Uma palavra vivida

Autores

DOI:

https://doi.org/10.22456/2179-8001.80099

Palavras-chave:

Novo Realismo. "Affiches lacérées". Pablo Picasso. Marcel Ducham. Readymade, Alfred Jarry. Pierre Restany.

Resumo

Em um tom caloroso, com uma rara clarividência e sensibilidade, grande testemunha de uma época, Jacques Villeglé dá um depoimento excepcional sobre o estado da arte da crítica na França, desde meados do século XX. Recorda seus anos de formação em plena Ocupação da França pelos alemães, quando era difícil se documentar. Ser artista, ele pensava, não era uma atividade para ele, já que os críticos reacionários qualificavam então de judeus ou de degenerados os artistas mais importantes da época. Ele gostaria de ter convivido com Picasso, mesmo que o considerasse, de certo modo, seu rival. Duchamp não contara para seu trabalho; aliás, ele confessa não ter se esforçado para encontrá-lo apesar das várias oportunidades que se apresentaram. Discorre sobre sua relação com o crítico de arte e autor do manifesto do Novo Realismo, Pierre Restany, e descreve em detalhes vários traços de sua personalidade complexa. Paralelamente, revela de maneira implícita sua própria prática da descolagem dos cartazes rasgados, atividade que consistia numa ação direta na vida, de um alcance sociológico e político certo e que rompia definitivamente com a arte do cavalete.

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Biografia do Autor

Androula Michael, Universidade de Picardie Jules Verne, França.

Androula (Andri) Michael nasceu em Chipre, em 1962. Após se graduar em Filosofia na Universidade Kapodistria, de Atenas (1984), instalou-se na França, onde vive e trabalha até hoje. Graduou-se em Museologia na Escola do Louvre (1992); na Universidade Paris I-Panthéon Sorbonne, fez mestrado e doutorado, defendendo uma tese sobre os textos de Picasso. Historiadora da arte e curadora de exposições, ela é professora-assistente na Universidade de Picardie Jules Verne (desde 2000), vice-diretora do Centro de Pesquisas em Arte e Estética (CRAE) dessa universidade, assim como coordenadora das relações internacionais da Faculdade de Artes. É autora de inúmeros catálogos de exposições, artigos científicos e obras, dentre as quais Picasso – Propos sur l’art, em colaboração com Marie-Laure Bernadac (Gallimard, coleção “Art et Artistes”, Paris, 1998), Picasso poète (Les beaux-arts Editions, Paris, 2008), Les happenings de Jean-Jacques Lebel (Hazan Editions, Paris, 2009), Picasso, l’objet du mythe, em colaboração com Laurence Bertrand-Dorléac (Les beaux-arts Editions, Paris, 2005). É editora de uma antologia de Picasso publicada pela editora du Cherche-midi (2005), traduzida para o alemão, russo, romeno, espanhol, chinês e coreano. Editou, com Laurent Wolf, o número especial Picasso dos Cahiers de l’Herne (2014). Trabalha atualmente sobre a recepção crítica cruzada da obra de Pablo Picasso e de Marcel Duchamp, bem como sobre questões coloniais/pós-coloniais na arte contemporânea.

Jacques Villeglé

Jacques Villeglé nasceu em Quimper em 1926. Em 1947, deu início, em Saint-Malo, a uma coleção de objetos encontrados: fios de aço, pedaços do muro do Atlântico, etc. Em 1949, passa a guardar apenas cartazes rasgados. Em junho de 1953, publicação de Hepérile éclaté, poema fonético de Camille Bryen tornado ilegível por meio das tramas de vidro canelado de seu parceiro intelectual Raymond Hains. Em fevereiro de 1954, o poeta letrista François Dufrêne os apresenta a Yves Klein e depois a Jean Tinguely e Pierre Restany, com os quais constituirá, em abril de 1960, em Milão, o grupo dos Novos Realistas, após sua participação conjunta na primeira Bienal dos Jovens de Paris, em outubro de 1959. Anteriormente, em 1958, Villeglé redigira um esclarecimento sobre os cartazes rasgados, intitulado Des réalités collectives, prefiguração do manifesto dos Novos Realistas, de abril de 1960. Em 1959, criara a entidade Lacerado anônimo. Coletando vestígios de civilização, principalmente anônimos, ele reuniu a partir de 1969 um alfabeto sociopolítico em homenagem ao Professor Serge Tchakhotine, autor, em 1939, da obra A Mistificação das Massas pela Propaganda Política. Uma primeira exposição retrospectiva consagrada aos grafismos sociopolíticos foi organizada pelo museu Sainte-Croix, de Poitiers, em 2003. Em 2006, Jacques Villeglé começa a trabalhar com escultura, em oposição às técnicas tradicionais (bronze, vidro) e às técnicas industriais (aço Corten, inox polido espelho, ferro fundido). Desde 1957, cerca de 250 exposições em quatro continentes foram dedicadas à sua obra; participou de manifestações coletivas nos cinco continentes. Suas obras foram compradas pelos mais importantes museus europeus, americanos e do Oriente Médio. Vários trabalhos acadêmicos se debruçaram sobre ele: Bernard Lamarche-Vadel (Marval, 1990), Odile Felgine (Ides et Calendes, 2001), Gérard Durozoi (Hazan, 2008). Previstos para 2017: Alain Borer (Modernism, San Francisco) e Barnaby Conrad (Inkshares). Em 2007, a editora Linda & Guy Pieters publicou uma importante biografia por Odile Felgine, prefaciada por Arnaud Labelle-Rojoux. Em 2013, a editora Filigranes publicou um livro com 25 anos de retratos por François Poivret. Em 2005, o conjunto de seus textos foi editado por Transéditions, Paris. Em 2007, por ocasião da apresentação de sua coleção no museu de Hanover, Ahlers Pro Arte apresenta sua tradução para o alemão. Em 2012, Martin Muller Books de São Francisco publica uma ampla seleção de capítulos em inglês. Em 2013, Jean-Pierre Huguet publica o Petit vocabulaire (entrevista com Odile Felgine). Desde 1988, 8 dos 19 volumes do catálogo temático e exaustivo de seus cartazes rasgados foram editados. Jacques Villeglé é representado, na França pela galeria Georges-Philippe & Nathalie Vallois, que começou em 1999 um ciclo de exposições que retoma sistematicamente os catálogos raisonnés de Jacques Villeglé, nove exposições já aconteceram.

Referências

Entrevista feita em Paris, no dia 10 de outubro de 2014, na casa de Jacques Villeglé. Respeitamos o registro oral da entrevista, transcrita e revisada pelo artista para não perder a naturalidade de sua fala vívida.

Arquivos adicionais

Publicado

2017-12-30

Como Citar

Michael, A., & Villeglé, J. (2017). Uma palavra vivida. PORTO ARTE: Revista De Artes Visuais (Qualis A2), 22(37). https://doi.org/10.22456/2179-8001.80099