives. Applied Acoustics , v. 177, 2021.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    14 Nov 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2023

Histórico

  • Recebido
    23 Jun 2022
  • Aceito
    30 Jun 2022
Associação Nacional de Tecnologia do Ambiente Construído - ANTAC Av. Osvaldo Aranha, 93, 3º andar, 90035-190 Porto Alegre/RS Brasil, Tel.: (55 51) 3308-4084, Fax: (55 51) 3308-4054 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: ambienteconstruido@ufrgs.br