A PESQUISA EM HISTÓRIA MEDIEVAL:
RELATOS HAGIOGRÁFICOS E PROCESSOS DE CANONIZAÇÃO

Igor S. Teixeira 1

 

Resumo: O objetivo deste texto é apresentar, a partir do tema da mesa-redonda “Pesquisa em História Medieval”, algumas considerações historiográficas e metodológicas sobre a utilização de processos inquisitoriais e relatos hagiográficos em estudos sobre a santidade no final da Idade Média. Este texto parte da premissa que esses dois tipos de documentação devem ser lidos e analisados em conjunto quando se pretende estudar aquele fenômeno da sociedade medieval. Para tal, utilizamos o processo de canonização de Tomás de Aquino, que ocorreu entre 1319 e 1323, durante o papado de João XXII, a Ystoria sancti Thome de Aquino, escrita por Guilherme de Tocco, a Practica ou Manual do Inquisidor, escrito por Bernardo Gui e anotações inquisitoriais no Sul da França daquele período. Concluímos que uma análise separada dos processos – testemunhas, assuntos privilegiados, milagres atribuídos ao santo – podem levar a uma interpretação diferente do que quando se lê, além do processo, tanto a narrativa produzida simultaneamente, quanto outros tipos de processos, como os que investigavam as suspeitas de heresias.

Palavras-chave:Canonização. Hagiografia. Inquisição. Direito Medieval. Tomás de Aquino.

Preâmbulo:

Quero iniciar este texto evidenciando a minha satisfação por poder fazê-lo nestas condições: participar ativamente tanto do GT de Estudos Medievais da ANPUH/RS quanto como organizador do I Encontro Estadual de Estudos Medievais do Rio Grande do Sul é um momento importante para a minha formação. Além disso, poder expor algumas considerações sobre a “pesquisa em história medieval” a partir da investigação de doutoramento que está em curso é motivo de muita honra.
Situamos a apresentação no âmbito das pesquisas sobre Hagiografias, Santidade e Canonização no medievo. Uma área temática que, no Brasil, ganha espaço a cada dia, influenciada pela expansão do quadro de orientadores de iniciação científica, mestrado e doutorado, qualificados e especializados, bem como pelos avanços no que tange ao acesso às fontes devido à realização dos estágios de pesquisadores brasileiros em países europeus, onde, majoritariamente estão as fontes e, também, por causa da internet. Neste sentido, destaco a consolidação de Programas de Estudos Medievais, como os da UFRJ e UnB e o Laboratório de Estudos Medievais (UNICAMP, USP, UFMG), dentre outros. No que tange à produção bibliográfica, obras recentes contam com a reunião de pesquisas de mestrado e doutorado, bem como resultam de teses defendidas. Destaco a tese de doutorado da historiadora Néri de Almeida Souza, com o título “A cristianização do mortos: A mensagem evangelizadora de Jacopo de Varazze” (SOUZA, 1998). Tese orientada por Hilário Franco Júnior, o qual coordenou a tradução para o português, no Brasil, da Legenda áurea (2003). Além disso, a coletânea Hagiografia e História e a recentemente lançada Reflexões sobre a Hagiografia Ibérica Medieval, ambas da professora Andréia Cristina Lopes Frazão da Silva. (SILVA, 2008a e 2008b).
Esse texto é parte do capítulo “Como se constrói um santo? Fontes para a Ystoria sancti Thome de Aquino, escrita por Guilherme de Tocco entre 1319-1323”,da tese: “Et quod tot fecerat miracula quod scripserat articulos”: santidade, hagiografia e história na canonização de São Tomás de Aquino (1274-1323). No capítulo em questão, elaboramos um aparato metodológico para potencializar a leitura dos processos de canonização a partir de uma aproximação com outra forma de inquérito, qual seja, os processos de inquisição sobre heresias. O objetivo é situar o processo de canonização na prática jurídica de seu tempo para melhor compreender a forma como Guilherme de Tocco teve acesso a grande parte das informações as quais aparecem em sua Ystoria.
É um texto que está inserido num processo de descoberta, por parte do pesquisador, dos sujeitos que viveram no medievo. Explico: da graduação ao mestrado desenvolvi pesquisas sobre obras, como a Suma Teológica e a Legenda áurea. Obviamente, encontrei nelas seus autores. Porém, os processos de canonização e heresia me colocaram em contato com outros sujeitos, suas crenças, suas expectativas, ideologias, imaginário. É, portanto, um texto perpassado pelo prazer em poder analisar os homens no tempo de forma diferente das análises que fizemos anteriormente.

Introdução:

A santidade, os milagres, o imaginário e o universo jurídico-intelectual construído e criado para justificar crenças são temas amplamente debatidos também no âmbito da antropologia histórica, e, mais especificamente, na chamada antropologia escolástica. Os pesquisadores reunidos no Groupe d’Anthropologie Scolastique (GAS-EHESS) têm trabalhado com a relação entre ciência, direito e filosofia para apreender as transformações nas concepções de homem elaboradas nas discussões escolásticas, principalmente entre os séculos XIII e XIV. (BOUREAU, 1995 e 2002; PIRON, 2009).
Passados cerca de vinte anos, o estudo mais significativo sobre os processos de canonização na Idade Média é a tese de André Vauchez. (VAUCHEZ, 1981). Uma análise de fôlego, na longa duração (1198-1431), ampla e ambiciosa. O objetivo do autor era fornecer um entendimento geral sobre a santidade medieval a partir da instituição dos processos de canonização e do progressivo controle desse fenômeno pelo papado. Vauchez concluiu que existia uma santidade oficial (a controlada pelo Papa e reconhecida após a investigação inquisitorial sobre a verdade dos milagres atribuídos a um indivíduo) e a popular (que, mesmo não reconhecida pelo papado, não deixou de existir). Esta tese é citada como ponto de partida para muitos estudos que utilizam os processos de canonização como fonte para a história.
É um olhar diferente para a santidade que, em geral, é analisada a partir dos relatos hagiográficos, os quais são muito anteriores aos processos. Vauchez praticamente não analisa esse tipo de documentação na tese. Porém, certamente seguindo a ideia da racionalização inerente à expansão do controle da santidade a partir dos processos, o mesmo autor concluiu anos depois que a função das hagiografias mudou no final da Idade Média. (VAUCHEZ, 1991).
O que procuramos defender é que abordar os processos em conjunto e não abordar a narrativa que, em geral, passava a ser escrita antes, durante e após os inquéritos, é uma análise limitada à “juridicidade”, ou seja, aquilo que Jacques Chiffoleau caracterizou como “a regra do direito...como manifestação eminente de uma coação organizada sob ameaça de sanção”. Segundo Chiffoleau, o historiador deve se atentar para a “justiciabilidade” do direito, ou seja, “a parte do julgamento, da disputa e do debate, do acordo e da casuística, da jurisprudência...”. (CHIFFOLEAU, 2006, p. 334). Além disso, as considerações de Alain Boureau sobre a “abstração judiciária” em torno de um direito cada vez mais positivo e atento aos “fatos”. Segundo o autor, é próprio do direito positivo “rejeitar a recepção imediata dos fatos e de impor sua qualificação formal no seio de sistemas de interpretação”. Boureau considerou esta abstração como um traço essencial da Idade Média Central, a saber, a “abstração judiciária”, que consistiria em “procurar modelos abstratos e formais de equivalência entre as realidades empíricas incomensuráveis”. (BOUREAU, 2002, p. 1463-1464). Segundo o autor, a invenção desse direito positivo foi uma conquista do “racionalismo construtivista medieval, em ligação com a autonomização da ética e a construção do direito canônico, um direito divino e positivo”. (BOUREAU, 2002, p. 1477). Essa autonomia, segundo o texto, residiria na “moral da intenção”, que caracteriza a ação moral sobre sua característica voluntária, independente da ação. Concepção esta que foi progressivamente questionada por um “positivismo jurídico”, que qualificava juridicamente – e não pela moral – as ações. (BOUREAU, 2002, p. 1478-1479).
Portanto, para analisar em conjunto as atas dos depoimentos recolhidos para a canonização de Tomás de Aquino e a Ystoria escrita por Guilherme de Tocco, é imprescindível considerar as formas de “recolhimento”, funcionamento e registro das informações pelos notários dos processos. Isso é importante, pois, como procurador da causa, testemunha, interrogado e autor da narrativa sobre o santo, foi nesse universo jurídico que aquele dominicano conseguiu grande parte das informações que necessitava para tal.
Neste sentido, então, procuramos abordar o processo de canonização de Tomás de Aquino e a Ystoria sancti Thome de Aquino, elaborados simultaneamente entre 1319-1323 com o objetivo de colocar em discussão limites e possibilidades no que tange às abordagens de processos de canonização e hagiografias. Ou seja, questionamos que conhecimento da santidade medieval permitem as análises amplas dos processos de canonização, como a de Vauchez? Analisar apenas os processos é eficaz para explicar o fenômeno?
Nossas investigações apontam para o seguinte caminho: o uso que Guilherme de Tocco fez do processo de canonização foi significativamente “moderno”. Entendendo aqui essa “modernidade” como o acento dado à vida e às virtudes do santo, mais do que aos milagres post-mortem (embora condição obrigatória para o reconhecimento da santidade oficial), como caracterizaram autores como Vauchez (1991) e Boureau (1995), para o momento entre 1270-1378. Entretanto, os usos que aquele mesmo hagiógrafo faz da tradição hagiográfica dominicana do século XIII, os topoi narrativos, revelam um santo mais “tradicional”. Ou seja, uma santidade construída a partir de elementos repetitivos, encontrados em relatos sobre vidas de santos que não fazem parte daquele período de suposta mudança.

A justiciabilidade do processo de canonização:

Para Michael Goodich, um processo de canonização bem-sucedido começava com uma campanha ou propaganda feita por grupos interessados na oficialização do culto a um determinado santo: cartas descrevendo milagres e uma primeira tentativa de composição de uma Vita et Miracula. (GOODICH, 1985, p. 170-171). Para Vauchez, após 1230 os poderes civis desempenharam um papel cada vez mais importante, principalmente na península Itálica, onde o processo de canonização seria um “affaire d’État”.(VAUCHEZ, 1981, p. 48-49). A segunda etapa do processo é a pesquisa preliminar, feita pelos postuladores. Após coletar relatos sobre a vida e a memória do santo, o hagiógrafo apresenta os resultados junto às cartas. O objetivo era informar a Santa Sé que o santo já era cultuado no âmbito local. Em geral, são relatos de milagres ocorridos no túmulo e não era objetivo provar a veracidade dos mesmos. Isto cabia aos inquéritos. (VAUCHEZ, 1981, p. 50).
O processus ou informatio in partibus começa com a bula que nomeia os encarregados e suas obrigações: coletar informações sobre a vida e os milagres e transmiti-las em forma de relatório sobre o desenrolar do processo. Em geral, o Papa nomeava três comissários, dentre eles, um bispo. Além desses, religiosos, notários e testemunhas acompanhavam os interrogatórios para garantir a regularidade dos procedimentos. No caso dos religiosos, os mendicantes estavam presentes e atuavam, por exemplo, como tradutores/intérpretes. Os notários tinham a função de redigir cópias dos depoimentos tal qual foram declarados publicamente e não deveriam interferir no processo. Eles ficavam a serviço dos comissários. (VAUCHEZ, 1981, p. 51-53).
Outra função importante era desempenhada pelo procurador, ao qual cabia a função de redigir os artigos interrogatórios, ou, o esquema sobre o qual deveriam seguir os depoimentos. (VAUCHEZ, 1981, p. 54). Segundo Vauchez, o objetivo esperado com o estabelecimento prévio dos articuli era evitar perda de tempo e informações inúteis. Ao mesmo tempo, formavam elementos de uma biografia sumária, que evidenciavam os aspectos originais da “personalidade” do santo, o que incluía, portanto, uma lista das suas virtudes. (VAUCHEZ, 1981, p. 58). Era uma espécie de catálogo que podia ser utilizado na confecção dos ofícios litúrgicos, inclusive como ponto de partida para as hagiografias.
Após o inquérito, os comissários disponibilizavam as atas ao Papa, que encarregava três cardeais para analisá-las. Segundo Vauchez, até o início do século XIII, tratava-se de um estudo de curta duração. No entanto, a partir da segunda metade desse século, passou a ser realizado em períodos mais longos. (VAUCHEZ, 1981, p. 65). A função desses leitores era informar os testemunhos mais verdadeiros. Em seguida, o Papa realizava duas reuniões secretas com cardeais, bispos e arcebispos. Dessas reuniões resultava a sentença, favorável ou não à canonização. A partir daí, sendo positiva, ocorriam os eventos públicos: uma terceira reunião e a cerimônia litúrgica, na qual era anunciada a novidade através de bulas solenes. As bulas narravam as circunstâncias dos inquéritos, as virtudes e os milagres do santo, e autorizavam/ordenavam a celebração da festa em sua homenagem, principalmente na diocese que possuía as relíquias. (VAUCHEZ, 1981, p. 66-67).
André Vauchez chama atenção para a racionalização imposta por esses procedimentos. A evidência é expressa pelas constantes ordens papais para novas investigações. Entre 1199 e 1276, 48 processos foram ordenados, 25 não tiveram resultados satisfatórios e 23 canonizações foram autorizadas. Porém, dessas, 18 processos foram alvo de reiterações e, após essa revisão, apenas 6 foram reconhecidos. Naquele período, portanto, apenas 11 canonizações foram efetuadas. (VAUCHEZ, 1981, p. 60). O autor explicou essa atitude em dois aspectos: primeiramente, as comissões que tinham a função de analisar as atas passaram a recusá-las por causa da forma de anotação dos depoimentos. Segundo o texto, os depoimentos não eram individualizados, nem transcritos literalmente. Eram relatórios impessoais redigidos pelos comissários. Além disso, Papas como Honório III consideravam que não era possível se ter uma “idéia precisa das circunstâncias nas quais foram produzidos os fatos milagrosos alegados”. (VAUCHEZ, 1981, p. 62).
Outra questão levantada por Vauchez é que os inquisidores negligenciavam a necessidade de se realizar uma crítica sobre as informações e coletavam em quantidade. A orientação do papado passou a ser, portanto, pela meticulosidade e uma investigação precisa em um número reduzido de testemunhos. Além disso, após 1250 houve uma diminuição do número de ordens para refazer os inquéritos. Primeiramente, porque os clérigos assimilaram a forma. Segundo, pelo aumento do interesse nas virtudes em detrimento do interesse pelos milagres. (VAUCHEZ, 1981, p. 64). Mas essa preocupação com a veracidade de declarações prestadas em tribunais não é exclusiva dos inquéritos para canonização. No século XIII, outras instâncias que colocavam em evidência a relação dos indivíduos com o que era permitido em termos de fé também eram alvo de investigações meticulosas que implicavam em absolvições e perdão dos pecados.
Alain Boureau considerou que um dos elementos imprescindíveis no início das investigações – tanto nos processos de canonização quanto nos de investigação sobre heresias – era a pesquisa inicial sobre a fama dos indivíduos (suspeitos de heresia ou santidade). Segundo o texto, era preocupação de juiz e comissários fazer com que os depoentes definissem o sentido da palavra (fama) a partir do lugar de origem e sua extensão. (BOUREAU, 2002, p. 1480) Entretanto, em outro texto, o autor considerou que o inquérito de canonização não é inquisitorial no sentido estreito do termo, por conta da condição distinta das testemunhas. (BOUREAU, 2004, p. 200).
Em relação aos métodos, Boureau apontou que o interrogatório visando a construção da verdade por elementos contraditórios – muito em voga no Sic et non, de Pedro Abelardo, e fortemente influenciado como “dúvida metódica” advinda da descoberta da Ética, de Aristóteles – também passou por um processo progressivo de transformações que levou à construção do interrogatório sumário. Este interrogatório poderia simplificar o procedimento jurídico, quando, por exemplo, as partes estavam em acordo e chegaria a ser dispensada a prova e a própria fase do debate e de contestação das teses em questão. Segundo Boureau, no papado de João XXII, o procedimento sumário foi muito utilizado nos mais diferentes assuntos da Igreja: desde os casos previstos no direito canônico do século XIII, como em questões do casamento e de usura. (BOUREAU, 2002, p. 1484).
Compreendendo que esses inquéritos podem ser entendidos naquilo que têm de comum, como a busca pela verdade, as mediações e os filtros de inquisidores, testemunhas, notários, e naquilo que, por exclusão e diferenças, podem ajudar a entender melhor as especificidades do objeto que nos interessa no momento. Para isso, a Inquisição no sul da França entre os séculos XIII e XIV e a canonização de um santo dominicano por um Papa de Avignon bastam como indícios. Afinal, muitos membros daquela Ordem foram inquisidores, como Guilherme de Tocco e Bernardo Gui.
O envolvimento dos Dominicanos na luta contra os hereges está na raiz da própria fundação da Ordem, como um de seus principais objetivos. Nascido na região de Calaruega, Espanha, Domingos de Gusmão (1170-1221) viveu em um período de lutas da Igreja contra os movimentos heréticos – cátaros, valdenses etc – e participou ativamente nas empreitadas, como a Cruzada Albigense. Esta Cruzada teve como objetivo destruir o catarismo no Langedoc (Sul da França). Empreitada começada antes de 1150.
O jovem Domingos, em 1204, segundo José Rivair Macedo, “foi o primeiro a propor que na luta contra os hereges a conversão se fizesse não apenas pelas palavras mas também pelo exemplo, adotando daí em diante o voto de pobreza”. (MACEDO, 2000, p. 33). Segundo Jordão da Saxônia, que escreveu uma das primeiras obras sobre a Origem da Ordem dos Pregadores (concluída antes de 1234), durante o tempo em que esteve combatendo os hereges naquela ocasião, Domingos sofreu muitas injúrias dos “malvados” e “inimigos da verdade”, sendo, ameaçado de morte. (JORDAN DE SAJONIA, 1947, p. 177). A sua atuação rendeu-lhe prestígio junto ao Papa Inocêncio III que, em 1216, autorizou a organização e fundação da Ordem dos Pregadores, na região de Toulouse, sob a Regra de Santo Agostinho.
Voltada para a pregação e salvação das almas (DOMINGOS DE GUZMAN, 1947, p. 864), a Ordem forneceu à Igreja muitos inquisidores, dos quais importantes manuais chegaram até nós. Para o período compreendido entre 1230-1349, Douais contou 74 inquisidores. Desses, 45 eram dominicanos. (DOUAIS, 1900, p. CXXX-CXXXIV) Macedo informa que o mais antigo guia foi preparado entre 1248-1249, por Bernardo de Caux, que foi inquisidor em Agen, Cahors e Toulouse e que um dos manuais mais importantes foi redigido por Bernardo Gui, entre 1321-1324, a saber, o Manual do Inquisidor, ou Pratica Inquisitionis heretice pravitatis. (MACEDO, 2000, p. 83). Segundo Jeand Duvernoy, Bernard de Caux inaugurou um “estilo” de processus utilizado até o início do século XIV, que consistia em precisar o momento e as condições nas quais as testemunhas poderiam estar envolvidas em atividades suspeitas, como ajudar, comer, enviar, receber ou presenciar uma “hérétication”. (DUVERNOY, 1988, p. 05).
Quanto à Pratica de Bernardo Gui, Annette Pales-Gobilliard, considerou que sua originalidade consiste em fornecer uma exposição sistemática dos procedimentos inquisitoriais e uma análise das crenças e dos ritos das diversas seitas. (PALES-GOBILIARD, 1984, p. 254). De Bernardo de Caux a Bernardo Gui, as formas consideradas mais apropriadas para interrogar suspeitos de heresias foram aperfeiçoadas. Coincidentemente (ou não), também foi o mesmo período no qual os Processos de Canonização aperfeiçoaram a crítica dos milagres e reduziram o número de santos reconhecidos pelo Papado.

Registros da Inquisição, Registros de Canonização: as formas de anotar

O historiador que se propõe a analisar inquéritos, como afirmado na introdução desta tese, se vê diante de filtros. A pergunta feita pelo inquisidor e a resposta (muitas vezes traduzida) do interrogado são anotadas pelos notários. Ao trabalharmos com um Processus Inquisitionis, deparamo-nos com uma documentação jurídica, no caso, canônica. É importante ressaltar que tanto as investigações sobre heresias quanto sobre santidade são inquéritos. O objeto dessas investigações é distinto, como fica evidente na própria “sentença” final: a inscrição no catálogo dos santos e o culto autorizado e reconhecido em toda a Igreja e, inclusive, a possibilidade de ser “queimado” caso as suspeitas de heresia se confirmassem.
Além disso, outra diferença é latente: não havia tortura nos processos para a verificação dos milagres, ao contrário, no caso das heresias, tratava-se de um procedimento autorizado. Isto implica desde já em considerar a função do inquisidor e da testemunha. Em ambos os casos, procura-se pela verdade, verdade esta que é mediada pelas perguntas do inquisidor, pela resposta do interrogado e pela anotação do notário. A diferença é que o depoente a favor da canonização quer falar e dar o testemunho tanto de sua crença quanto da excepcionalidade do indivíduo sobre o qual fala. O interrogado por suspeita de heresia, diante da possibilidade de uma sentença final e do uso da tortura, é possível que fale o que se queria ouvir ou mesmo se cale. Para esta proposta, interessa-nos as semelhanças no funcionamento desses dois tipos de investigação: as formas de anotação, os dados possíveis de serem coletados. Mas, obviamente, não podemos negligenciar os instrumentos que possibilitariam a eficácia desse funcionamento.
Neste sentido, abordamos as indicações metodológicas que Emmanuel Le Roy Ladurie e Carlo Ginzburg apontaram sobre a justiciabilidade dos inquéritos. Ginzburg caracteriza um processo inquisitorial como “registos escritos de produções orais” (GINZBURG, 1989, p. 202) e que, por exemplo, nos processos contra a bruxaria a documentação revelava “esquemas de origem culta da bruxaria inquisitorial” ao mesmo tempo em que se podia perceber em alguns casos uma discrepância entre as perguntas dos inquisidores e as respostas dos interrogados. Foi nesta discrepância que o autor percebeu que poderia abordar as ideias de Domenico Scandella, pois “a irredutibilidade de uma parte dos discursos de Menocchio a esquemas conhecidos aponta para um estrato ainda não examinado de crenças populares, de obscuras mitologias camponesas”. (GINZBURG, 1987, p. 25).
É importante considerar também que, no caso das respostas que não revelam essa estranheza, Ginzburg as classifica como respostas elaboradas a partir de “estereótipos inquisitoriais então divulgados na Europa pela boca de pregadores, teólogos, juristas, etc”, já que o que os inquisidores faziam “era traduzir, quer dizer, interpretar, crenças que lhes eram estranhas para um código diferente e mais claro”. (GINZBURG, 1989, p. 206-212). Esta consideração é relevante para o nosso trabalho na medida em que, como veremos, as respostas dos interrogados tendem a se repetir, tanto no que tange às informações sobre as virtudes do santo quanto sobre os milagres. E, também por esse motivo, é importante ressaltar que no “Prefácio” de O queijo e os vermes Ginzburg faz a afirmação que “uma análise de classe é sempre melhor que uma análise interclassista” para criticar a história das mentalidades. (GINZBURG, 1987, p. 32).
A obra Montaillou, de Emmanuel Le Roy Ladurie, também foi construída a partir de “documentos da repressão”. Especificamente, o autor analisou os dossiês do tribunal de Pamiers (1316-1325), organizados e dirigidos por Jacques Fournier, futuro Papa Bento XII. Segundo o autor, graças ao preciosismo e meticulosidade do inquisidor, chegou à contemporaneidade uma documentação que permite a análise não apenas sobre a heresia, como também sobre questões da vida material, da sociedade, da família e da cultura camponesa na aldeia de Montaillou, no Sul da França. (LADURIE, s.d.).
Por ora, interessa a observação feita por Ladurie no que tange à forma final da documentação: os volumes foram transcritos em três estágios: inicialmente, os interrogatórios/depoimentos eram redigidos em forma de protocolo (breves anotações) pelos notários que, em seguida, redigiam as minutas. Estas, podiam ser modificadas, em algumas partes, pelos interrogados. Após, a versão final, ou, como o autor definiu, os “textos minutados”. (LADURIE, s.d., p. 22-23). Além disso, Ladurie observa a questão das constantes traduções: os acusados exprimiam-se em occitânico (ou, alguns, em gaulês). Suas falas eram traduzidas para o latim. Do latim à língua vulgar quando se estava no segundo estágio da redação das minutas. Ladurie considera que a tradução para a língua vulgar do que foi registrado nas minutas, em latim, era oral. (LADURIE, s.d., p. 23).
É mais ou menos dessa forma que temos acesso aos depoimentos no processo de canonização de Tomás de Aquino: um relatório, no qual o notário escreve “Interrogado sobre a vida, disse que”. Fórmula que se repete em todas as declarações. É importante, por fim, ressaltar que, assim como Ginzburg, Ladurie não estava pensando no que havia de comum entre os camponeses de Montaillou e o inquisidor Jacques Fournier. Ao contrário, o autor buscou os possíveis testemunhos que o camponês poderia dar de si próprio e, seguindo esse princípio, escreveu sua “investigação de história agrária francesa” a partir de uma “monografia aldeã”. Esses autores reforçam que a diferença entre o mundo do interrogado e o mundo daquele que interroga dão ao historiador o acesso aos dois mundos a partir das minutas de um processo inquisitorial.
Essas observações são importantes porque, ao contrário do que afirmou Alain Boureau, acreditamos que as investigações sobre heresia e sobre a santidade podem ser aproximadas. Neste sentido, o próprio interesse no funcionamento jurídico dos processos de canonização, expresso nos trabalhos reunidos por Gábor Klaniczay, é indício não apenas da possibilidade de interpretar aqueles processos como uma prática inserida em seu tempo. Nesta obra é latente a questão da prova: desde a procura incessante dos envolvidos nas mais diferentes causas analisadas em provar a sobrenaturalidade dos candidatos a santo a partir dos signos de sua “perfeição de vida e de seus milagres”. (KLANICZAY, 2004, p. 02).
Dividida em cinco partes, a obra aborda questões gerais sobre o universo da santidade medieval católica e a especificidade dos processos de canonização, como no texto de Aviad Kleinberg. Segundo este autor – expressando uma questão historiográfica consensual – a novidade não são os cultos em si. Existem semelhantes formas de devoção nas mais diversas religiões. A novidade é o controle papal e o poder auto-investido para tal. Além disso, Kleinberg caracteriza a canonização como “a fascinating religious phenomenon”, e, como fonte, fornece muitas informações sobre as noções populares e das elites sobre o sobrenatural. (KLEINBERG, 2004, p. 14).
Além dessas questões gerais, constam estudos sobre as relíquias e também aparece uma abordagem regional: uma divisão geográfica do culto aos santos e dos processos de canonização, caracterizando estudos sobre o norte da Europa, a Europa Central e a Itália. Uma parte dedicada à questão jurídica e ao papado e, por fim, a “evolução [da santidade] no fim da idade média e na época moderna”.
A investigação específica feita por Klanickzay sobre as provas de santidade no século XIII a partir dos processos de Elizabeth da Turíngia (1207-1231) e de Margarida da Hungria (1242-1270) permite que, ao compararmos com as instruções dadas por João XXII para a investigação sobre a vida e os milagres de Tomás de Aquino, estabeleçamos uma proximidade entre os inquéritos. Gregório IX, ao autorizar a abertura do processo sobre as suspeitas e cartas referentes aos milagres e ao culto a Elizabeth da Turíngia, em 1232, determinou que fossem minuciosamente levantadas informações sobre como as testemunhas souberam, quando, em que mês, em que dia, quem estava presente, em qual lugar e o que foi dito, quanto tempo depois viram as pessoas curadas, qual o lugar de origem dessas pessoas...enfim, uma investigação de/sobre todas as circunstâncias. (KLANICZAY, 2004, p. 124-125). A conclusão deste autor é que a santidade “nova” que pode ser percebida por esses processos é que os milagres narrados, embora compartilhem de elementos extremamente difundidos – dentro daquilo que Ginzburg chamaria de “estereótipos inquisitoriais” –, correspondem às virtudes daquelas santas expressas em vida. Em outras palavras, os milagres post mortem correspondem às virtudes dos candidatos a santo quando viviam. (KLANICZAY, 2004, p. 147-148).
Outro texto que se refere à santidade na Europa central e na Itália é o de Paolo Golinelli, sobre a escolha das testemunhas. Em linhas gerais, o autor concluiu que nos mais variados casos, a escolha das testemunhas privilegia os clérigos e, quando da convocação de leigos, as personalidades dos poderes locais aparecem nos inquéritos de clérigos, como no caso de São Domingos – e, podemos também inserir, a especificidade das testemunhas interrogadas no processo de Tomás de Aquino, como veremos a seguir. No caso dos cultos populares, Golinelli afirmou que os leigos predominam como testemunhas. Entretanto, principalmente no século XIV, “a conspicuous predominance of distinguished personalities” entre os leigos. (GOLINELLI, 2004, p. 165-180).
É relevante a observação que nessas abordagens sobre a santidade a partir dos processos de canonização há poucas referências sobre as possibilidades de entendê-los como uma prática inquisitorial. Entretanto, pensamos nessa aproximação diante de alguns indícios: não existem, além das bulas dos papas que indicam os critérios e formas de investigação, manuais para inquéritos de canonização, como encontramos sobre confissão e heresia. Além disso, a semelhança estrutural pode enriquecer a análise dos processos de canonização.
Comparando as atas dos testemunhos obtidos em Bolonha (1233) para a canonização de Domingos de Gusmão e o interrogatório de Bernarda Targuiera (1243) dos Cahiers de Bernard de Caux, temos um acesso indireto às falas de interrogadores e depoentes:

Tabela 1
Canonização e Inquisição: primeiras aproximações jurídicas

 Interrogatório para a Canonização

 

 

Interrogatório para a Inquisição

 

Frater Ventura Veronensis presbyter, & Prior Conventus Fratrum Prædicatorum de Bononia, juratus dixit, quod XIII anni sunt & plus, quod ipse testis intravit Ordinem Fratrum Prædicatorum ad inductionem & admonitionem Fratris Dominici, Ordinis Fratrum Prædicatorum fundatoris & primi Magistri, & in manus eius fecit professionem & ab eo habitum recipit. (AA SS, Augusti I, MCCXXXIII, p. 633) 2.

 

Anno Domini millesimo ducentesimo quadragesimo tertio pridie kalendas decembris Bernarda Targuiera uxor Poncii Gran, testes iurata, dixit quod fuit heretica induta per tres annos et dimidium, et sunt triginta anni. (BERNARD DE CAUX, 1988, p. 08) 3.

Aparentemente, poucas são as semelhanças. Como mostra a tabela abaixo, a forma inicial de registro de depoimentos consiste em expor quem foi interrogado, seus possíveis cargos/funções ou condição (leigo, clérigo, casado, viúvo). Além disso, é explícito o registro do juramento. Também percebemos que no registro do depoimento de Bernarda Targuiera uma das primeiras informações é a data do depoimento e sua condição de herege assumida.

Tabela 2
Primeiros dados de comparação entre Processo de canonização e Processo Inquisitorial - século XIII

Semelhanças

Processo de Canonização

Processo de Inquisição

Nome

Ventura

Bernarda Targuiera

Status ou ocupação

Frei, presbítero, Prior

Viúva de Poncii Gran

Juramento

Declarado

Declarado

Forma de anotação

Relatório

Relatório

           
Considerando o “proêmio do notário” no caso da Relatio juridica sobre Domingos de Gusmão, a informação da data aparece em conjunto, na medida em que todos os depoimentos anotados foram realizados no mesmo dia, a saber, seis de agosto de 1233. (AA SS, Augusti I, MDCCXXXIII, p. 632).
Também podemos fazer essas associações a partir da documentação inquisitorial contemporânea ao processo de canonização de Tomás de Aquino. Foi entre 1320-1330 que Bernardo Gui escreveu o Manual do Inquisidor. Jacques Paul considerou que esse inquisidor – que não exerceu apenas essa função nos quadros da Igreja – inovou muito pouco e que sua “mentalidade de homem da Igreja” é a dos inquisidores de seu tempo. (PAUL, 1981, p. 280). A obra é dividida em cinco partes: nas três primeiras, o inquisidor – a partir do modelo fornecido pelas Sentenças – propõe um vasto formulário, abstrato, para a anotação das sentenças. Na quinta parte, a mais conhecida, expõe as doutrinas heréticas. (BERNARD GUI, 1964) 4.
Intitulada De Modo, Arte et Ingenio Inquirendi et examinandi heréticos credentes et complices eorumdem, esta quinta parte trata especificamente das heresias cátara, valdense, dos pseudo-apóstolos, das beguinas e dos judeus. Além disso, ao final, apresenta um anexo que contém o sermão final dos inquisidores, no qual elenca os elementos, a seqüência e a forma de se dizer os resultados dos inquéritos. Por ora, interessa a fórmula de anotação do início dos processos, indicada por Bernardo Gui:

 
Anno tali, kalenda tali, talis N., de tali castro seu Villa, talis dyocesis, sponte veniens vel citatus vel vocatus, contitutus in judicio coram religioso viro tali N., inquisidore heretice pravitatis in regno Francie per sedem apostolicam deputato, juratus ad sancta Dei evangelia plenam et meram dicere veritatem de facto seu de crimine heresis ipsumque contingentibus, tam de se, sicut de principali, quam de aliis peronis vivis et defunctis, sicut testis dixit et confessus fuit, etc.(BERNARD GUI, 1964, v.1, p. 04) 5.

Temos, nesta passagem, o mesmo tipo de detalhamento sobre o início dos depoimentos nos processos de canonização. Ao anotar o interrogatório do comissário régio, Petrus Grassus, o notário registrou:

 
...& iuratus coram ipsis Inquisitoribus, super vitâ & conversatione ac miraculis dicti Fratris Thomæ dicere puram & veram veritatem, quam scit ex visu, auditu & credulitate, & quòd etiam ad interrogata super ipsâ inquisitione veraciter respondebit.. (AA SS, Martii I, MDCLXVIII, p. 688) 6.

O juramento e o compromisso em dizer a verdade são, então, latentes e evidentes nos dois casos. No processo de canonização, ao anotar as testemunhas interrogadas no mesmo dia, em geral, o notário utiliza a fóruma “eodem die ibidem...testis iuratus secundùm formam superiùs annotatam...” 7. (AA SS, Martii I, MDCLXVIII, p. 690). As proximidades não estão circunscritas apenas na questão do juramento e da verdade. Anteriormente, citamos como G. Klaniczay trabalhou com as recomendações de Gregório IX, no século XIII, sobre as investigações a respeito de Elizabeth da Turíngia e Margarida da Hungria. Concluímos, numa comparação simples, que são as mesmas recomendações expressas por João XXII no século seguinte.
Podemos aproximar também os articuli interrogatori. Segundo André Vauchez, os interrogados, em geral, não podiam se exprimir livremente, pois os promotores redigiam questionários para orientar os depoimentos. Segundo o autor, a função desses artigos era “identifier un personnage vénéré localement à un modèle de saintetè en honneur dans l’Église”. (VAUCHEZ, 1981, p. 04) 8. Além desse tipo de procedimento, Vauchez considerou que, por exemplo, no século XIII, muitos processos não foram anotados sob a forma de interrogatórios, como os processos de São Domingos e de Tomás de Aquino.
Entretanto, no “estilo direto” – na opinião de Vauchez – de registro de depoimentos sem os articuli, percebemos quais questões foram colocadas no interrogatório. E, neste caso, as formas de anotar são próximas das formas de perguntar, como indicou Bernardo Gui:

Tabela 3
Heresia e Canonização: as formas de anotar.

Interrogatório dos cátaros crentes

 

Processo de Canonização

 

In primis examinandus interrogeteur si vidit aut scivit alicubi hereticum vel hereticus, sciens aut credens ipsos esse aut nominari seu reputari tales, et ubi vidit et quotiens et cum quibus et quando; […]
Item, si interfuit hereticationi alicujus persone et de modo hereticationis, de nominibus heretici vel hereticorum et de personis ibidem presentibus et de loco in domo in quo persona infirma decumbebat et de tempore et de hora et si aliquid legavit dicta persona hereticata hereticis et quid et quantum et quis solvit legatum et si fuit ibi facta adoratio dicto herético et si persona hereticata obiit de illa infirmitate et ubi fuit sepulta...(BERNARD GUI, 1964, v.1, p. 26-28) 9.

 

testes legitimos, quos super vitâ, conversatione & miraculis dicti Fr. Thomæ debetis recipere...præstito iuramento...interrogetis eos, quomodò sciant, quo tempore, quo mense, quâ die, quibus presentibus, quo loco, ad cuius vocationem, & quibus verbis interpositis, & de nominibus illorum, circa quos miracula facta dicuntur, & si eos antè cognoscebant, & quot diebus antè viderunt eos infirmos, & quanto tempore fuêre infirmi, quanto tempore visi sunt sanit, de quo loco sunt... (AA SS, Martii I, MDCLXVIII, p. 687) 10.

Diante desse aparato, acreditamos que, evidenciar as formas de anotação eram as mesmas e que, na ausência de manuais para a canonização, tanto os papas quanto os inquisidores dessas causas, tinham, nos manuais para investigação de suspeita de heresias, os “modos” de se proceder à procura da verdade. Isso se faz importante, pois, é sob esses aspectos que temos acesso tanto a parte das informações que Guilherme de Tocco utilizou na Ystoria, quanto à forma de registro para o papado, interessado e responsável no/pelo controle da santidade oficial.
Outro aspecto, não menos importante: ao contrário do que temos para outros relatos hagiográficos medievais, Guilherme de Tocco não escreve apenas uma Vida de São Tomás de Aquino. Ele a chamou de Ystoria. O que significava, no século XIV, essa palavra? Mais além, o que poderia significar seu uso em um relato sobre vida de santo? Seria uma nova proposta hagiográfica?

Ystoria e Legenda:

No século XIII estaria se desenvolvendo também uma nova forma de escrita sobre vidas de santos, as chamadas “Biografias espirituais”, relacionadas às Beguinas. Segundo Ana Paula Lopes Pereira, Jacques de Vitry e Thomas de Cantimpré transformaram o

 
discurso hagiográfico tradicional […] não somente pela escolha dos temas tratados, onde o acento é colocado sobre a ascese interior e sobre os fenômenos místicos, mas sobretudo no envolvimento pessoal dos biógrafos com seu sujeito de análise e objeto de devoção. (PEREIRA, 2006, p. 02).

Para esta autora, o fato desses dois hagiógrafos explicitarem os seus objetivos nos prólogos de narrativas dedicadas às Beguinas marcou o método hagiográfico e as “biografias espirituais” se distinguiriam das hagiografias tradicionais por serem “fruto de uma realidade vivida em uma rede de espiritualidade fundamentada nas relações interpessoais”. (PEREIRA, 2006, p. 04). Cabe uma ressalva – que delimita, inclusive, a análise da autora: o público visado por Vitry e Cantimpré era mais restrito, circunscrito a uma “rede de amigos que acreditava no poder e no saber destas mulheres”. Diferentemente do público esperado por Guilherme de Tocco e pelo papa ao ordenar na canonização o culto a Tomás de Aquino em toda a Igreja.
No século XIV – principalmente entre 1305-1378 –, quando do Papado de Avignon, a santidade, e a escrita hagiográfica, estariam/seriam, então, descritas, representadas e apresentadas a partir de novos elementos, e, na expressão de Weinstein e Bell, seriam “sofisticadas biografias”. (WEINSTEIN e BELL, 1982). Em síntese, Guy Phillipart, propôs um novo conceito para o entendimento dessas transformações na hagiografia, a saber, a “hagiografia historiográfica”, que consiste na questão literária definida pelo herói ou pelo santo e, também, pela pretensão de verdade. (PHILLIPART, 1998, p. 11-39).
Ao analisar a tradição manuscrita do texto de Guilherme de Tocco, Claire Le Brun-Gouanvic levantou cerca de vinte e cinco versões entre textos completos, incompletos e resumos dos milagres. Considerando os dezenove manuscritos completos, constatamos que não há distinção, ou melhor, os termos Ystoria (em alguns casos, historia) e legenda são utilizados aparentemente como sinônimos. (LE BRUN-GOUANVIC, 1996, p. 61-67) 11.
No Dicionário Du Cange, temos a seguinte definição para Legenda: “livro sobre os atos dos santos” e há a indicação dos termos Martyrum (martírio), Passionariis (passionário, de paixão, no sentido de Paixão de Cristo), Leggendarius (legendário) e vita (vida). (DU CANGE, 1710, p. 273) Além disso, para o termo Historiæ, temos: livros de lições divinas que são recitados na Igreja todos os dias. (DU CANGE, 1710, p. 842) 12.
Obviamente que não devemos entender essa Ystoria no mesmo sentido que se entende a história como disciplina acadêmica, ciência, história-problema etc. Para Bernard Guenée, a História na Idade Média sequer foi considerada como um primeiro ofício. Os que se dedicaram à atividade de escrever sobre o passado e/ou a construir narrativas memoráveis sobre personagens, como Reis, Príncipes e Santos, por exemplo, não faziam apenas isso. Sempre desempenhavam outras funções. (GUENEE, 2006, p. 523-536). Entretanto, este autor defendeu que existiram muitos historiadores na Idade Média. Existiam várias acepções e usos para a história naquele período. Por exemplo, a história podia ser uma narrativa simples sobre o que se passou, ou mesmo ser o que se passou; o livro no qual a narrativa se encontra; e, a partir do século IX, um uso litúrgico mais preciso: “historia [comme] un récit qui s’attache essentiellement à dire la vie d’un saint et sert de base à la composition de repons qui seront dits à l’office de ce saint”. (GUENEE, 1980, p. 18) 13. Portanto, importava que fosse um discurso verdadeiro e diferente da fábula. Segundo Guenée, a concepção linear de tempo cristã restringiu o terreno do historiador aos eventos e fenômenos com datas asseguradas: do começo do mundo ao tempo daquele que escreve. As coisas do porvir – das quais não se sabia quando aconteceriam – estavam relacionadas às profecias. (GUENNE, 1980, p. 19).
A princípio, seria o caso simples de dois sinônimos: ystoria e legenda. Entretanto, Guenée nos oferece elementos para aprofundar a análise ao diferenciar história e hagiografia. Uma das diferenças consiste na atemporalidade do relato sobre vida de santo, ou seja, a ausência de datas por exemplo, pois, o que interessa nesse tipo de texto é instruir. (GUENNE, 1980, p. 53-54). E, seguindo aquela definição, seria conveniente excluir as vidas de santos da categoria de história, pois “L’historiographie médiévale se situa mal dans l’espace mais vit dans le temps son essence même. Sur elle pesa la tyrannie de la chronologie” 14. Sendo assim, a história deveria tratar basicamente dos Príncipes. (GUENNE, 1980, p. 22-23).
Uma argumentação próxima foi desenvolvida por François Dosse na obra Le Pari Biographique, na qual considerou que o que ensina a hagiografia é uma verdade diferente da factual, mas também observa que o termo legenda pode ser traduzido como “o que deve ser lido sobre”. (DOSSE, 2005, 149-153) Para Dominique Boutet, textos que, aparentemente seriam hagiográficos, tendem a utilizar métodos historiográficos, principalmente no que tange a inserção e referências a documentos diplomáticos nos textos. (BOUTET, 2000, p. 277-293). A Ystoria escrita por Guilherme de Tocco é um texto que mescla esses elementos. Pois, ao mesmo tempo em que são raras as referências cronológicas, o hagiógrafo apresenta em alguns capítulos o itinerário da pesquisa que realizou para produzir o texto.
Assim como nos depoimentos, Guilherme de Tocco, na primeira parte da Ystoria, oferece um vasto panorama das virtudes do santo, como nos capítulos dedicados à pureza do corpo e da mente, suas orações e à contemplação. (GUILLAUME DE TOCOO, 1996, p. 150-156). Outro aspecto importante a se observar na Ystoria e que poderíamos considerar como uma hagiografia “moderna” é a inserção do autor na narrativa, o que foi feito de forma impessoal. Guilherme de Tocco refere-se a si mesmo sempre na terceira pessoa. É significativa a utilização das atas e a menção das mesmas na segunda parte da Ystoria, ou seja, a parte dedicada aos milagres. Na nossa opinião, torna-se mais significativo ainda se associarmos essa utilização à parte mais “difícil” de se comprovar, ou seja, os milagres.
Mesmo não sendo função do relato provar a veracidade dos fatos narrados, o autor utiliza as informações obtidas nas pesquisas e ouvidas nos depoimentos do processo. Para provar? Se assim o for, essa Ystoria sancti Thome de Aquino é vai além de um “relato sobre vida de santo”. O que podemos perguntar a partir dessas primeiras informações? Ou melhor, nesta hagiografia, Ystoria e Legenda são sinônimos ou à Legenda são atribuídas características da Ystoria, no sentido de produzir um relato que ao mesmo tempo abarca o que se passou e também o que é exemplar?

Considerações finais:

Como podem perceber, esta é uma reflexão que oferece muitas perguntas, poucas respostas. É um indício do momento de produção do texto. Isto não significa, no entanto, que, ao final da tese, ofereceremos as respostas. Mas de qualquer forma, são essas questões que têm saltado aos olhos a partir da leitura em conjunto da Ystoria e das atas dos inquéritos sobre a santidade de Tomás de Aquino.
Ao trabalharmos com autores que constroem um aparato metodológico, como a Antropologia Escolástica, aquelas interrogações, no nosso entendimento, tornam-se relevantes e a canonização de Tomás de Aquino se apresenta como um legítimo objeto de pesquisa. Como se trata de uma análise mais micro-analítica do que macro, tendemos a acreditar que essa postura, aplicada a estudos específicos sobre outras canonizações, podem apontar outros elementos. Estas pesquisas, em uma perspectiva comparada, certamente oferecerão outras questões, outras respostas, outros problemas para explicar o fenômeno da santidade no final da Idade Média. Foi assim que André Vauchez conseguiu, em sua tese, construir o argumento sobre a santidade oficial e a popular, ao analisar os processos de canonização. O que propomos é uma postura próxima, porém, que considere a canonização como um conjunto de normas jurídicas e narrativas hagiográficas produzidas quase simultaneamente.

 

La Recherche en Histoire Médiéval: hagiographies et proccès de canonisation

Resumé: L’objectif dans ce texte est présenter, a partir du sujet de la table-ronde “Recherche en Histoire Médiéval”, quelques considerations historiographiques et metodologiques sur l’usage des proccès d’inquisition et les hagiographies dans les études sur la sainteté aux derniers siècles du Moyen Age. D’abord, nous considérons qui nous devons lire et analiser ces sources en ensemble quand on veut étudie la sainteté médiévale. Nous utilisons le proccès de canonisation de Saint Thomas d’Aquin (1319-1323), pendant le pontificat de Jean XXII, l’Ystoria sancti Thome de Aquino, écrite par Guillaume de Tocco, le Manuel de l’Inquisiteur, de Bernard Gui, et les notations inquisitoriels dans le Sud de France dans le même période. Nous avons conclu qu’une analise séparée de ces proccès – témoines, sujets, miracles du saint – peuvent conduire à une interprétation different quand on les lit  en ensemble avec les récits écrites au même temps et les autres proccès, comme les d’investigations d’héresies.

Mots-clés: Canonisation. Hagiographie. Inquisition. Droit Médiéval. Tomas d’Aquin.

 

1 Doutorando em História no Programa de Pós-Graduação em História da UFRGS e Professor Substituto na área de História da Educação, no Departamento de Estudos Básicos da Faculdade de Educação da mesma Universidade. Contato: teixeira.igor@gmail.com. Financiamento da pesquisa: CAPES.

2 Depoimento de Frei Ventura para o processo de canonização de Domingos de Gusmão, 06 de agosto de 1233. Tradução livre: “Frei Ventura presbítero de Verona e Prior no convento dos Irmãos Pregadores de Bolonha, disse, jurando, que há certa de treze anos desses testes entrou para a Ordem dos Pregadores sob admissão de Fr. Domingos, fundador da Ordem dos Irmãos Pregadores, e em suas mãos fez os votos e de suas mãos recebeu o hábito”. Grifo meu.

3 Interrogatório de Bernarda Targuiera, 30 de novembro de 1243. Tradução livre: “Ano do Senhor mil duzentos e quarenta e três, [sic] em dezembro, Bernarda Targuiera viúva de Pôncio Gran, sob juramento, disse que foi induzida à heresia por três anos e tem trinta anos”. Grifo meu.

4 Infelizmente, a edição que tivemos acesso é apenas da quinta parte, considerada por G. Mollat, na introdução que antecede ao texto propriamente dito, como “la pièce maîtresse de l’ouvrage”. (MOLLAT, 1964, p. VIII).

5 Tradução com auxílio da tradução francesa: “No ano tal, em tal dia, N., natural de tal burgo ou cidade, de tal diocese, se apresentou espontaneamente, ou foi citado ou convocado, ao julgamento diante da pessoa de N.,, inquisidor de heresia para o reino da França por delegação da Sé apostólica, após ter jurado sobre os santos evangelhos de Deus de dizer a plena e inteira verdade sobre o fato ou crime de heresia e sobre os fatos conexos, como no que lhe parece como principal interessado no que diria respeito a outras pessoas vivas ou mortas, a título de testemunho, disse e confessou, etc”. Em itálico, no original.

6 Tradução livre: “...e jurando nesta Inquisição, sobre a vida e conversação e milagres do dito Frei Tomás, dizer a pura e verdadeira verdade, como soube e viu, ouviu e a credibilidade, e como [sic] interrogado sobre essa inquisição, respondeu a verdade”.

7 Tradução livre: “No mesmo dia...jurando da mesma forma anotada anteriormente...”

8 Tradução livre: “identificar um personagem venerado localmente a um modelo de santidade honrado na Igreja”.

9 Tradução com auxílio da tradução francesa: “De início, perguntaremos ao interrogado se ele viu ou conheceu alguma parte um ou muitos hereges, se sabe seus nomes ou de suas reputações, onde eles os viu, quantos por vez, com quem e quando; […] Item, se ele assistiu à iniciação de um dele, como ela se opera, qual era o nome do ou dos hereges, as pessoas presente, o lugar da casa onde estava a pessoa doente, o tempo que durou a cerimônia, a hora na qual ela ocorreu, se o iniciado legou alguma coisa aos hereges, o que e quantos, quem adquiriu; se a adoração foi dada pelo herege iniciador; se o iniciado sucumbiu dessa doença e onde foi enterrado; quem

10 Tradução livre: “testes legítimos, sobre a vida, conversação e milagres do dito Fr. Tomás deveis receberdes...prestem juramento...interrogue-os sobre o que sabem, qual o tempo, qual o mês, qual dia, quem estava presente, em que lugar, o que fazem, o que foi dito, o nome deles, sobre quais milagres dizem, e se eles conheceram antes e quantos dias antes viram os enfermos e quanto tempo foram enfermos, quanto tempo viram eles sãos, de que lugar são.”

11 Exemplos datados, segundo a autora, do século XIV: o Ms F: Firenze, Bibliotheca Nazionale, Conv. Soppr. J. VII. 27, ff. 96ra-132va, primeira metade do século XIV, pergaminho, 215 x 145mm. Origem: convento de Santa Maria de Florença. Título: “Prohemium in ystoria sancti Thome de Aquino et de necessitate institutionis ord. Predicatorum et eius commendatione”. Ou o Ms L: Londres, British Museum, Burney 349, ff. 76v-126v, fim do século XIV, pergaminho, 260 x 190mm. Título: “Prohemium de hystoria beati Thome de Aquino ordinis fratrum predicatorum. Et primo de necessitate institucionis eiusdem ordinis et eius commendatio”, com a subscrição: “Explicit legenda sancti Thome de Aquino”. Ou, ainda, o Ms V: Vaticano, Biblioteca Apostólica, Vat. Lat. 10153, ff. 1vb-28vb, fim do século XIV, pergaminho, 290 x 208mm. Origem: convento dominicano de Orviedo. Inscrição: “Prohemium in ystoria sancti Thome de Aquino. De necessitate institutionis ordinis predicatorum et eius commendatione. Primum Capitulum       “. Dentre os do século XV, um exemplo: o Ms. B: Berlim, Staatsbibliothek Preussischer Kulturbesitz, Lat. qu. 707, ff. 145r-183r, XVe s. (1479), papier, 210 x 144mm. Título: “Incipt prohemium in Legendam sancti Thome de Aquino. Et primo necessitate institutionis ordinis predicatorum et eius commendacione sic incipit feliciter”. Grifos meus.

12 Na edição consultada não há verbete para Ystoria. Disponível em: http://www.uni-mannheim.de/mateo/camenaref/ducange/bd2/jpg/s0842.html. Acesso em: fev. 2009.

13 Tradução livre: “historia [como] uma narrativa que se associa essencialmente à vida de um santo e serve de base para a composição do responsório dito no ofício desse santo”. Grifos do autor.

14 Tradução livre: “A historiografia medieval se situa mal no espaço, mas vive no tempo a sua essência. Sobre ela pesa a tirania da cronologia”.

Referências:

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