Acessibilidade / Reportar erro

A Formação na e para a Pesquisa no PIBID: possibilidades e fragilidades

The Training in and for Research in PIBID: possibilities and weaknesses

Resumo:

Essa pesquisa objetiva investigar a contribuição do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID) para a aprendizagem da docência dos licenciandos, focalizando a construção da identidade docente como professores pesquisadores e reflexivos, no contexto de um Instituto Federal de Ciências, Educação e Tecnologia, por meio de narrativas e análise documental. Evidenciou-se que o PIBID pode se constituir em um espaço de reflexão, em que o formando é incitado a desenvolver postura investigativa, elaborar e executar projeto de ensino e de investigação; entretanto, os estudos e reflexões sobre a pesquisa deve também ser assumido pelos demais professores formadores para que esta atividade seja fortalecida na instituição.

Palavras-chave:
Formação de Professores; Pesquisa na Formação; PIBID

Abstract:

This research aims to investigate contributions of the Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência [Institutional Scholarship for Teaching Initiation Program] - (PIBID) to the learning of teachers. It is focused on the construction of the professional identity as researchers and reflective teachers, in the context of a Federal Institute of Sciences, Education and Technology, by means of narratives and documents analysis. It was evident that the PIBID may constitute a space for reflection, where the student is encouraged to develop an investigative approach and to prepare and implement educational and research projects; however, studies and reflections concerning research should also be taken by other trainer teachers so that such activity will be strengthened in the institution.

Keywords:
Teachers' Formation; Research in Training; PIBID

Introdução

Ser professor/a na sociedade contemporânea tem sido um desafio face as exigências do contexto sociocultural e educativo atual, que, influenciado pelo avanço acelerado da ciência, da tecnologia, dos meios de informação, das novas relações estabelecidas no cotidiano escolar, exige um novo perfil profissional, com capacidade de mobilizar vários saberes e ter poder de decisão em sua prática de ensino. As situações que acontecem em sala de aula são singulares, complexas, ambíguas, incertas, tornando-se, portanto, impossível que o/a professor/a aplique modelos prontos e acabados, técnicas produzidas por outros; ao contrário, é necessário que ele/a tenha atitude reflexiva diante dessas situações, procurando possíveis alternativas por meio da investigação para solucioná-las; nesta perspectiva, entende-se que o/a professor/a não pode mais ser um operário que utiliza técnicas com vista a uma produção uniforme, mas sim um profissional capaz de realizar diagnósticos e atuar no sentido da concretização de prognósticos diversos e bem sucedidos.

Para corresponder às múltiplas exigências do processo ensino e aprendizagem, a partir deste cenário, são necessárias novas propostas de formação inicial e continuada, perspectivas formadoras que contemplem o desenvolvimento profissional do licenciando/a e a preparação para as diferentes tarefas com que os professores se deparam em seu cotidiano; ou seja, é "[...] necessário formar o professor na mudança e para a mudança" (Imbernón 2004IMBERNÓN, Francisco. Formação Docente e Profissional: formar-se para a mudança e a incerteza. 4 ed. São Paulo: Cortez , 2004., p. 32), fato que requer a formação de professores questionadores, reflexivos e pesquisadores para que possam mobilizar os vários saberes necessários ao exercício da docência que a atual sociedade conclama.

Como forma de incentivar a melhoria na formação de professores das Instituições de Ensino Superior (IES), de modo a atender as atuais exigências de formação, bem como superar a falta de professores no Brasil, vários programas foram implementados nos últimos dez anos pelo governo federal, como é o caso do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID), criado pelo Decreto nº 7.219/2010 (Brasil, 2010BRASIL. Decreto nº 7.219, de 24 de junho de 2010. Dispõe sobre o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil] , Brasília, DF, 25 jun. 2010a. P. 1. Disponível em: <Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/Decreto/D7219.htm >. Acesso em: 22 dez. 2013.
http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/_a...
), cuja ação está vinculada à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). O programa, por meio da concessão de bolsas, tem como foco a formação do/a aluno/a da licenciatura e a elevação da qualidade da formação de professores. Com início em 2009, foi direcionado inicialmente às instituições federais de ensino superior, focando as áreas de Física, Química, Biologia e Matemática para o Ensino Médio, atendendo cerca de 3.088 bolsistas. A partir da primeira versão, alargou de forma significativa o oferecimento a outras licenciaturas e IES (Instituição de Educação Superior), de modo que em 2014 participaram 284 IES, oferecendo 313 projetos de iniciação à docência a mais de 90 mil bolsistas (licenciandos, professores supervisores da Educação Básica e coordenadores das IES) no país.

É expressiva a dimensão do PIBID como política pública vinculada a formação de professores no Brasil, fato que motiva a realização da presente investigação, na medida em que, dada a amplitude de projetos existentes, e da extensão territorial brasileira, é importante a realização de pesquisas em perspectivas macro e micro para avaliar de forma mais aprofundada os seus impactos para a aprendizagem da docência na formação, no contexto das IES, em diferentes regiões e estados.

Assim, a discussão deste texto faz parte de uma pesquisa de doutorado realizada no contexto de um Instituto Federal de Ciências, Educação e Tecnologia, aqui denominado como IF Campo, tendo como objetivo investigar os contributos do PIBID para a aprendizagem da docência profissional dos licenciandos em formação, focalizando a construção da identidade docente como professores pesquisadores e reflexivos. No presente texto, focalizaremos especificamente as possibilidades e fragilidades da inserção da pesquisa na formação, no contexto dessa instituição. Para tanto, delineamos as seguintes questões: É possível a formação na e para a pesquisa no PIBID? Quais as suas possibilidades e fragilidades?

Estruturamos o texto da seguinte forma: inicialmente indicaremos o caminho metodológico da pesquisa, seguida de alguns pressupostos teóricos nos quais nos ancoramos e finalmente faremos a discussão acerca das possibilidades e fragilidades do PIBID para a formação na e para a pesquisa no contexto do IF Campo.

Metodologia

Neste estudo de abordagem qualitativa, optamos pelas entrevistas narrativas e análise documental como procedimento de coleta de dados. Recolhemos narrativas de nove formandos das licenciaturas de Química, Biologia e Matemática - bolsistas de iniciação a docência do PIBIB, e de três professores da IES coordenadores dos subprojetos em que os bolsistas participam. Os participantes, todos com mais de um ano de participação no PIBID, são identificados pelas iniciais do seu nome e projeto em que estão inseridos. A seleção de elementos para a amostra se deu a partir dos seguintes critérios: 1) diferentes faixas etárias; 2) estarem sob a orientação dos CA dos subprojetos analisados; 3) escolha por gênero. Das cinco unidades que oferecem os cursos de Licenciatura no IF Campo, só uma atendeu aos critérios acima indicados pelo que todos os narradores pertencem à mesma. Por meio das narrativas foi possível dar voz aos investigados, tendo em vista que ao falar de suas experiências detectamos os valores, as práticas efetivas que estão ocorrendo na escola em que desenvolvem a sua formação por meio do PIBID. Através das narrativas, reconhecemos o valor que os sujeitos "atribuem às suas memórias como intervenientes na sua aprendizagem profissional, realçando as interacções estabelecidas ao longo da vida com pessoas significativas, em contextos sociais em que cada pessoa-professor se vai construindo e reconstruindo" (Sarmento, 2009SARMENTO, Teresa. Contextos de Vida e Aprendizagem da Profissão. In: FORMOSINHO, João (Org.). Sistemas de Formação de Professores: saberes docentes, aprendizagem profissional e acção docente. Porto: Porto Editora , 2009. P. 303-328., p. 323). Para o corpus de análise recolhemos as narrativas dos formandos e dos respectivos coordenadores de área desses cursos.

Como documentos foram analisados: a Portaria nº 260/2010 (Brasil, 2010bBRASIL. Portaria nº 260, de 30 de dezembro de 2010. Brasília, DF, 2010b. Disponível em: <Disponível em: https://www.capes.gov.br/images/stories/download/legislacao/Portaria260_PIBID2011_NomasGerais.pdf >. Acesso em: 10 jun. 2014.
https://www.capes.gov.br/images/stories/...
) e nº 096/2013 (Brasil, 2013aBRASIL. CAPES. Portaria nº 096, de 18 de julho de 2013. Brasília, DF 2013a. Disponível em: <Disponível em: http://www.capes.gov.br/images/stories/download/legislacao/Portaria_096_18jul13_AprovaRegulamentoPIBID.pdf >. Acesso em: 10 jun. 2014.
http://www.capes.gov.br/images/stories/d...
) que trata do PIBID, os subprojetos de áreas, o projeto e o relatório institucional da IES apresentado a CAPES. Neste texto optamos por apresentar dados referentes ao projeto (2011-2013) e relatório institucional encaminhado a CAPES no final de 2013, deixando para textos futuros o aprofundamento da discussão dos dados em sua totalidade.

Os dados recolhidos foram organizados e analisados de acordo com Bardin (2013BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. 5. ed. Lisboa: Edições 70, Ltda, 2013. ), ou seja, seguimos as três diferentes fases de análise de conteúdo: 1) a pré-análise, 2) a exploração do material e o tratamento dos dados, 3) a inferência e interpretação. Com suporte nos objetivos e questões da pesquisa, ao analisar as informações evidenciadas nas narrativas e documentos alguns focos foram se delineando e se configurando como categorias. Assim, as unidades de registro foram organizadas a partir de uma categorização semântica, em que foram reunidos, em um tema, aspectos comuns evidenciados nas narrativas. Para além destas categorias definidas previamente, outras emergiram ao longo da análise. Ao mesmo tempo, apoiadas nos referenciais teóricos em que suportamos a investigação, fomos concretizando a interpretação possibilitada pelo cruzamento dos dados empíricos com os saberes teóricos, o que nos permitiu construir o conhecimento que aqui apresentamos.

Pressupostos Teóricos que Ancoram a Análise

Atualmente tem sido intenso o movimento de teóricos que defendem a inserção da pesquisa na formação e prática docente, da formação sustentada nos princípios da racionalidade prática e crítica, do professor reflexivo. Ao abordarmos a questão da formação na e para a pesquisa, defendemos a importância da formação sustentada em um processo de reflexão e investigação, uma vez que, conforme afirma Tardif (2013TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. 15. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.):

Se assumirmos o postulado de que os professores são atores competentes, sujeitos ativos, deveremos admitir que a prática deles não é somente um espaço de aplicação de saberes provenientes da teoria, mas também um espaço de produção de saberes específicos oriundos dessa mesma prática [...]. Essa perspectiva equivale a fazer do professor - tal como o professor universitário ou o pesquisador da educação - um sujeito de conhecimento, um ator que desenvolve e possui sempre teorias, conhecimentos e saberes de sua própria ação (Tardif, 2013TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. 15. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013., p. 254).

Apesar das divergências de pontos de vista acerca da pesquisa na formação e prática docente e do professor reflexivo, amplia-se gradativamente o número de teóricos que advogam a favor dessa ideia. Dentre outros, destacamos na literatura brasileira (Ludke, 2006LÜDKE, Menga. O Professor e a Pesquisa. 4. ed. Campinas, São Paulo: Papirus, 2006.; André, 2006ANDRÉ, Marli. Pesquisa, formação e prática docente. In: ANDRÉ, Marli (Org.). O papel da Pesquisa na Formação e na Prática dos Professores. 5. ed. Campinas: Papirus, 2006. P. 55-71.; Diniz-Pereira; Lacerda, 2009DINIZ-PEREIRA, Júlio Emílio; LACERDA Mitsi Pinheiro de. Possíveis significados da pesquisa na prática docente: ideias para fomentar o debate. Educação & Sociedade, Campinas, Unicamp, v. 30, n. 109, p. 1229-1242, set./dez. 2009.; Pimenta; Lima, 2011PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro. Estágio e Docência. 6. ed. São Paulo: Cortez , 2011.) e na literatura estrangeira (Zeichner, 2008ZEICHNER, Kenneth. Uma análise crítica sobre a "reflexão" como conceito estruturante na formação docente. Educação & Sociedade , Campinas, Unicamp, v. 29, n. 103, p. 535-554, maio/ago. 2008.; Kincheloe, 1993; Nóvoa, 1997NÓVOA, António. Formação de professores e profissão docente: In: NÓVOA, António (Org.). Os Professores e a sua Formação. 3. ed. Lisboa: Dom Quixote, 1997. P. 15-33., 1999NÓVOA, António (Org.). Profissão Professor. 2. ed. Porto: Porto Editora, 1999.; Alarcão, 2011ALARCÃO, Isabel. Professores Reflexivos em uma Escola Reflexiva. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2011.; Schön, 1983SCHÖN, Donald Alan. The Reflective Practitioner: how professional Think in action. EUA: Basic Books, 1983.). Não faremos aqui uma distinção destas concepções, apenas nos ateremos a pontuar algumas ideias que balizaram a discussão.

Na defesa do professor reflexivo e do movimento dos professores como pesquisadores é importante citarmos, na década de 50, Jonh Dewey, cujas ideias influenciaram demasiadamente essa perspectiva formativa. Destacamos também nas décadas de 60 e 70 na Inglaterra, Lawrence StenhouseSTENHOUSE, Lawrence. Investigación y dessarrollo del curriculum. Madri: Morata, 1987., que desencadeia a ideia dos professores como pesquisadores ao defender o ensino como uma arte e os professores como artistas, os quais possuem condições de aprimorar o ensino, sua arte, experimentando e analisando criticamente suas ações. Na década de 80 as ideias de Donald Alan Schön (1983SCHÖN, Donald Alan. The Reflective Practitioner: how professional Think in action. EUA: Basic Books, 1983.) efervescem ainda mais essa discussão, ao propor a formação de profissionais reflexivos, de professores envolvidos na prática docente com posturas reflexivas, de modo a nela intervir e melhorá-la. Na década de 90 destacamos Kenneth Zeichner cujas ideias são significativas para a discussão tecida neste texto, ao defender que a prática reflexiva é a orientada pela pesquisa. O movimento da prática reflexiva, segundo Zeichner (2008), pressupõe o reconhecimento de que os professores exercem um papel ativo na definição das intencionalidades e finalidades de seu trabalho, como reação à perspectiva em que os professores são meros técnicos, reprodutores de ideias.

Nessa discussão há que termos em conta que o uso do termo professores reflexivos tem sido usado na literatura de diversas formas, o que, em grande medida, não traduz a ideia original defendida por Schön. Zeichner (2008ZEICHNER, Kenneth. Uma análise crítica sobre a "reflexão" como conceito estruturante na formação docente. Educação & Sociedade , Campinas, Unicamp, v. 29, n. 103, p. 535-554, maio/ago. 2008.) denuncia que o termo tem sido apropriado, inclusive, para legitimar reformas políticas educacionais sustentadas nos princípios da racionalidade técnica. Também Pimenta e Ghedin (2005PIMENTA, Selma Garrido; GHEDIN, Evandro. Professor Reflexivo no Brasil. Gênese e crítica de um conceito. São Paulo: Cortez , 2005.) denunciam o uso indiscriminado desse termo e advogam em favor de professores investigadores e de políticas públicas que possibilitem as condições para o exercício dessa prática na escola.

Apesar da intensa defesa da formação de professores investigadores e/ou reflexivos, há muitas reações contrárias à possibilidade de os professores produzirem conhecimentos a partir da prática de ensino e contexto sociocultural. Um argumento contrário é que pesquisar e ensinar são atividades distintas, portanto, o/a professor/a não possui tempo e condições de trabalho para o exercício da pesquisa; outro aspecto é o pouco crédito ao conhecimento produzido pelo/a professor/a, em decorrência de não ter uma formação teórico-metodológica apropriada para o trabalho com a pesquisa. Por outro lado, a pesquisa realizada pelos professores não tem muito status diante da academia, sendo ainda visualizada como exclusiva a especialistas que atuam fora do contexto escolar, conforme afirmam Zeichner e Diniz-Pereira (2005ZEICHNER, Kenneth; DINIZ-PEREIRA Júlio Emílio. Pesquisa dos educadores e formação docente voltada para a transformação social. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, Fund. Carlos Chagas, v. 35, n. 125, p. 63-80, maio/ago. 2005.):

Apesar de assistirmos a um crescimento contínuo das comunidades de pesquisa-ação por todo o mundo e mais especificamente das comunidades de educadores-pesquisadores e de suas publicações, ainda constatamos uma discriminação generalizada em relação ao tipo de conhecimento gerado pelos professores no âmbito da pesquisa educacional (Zeichner; Diniz-Pereira, 2005ZEICHNER, Kenneth; DINIZ-PEREIRA Júlio Emílio. Pesquisa dos educadores e formação docente voltada para a transformação social. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, Fund. Carlos Chagas, v. 35, n. 125, p. 63-80, maio/ago. 2005., p. 70-71).

Por certo, mesmo reconhecendo a existência de diferentes correntes de estudos que permeiam a questão de professores investigadores e/ou reflexivos; mesmo reconhecendo que o uso desse termo já foi utilizado de forma errônea e demasiado, insistimos nesta perspectiva formativa por acreditar no potencial da formação de professores que reflitam, analisem, façam intervenção em sua prática educativa e produzam o conhecimento sistematizado. Não acreditamos que esta discussão tenha se esgotado, pois se o termo já foi tão utilizado, porque esta perspectiva formativa ainda não se materializou no contexto das IES e das escolas de Educação Básica? Reconhecemos também os desafios para que esta perspectiva formativa seja operacionalizada no contexto escolar; dentre outros, citamos questões de natureza política, da formação inicial e das próprias condições de trabalho enfrentadas pelos professores nas instituições escolares. Entretanto, ao invés de acentuar estes obstáculos como se fossem instransponíveis, devemos encontrar alternativas para superá-los, incluindo a luta coletiva por políticas públicas que garantam formação, condições adequadas de trabalho e valorização profissional.

É o que nos diz Zeichner e Diniz-Pereira, bem como Lüdke (2006LÜDKE, Menga. O Professor e a Pesquisa. 4. ed. Campinas, São Paulo: Papirus, 2006.), ao afirmarem que, apesar das posições contrárias à possibilidade de os professores realizarem pesquisa, as evidências sinalizam que há possibilidades da operacionalização dessa atividade e que resulta em melhoria da prática como alternativa de instrumento de reflexão e crítica. Colabora ainda com esta reflexão, Alarcão (2011ALARCÃO, Isabel. Professores Reflexivos em uma Escola Reflexiva. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2011.), apontando a importância da pesquisa-ação para o desenvolvido desta perspectiva formativa.

Além disso se faz importante pensarmos noutras práticas de pesquisa que avancem dos modelos tradicionais e contemplem as necessidades dos professores, problemáticas educativas. Diniz-Pereira e Lacerda (2009) corroboram ao afirmarem a necessidade de rompermos com este modelo de investigação e "[...] tentarmos, junto com professores e professoras de escolas, discutir possibilidades de inserção da pesquisa no ensino, ao mesmo tempo em que se lute para que as condições de trabalho dos docentes melhorem significativamente" (Diniz-Pereira; Lacerda, 2009, p. 1236).

Então, independentemente da denominação com que seja intitulada a atividade que os professores fazem a partir de sua prática e contexto educativo, seja pesquisa-ação, investigação-ação, dentre outras tipologias, o que interessa aqui é a ressignificação de sua prática, é a análise crítica, reflexiva, política e interventiva em sua realidade educativa, prática de sala de aula e outras problemáticas em termos socioculturais, ambientais, etc., na busca de melhoria, de modo que, conforme Diniz-Pereira e Lacerda (2009)

Trata-se de uma investigação desenvolvida no cotidiano escolar e compreendida como discussão permanente acerca do currículo, da prática e da problemática social. Trata-se ainda de uma pesquisa que possibilita a professores das escolas se firmarem na qualidade de sujeitos que auto gerenciem a sua própria formação, auxiliados pelo conhecimento teórico tomado como texto dialógico junto à tessitura do cotidiano escolar. Refere-se também a uma pesquisa que minimiza a tutela e legitima a emancipação docente, no sentido de romper com essa pretensiosa via de mão única em que a palavra externa historicamente vem tentando dizer o que de ser a escola (Diniz-Pereira; Lacerda, 2009, p. 1232-1233).

Por fim, o que defendemos é a formação consubstanciada em um processo de reflexão e investigação, considerando que "[...] a formação deve estimular uma perspectiva crítica-reflexiva, que forneça aos professores os meios de um pensamento autónomo e que facilite as dinâmicas de auto formação participada [...]" (Nóvoa, 1997NÓVOA, António. Formação de professores e profissão docente: In: NÓVOA, António (Org.). Os Professores e a sua Formação. 3. ed. Lisboa: Dom Quixote, 1997. P. 15-33., p. 25). Nesta perspectiva, o trabalho com a investigação na formação inicial contribui para que o/a futuro/a professor/a, ao se deparar com as experiências iniciais da docência no ambiente escolar, possa melhor compreender os desafios interpostos e, então, desenvolver práticas alternativas e criativas, evitando assim se tornar reprodutor/a de informações e de conhecimentos científicos em sua prática futura. Ainda na mesma linha, Nóvoa (1999) entende que a participação dos professores na construção de um novo corpo de conhecimentos, se constitui como estratégia e dinâmica de profissionalização docente na atualidade.

Contributos do PIBID para a Formação na e para a Pesquisa

As práticas vivenciadas no PIBID desde o início da formação, enseja aos formandos vi­venciarem a relação teoria-prática de forma a concretizar a premissa "A prática deverá estar presente desde o início do curso e permear toda a formação do professor", proposta no Artigo 12 § 2º da Resolução brasileira do CNE/CP 1 (Brasil, 2002BRASIL. Resolução CNE/CP nº 01 de 18 de fevereiro de 2002. Institui as diretrizes curriculares nacionais para a formação de professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil] , Brasília, DF, 19 fev. 2002. P. 1-5.).

A introdução da pesquisa na formação e no trabalho docente é um assunto também incluído em programas de formação docente, como apresentado no Parecer CNE/CP 009/2001 (Brasil, 2001BRASIL. Ministério da Educação. Parecer CNE/CP 09/2001 de 8 de maio de 2001. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 18 dez. 2002. Seção I. P. 31. Disponível em: <Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/009.pdf >. Acesso: 20 jun. 2014.
http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pd...
) que trata das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior:

Não se pode esquecer ainda que é papel do professor da Educação Básica desenvolver junto a seus futuros alunos postura investigativa. Assim, a pesquisa constitui um instrumento de ensino e um conteúdo de aprendizagem na formação, especialmente importante para a análise dos contextos em que se inserem as situações cotidianas da escola, para construção de conhecimentos que ela demanda e para a compreensão da própria implicação na tarefa de educar [...] (Brasil, 2001, p. 36).

Observa-se que a lei estabelece a pesquisa como ferramenta de ensino indispensável à prática docente e como sendo necessária à formação, no sentido de possibilitar ao professor refletir sobre situações práticas do seu cotidiano e nelas intervir. A relação teoria-prática, a reflexão e investigação também são mobilizadas na atual Resolução 02/2015 CNE de 2 de julho, que define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial e continuada (Brasil, 2015BRASIL. Resolução CNE/CP nº 02 de 01 de julho de 2015. Define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de segunda licenciatura) e para a formação continuada. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil] , Brasília, DF, 2 jul. 2015. Seção I. P. 8-12.).Nessa resolução, entre outras questões, é apontada a necessidade dos cursos de formação de professores se voltarem mais para as questões da prática de ensino em sala de aula, e sinalizando que a formação dos professores para atuarem na Educação Básica deve ter uma base comum nacional, consubstanciada pela concepção de educação como processo emancipatório e pelo reconhecimento do trabalho docente na perspectiva da práxis. É clarificado que a formação de professores, dentre outros aspectos, deve conduzir o futuro professor "à construção do conhecimento, valorizando a pesquisa e a extensão como princípios pedagógicos essenciais ao exercício e aprimoramento do profissional do magistério e ao aperfeiçoamento da prática educativa" (Brasil, 2015, p. 24). A nova legislação incita, portanto, a investigação como necessária para que os futuros professores possam aprimorar e refletir sobre a sua prática na perspectiva da práxis.

Também nos princípios pedagógicos do PIBID é valorizada a pesquisa como forma de discutir as problemáticas da escola e busca de intervenção e inovação, conforme é apresentado no relatório DEB/CAPES (Brasil, 2013bBRASIL. CAPES. Diretoria de Formação de Professores da Educação Básica. Relatório de gestão. Brasília, 2013b. Disponível em: <Disponível em: https://www.capes.gov.br/images/stories/download/bolsas/2562014-relatrorio-DEB-2013-web.pdf >. Acesso em: 6 set. 2014.
https://www.capes.gov.br/images/stories/...
, p. 69) ao esclarecer que a formação de professores deve ser "atenta às múltiplas facetas do cotidiano da escola e à investigação e à pesquisa que levam à resolução de situações e à inovação na educação". Ademais, aparecem na atual Portaria nº 096/2013 de 18 de julho que normatiza o PIBID, outros elementos que caracterizam a aprendizagem da docência no que se referem à formação por meio da investigação que devem ser contemplados no projeto institucional e subprojetos, tais como os apresentados no Art. 6º em que ficam sinalizadas, de forma explícita, ações que induzem o exercício da reflexão e da pesquisa no contexto das práticas do PIBID, fato evidenciado nas palavras: análise, estudo, leitura e discussão, cotejamento, desenvolvimento, testagem e execução de estratégias, sistematização e registro, dentre outras.

Por certo, a iniciação à pesquisa no ensino, durante a formação, enriquecerá a articulação da teoria-prática, produção de conhecimentos, estimulando o/a licenciando/a, a assumir uma atitude questionadora, a desenvolver posturas investigativas acerca das problemáticas do cotidiano escolar, questões socioambientais, culturais, institucionais, análise das práticas de ensino, ensino/aprendizagem, livros didáticos e possibilita com se sintam preparados para lidar com elas futuramente em sua prática profissional. Conforme Flores (2010FLORES, Maria Assunção. Algumas reflexões em torno da formação inicial de professores. Educação, Porto Alegre, PUCRS v. 33, n. 3, p. 182-188, set./dez. 2010.)

É necessário valorizar a prática como fonte e local de aprendizagem através da reflexão e da investigação, e promover as condições para a aprendizagem (recursos, tempo e oportunidades para aprender) para que os alunos, futuros professores, se empenhem em processos de reflexão sobre o processo de tornar-se professor (Flores, 2010FLORES, Maria Assunção. Algumas reflexões em torno da formação inicial de professores. Educação, Porto Alegre, PUCRS v. 33, n. 3, p. 182-188, set./dez. 2010., p. 185).

Deveras é recorrente na literatura e em documentos oficiais brasileiros a defesa da formação de professores pautada em perspectivas formativas da reflexão e do professor pesquisador. Com isso soma-se a experiência da pesquisadora principal na coordenação de área e de gestão pedagógica do PIBID ter oportunizado a aproximação com as escolas, trabalho em colaboração e a percepção da possibilidade do PIBID para a construção da identidade docente dos formandos como professores pesquisadores. Todo o exposto justifica a nossa defesa de um processo formativo consubstanciado nas tendências da racionalidade prática e crítica, de modo a contribuir para a formação de professores que problematizem suas práticas de ensino e o contexto educativo em que atuam, ou seja, a formação na e para a pesquisa.

São estes pressupostos que nos fazem insistir na defesa de professores pesquisadores e reflexivos, e vislumbrar o PIBID como espaço fecundo, fértil para aí ser lançada a semente desta perspectiva formativa, tal como apontam Pimenta e Lima (2011PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro. Estágio e Docência. 6. ed. São Paulo: Cortez , 2011., p. 227) ao defenderem o trabalho com a pesquisa durante o estágio: "[...] pode ser a oportunidade de começarmos a pesquisar nossa prática docente e os espaços onde acontece". Comungando com esta ideia, acreditamos que ela pode ser alargada e se potencializar de forma mais significativa no PIBID, tendo em vista que os formandos já são inseridos no contexto da escola, desde o início da formação.

As Possibilidades do PIBID para a Formação na e para a Pesquisa no IF Campo

Das possibilidades formativas observadas identificamos dois momentos fecundos para a formação na e para a pesquisa no contexto do PIBID no IF Campo, os quais consistem do diagnóstico e do trabalho com projetos. Ademais os próprios formadores e os cursos de licenciatura são beneficiados pelas práticas vivenciadas no PIBID.

Na análise do projeto institucional do IF Campo (2011-2013) verificamos nos seus objetivos, algumas proposições que suscitam a prática de reflexão e investigação:

O projeto objetiva que os estudantes-licenciandos bolsistas percebam no ambiente escolar, as dimensões sociais, políticas e pedagógicas do processo educativo a partir da aproximação entre a realidade escolar e uma prática da reflexão, que possa contribuir para o esclarecimento e o aprofundamento da relação ensino-aprendizagem. [...]. Os subprojetos são distintos em alguns aspectos em virtude das especificidades das licenciaturas, mas têm como objetivos a melhoria da qualidade do ensino, a formação inicial de professores e o desenvolvimento de práticas investigativas [...] (IF Campo, 2011IF Campo. Projeto Institucional do IF Campo (RIIFC) apresentado a Capes. 07 f. Goiânia/GO, 2011. , p. 02).

É sinalizada de forma expressiva a inserção da reflexão e da pesquisa como alternativas de compreensão do contexto escolar, aprofundamento da relação teoria- prática, desenvolvimento de novas metodologias, dentre outros. No contexto das práticas formativas desenvolvidas no PIBID do IF Campo, e apresentadas no Relatório Institucional (IF Campo, 2013), constatamos que as possibilidades da formação na e para a pesquisa foram iniciadas no projeto em junho de 2011, com o diagnóstico para mapeamento das condições estruturais, humanas e didático-pedagógicas das escolas conveniadas, e a elaboração de um relatório que se constituiu como base para a realização de pesquisas, conforme é apresentado o processo em uma das escolas conveniadas:

Os bolsistas iniciaram a atividade com levantamento de dados da parte física estrutural e humana da instituição. As pesquisas foram feitas por meio de visitas a todos os locais da Instituição, bem como de realização de entrevistas, questionários e fotos[...]. Foi investigado sobre a estrutura física da escola, recursos materiais, humanos e financeiros, bem como a estrutura, organização e funcionamento da instituição. [...] (IF Campo, 2013, p. 20).

O diagnóstico envolve um processo de estudo, investigação por meio de coleta de informações pertinentes à realidade escolar, análise e sistematização teórica, processo que configura uma situação de pesquisa. Pimenta (2012PIMENTA, Selma Garrido (Org.). Saberes Pedagógicos e Atividade Docente. 8. ed. São Paulo: Cortez , 2012.) corrobora com esta reflexão ao defender a pesquisa como princípio formativo na docência e que pode ocorrer:

Por meio de estudos às realidades escolares e os sistemas em que o ensino ocorre, ir às escolas e realizar observações, entrevistas, coletar dados e determinados temas abordados nos cursos, problematizar, propor e desenvolver projetos nas escolas; conferir os dizeres de autores e da mídia, as representações e os saberes que têm sobre a escola, o ensino, os alunos, os professores, nas escolas reais; começar a olhar, ver e analisar as escolas existentes com os olhos não mais de alunos, mas de futuros professores [...] ( Pimenta, 2012PIMENTA, Selma Garrido (Org.). Saberes Pedagógicos e Atividade Docente. 8. ed. São Paulo: Cortez , 2012., p. 31).

No relatório institucional do IF Campo é sinalizado que este processo ocorre de forma planejada sob a orientação da coordenação dos subprojetos, tendo como aporte teórico estudiosos que abordam a temática como Menegolla e Sant'anna (1998MENEGOLLA, Manmiliarw; SANT'ANNA, Ilza. Por que planejar? Como Planejar? Petrópolis: Vozes, 1998.), dentre outros. A partir do diagnóstico, é elaborado o plano de ação dos subprojetos. Ao analisar as ações propostas, averiguamos que elas se configuram em três eixos: 1) criação de materiais didáticos/estratégias didáticas; 2) planejamento e aplicação de aulas com a utilização de estratégias didáticas alternativas; 3) elaboração e desenvolvimento de projetos de ensino na escola a partir de temáticas geradas em situações problemas/sociais, culturais, ambientais e sala de aula.

No confronto dos documentos com as narrativas dos licenciandos bolsistas, verificamos uma concordância entre a proposta e as práticas materializadas acerca do diagnóstico, sinalizada na narrativa das bolsistas:

[...] o nosso primeiro ano foi em relação ao levantamento do diagnóstico da escola; até a gente publicou um artigo do contexto histórico da escola [...] essa parte eu achei bastante interessante porque não adianta a gente chegar na escola e querer ter contato direto com os alunos, sem antes conhecer o contexto que eles estão inseridos. [...] depois passamos para a parte de intervenções [...] (Bolsista F Química, 15 maio 2014).

Após o resultado do diagnóstico nós traçamos e vemos as necessidades que são prioritárias para a melhoria de qualidade de ensino dos alunos. O planejamento é feito nas reuniões realizadas semanalmente, com a presença dos alunos bolsistas, alguns professores supervisores e o coordenador do PIBID [...] (Bolsista A Biologia, 26 ago. 2014).

As narrativas evidenciam que o diagnóstico fora fundamental para o conhecimento da realidade da escola em termos pedagógicos, estrutura física, recursos pedagógicos disponíveis, corpo docente, perfil dos alunos, questões objetivas de trabalho dos professores, para então ser elaborada uma ação que envolve a aprendizagem dos licenciandos bolsistas de iniciação da docência no contexto da escola por meio de participação e intervenção.

A fase de diagnóstico no PIBID do IF Campo é um momento farto em possibilidades para a iniciação a pesquisa e reflexão, o que consideramos salutar trazer a essa discussão Pimenta e Lima (2011PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro. Estágio e Docência. 6. ed. São Paulo: Cortez , 2011.) ao apontarem também as possibilidades do diagnóstico no estágio para o início da pesquisa na formação, situação semelhante ao que ocorre no PIBID: "O estágio pode ser a oportunidade de começarmos a pesquisar nossa prática docente e os espaços onde acontece. O diagnóstico da escola seria, assim, o primeiro passo de uma longa e permanente caminhada" (Pimenta; Lima, 2011, p. 227). Posto a fase de diagnóstico, outra possibilidade de iniciação a pesquisa e a reflexão é o trabalho com projetos.

Nas práticas do PIBID no IF Campo, constatamos que de forma concomitante às atividades vinculadas ao ensino, os bolsistas são estimulados a desenvolverem projetos de ensino, com potencial para se constituírem em projetos de pesquisa, visto que são suscitados a refletir sobre temáticas emergentes no cotidiano da escola, a desenvolver posturas críticas, investigadoras, a fazer elaborações próprias, enfim, a ter atitudes de pesquisa, tal como defendem (Pimenta; Lima, 2011PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro. Estágio e Docência. 6. ed. São Paulo: Cortez , 2011., p. 228): "A realização dos estágios sob a forma de projetos pode estimular nos estagiários o desenvolvimento de um olhar sensível e interpretativo às questões da realidade, uma postura investigativa [...]". No relatório institucional (2013, p. 15) são sinalizados alguns dos projetos trabalhados, tais como: "[...] horta escolar, educação ambiental, educação especial, sexualidade, dengue, material experimental, reforços escolares, evasão escolar, compostagem, Show da Química, dia da Matemática, DST, drogas [...]". Fato também evidenciado nas narrativas dos licenciandos bolsistas.

Outro projeto também muito interessante [...] é um projeto que visava trabalhar com os alunos que tinham algum tipo de necessidade especial, e a gente sabe que esse tipo de aluno, ele necessita de um outro tipo de aprendizagem, de condução de aula [...] porque as necessidades e a percepção deles são outras. Então foi interessante, por que despertou também esse lado, que existem esses alunos e, a gente até então na graduação, não tinha essa percepção [...] (Bolsista B Matemática, 15 maio 2014).

[...] Eram cinco alunos do PIBID de Química, aí ficou duas duplas e eu sozinha. Trabalhei com o terceiro ano no ensino médio enquanto uma dupla trabalhou com o segundo e outra com o primeiro. Ai a do primeiro fez experimentação, jogos, o outro grupo puxou para TICs, eu a música [...] (Bolsista P Química, 02 dez. 2014).

A bolsista B Matemática explicita um projeto sobre o trabalho com alunos com necessidades especiais; já a Bolsista P Química explica que, como forma de articular o trabalho dos bolsistas, foram desenvolvidos três projetos, de modo a focalizar diferentes estratégias didáticas para o trabalho com o ensino de Química, sendo o trabalho com as Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs), o trabalho com a música e o trabalho com os jogos didáticos. De forma geral, as narrativas dos licenciandos/as bolsistas indicam que as diversas atividades realizadas decorriam, em sua grande maioria, por meio de projetos. No Relatório Institucional (2013, p. 40) são sinalizadas as contribuições do trabalho com projetos: "[...]com projetos, os licenciandos estão conhecendo melhor a realidade das escolas e materializando na prática os conhecimentos teóricos estudados na licenciatura. Dos projetos de intervenção foram geradas publicações [...]". Os projetos de ensino ensejaram, portanto, o estudo, a investigação de situações do cotidiano da escola e se transformaram em produções sistematizadas para serem apresentadas em eventos científicos, conforme é pontuado no Relatório (p. 41): "Já foram publicadas em eventos científicos cerca de 200 trabalhos (relatos de experiência, resumos, artigos) em nível local, regional e nacional, experiências significativas sobre as práticas de ensino e a realidade escolar vivenciada pelos bolsistas".

Outras evidências das possibilidades de formação na e para a pesquisa são sinalizadas nas narrativas dos formandos.

Em um dos trabalhos, eu peguei todos os alunos da licenciatura em Matemática [...] fiz um questionário estruturado [...] querendo saber o perfil do aluno que cursa a licenciatura [...] busquei também as contribuições através de alguns relatos deles[...] eu observava como investigador, como observador dos discursos dos próprios bolsistas[...] (Bolsista I Matemática, 20 jun. 2014).

[...] normalmente, todas as vezes que a gente fazia alguma atividade com projetos, a gente aplicava um questionário investigativo com os alunos. A partir disso a gente fazia os resumos e enviava para congressos [...] (Bolsista L Biologia, 21 jun. 2014).

Pelas narrativas constatamos que havia uma preocupação em planejar as ações, selecionar instrumentos de coleta dados, avaliar os resultados e publicar, de forma semelhante ao que ocorre em um processo de pesquisa. Pimenta e Lima (2011PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro. Estágio e Docência. 6. ed. São Paulo: Cortez , 2011.) corroboram ao pontuarem sobre a pesquisa durante o estágio:

A pesquisa no estágio como método de formação dos estagiários, futuros professores, se traduz pela mobilização de investigações que permitam a ampliação e análise dos contextos onde os estágios se realizam. E também, em especial, na possibilidade de os estagiários desenvolverem postura e habilidades de pesquisador a partir de situações de estágio, elaborando projetos que lhes permitam ao mesmo tempo compreender e problematizar as situações que observam (Pimenta; Lima, 2011PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro. Estágio e Docência. 6. ed. São Paulo: Cortez , 2011., p. 236).

Os formandos apontam que muitos dos trabalhos realizados no contexto do PIBID, foram aprofundados e se transformaram em trabalho de conclusão de curso, ou até mesmo em projeto para ingresso em programas de mestrados:

[...] eu fiz um trabalho sobre as contribuições do PIBID na formação inicial e foi justamente esse trabalho que deu o ponta pé para fazer o meu TCC, trabalho de conclusão de curso [...] foi a mesma linha! A diferença é que no TCC foi um trabalho mais amplo, que exigiu maior rigor que tinha todo um referencial teórico [...] os trabalhos que eu apresentei, com o resultado do PIBID foi voltado para as contribuições que esse programa traz para a formação inicial do aluno [...] ah, também entrei no mestrado com o projeto nesta mesma linha (Bolsista I Matemática, 20 jun. 2014).

[...]a gente também publicou em relação à aplicação da experimentação e, eu estou trabalhando muito em pesquisadores na área de ensino, devido ao meu TCC que é na área. [...] o meu TCC é sobre jogos e atividades Lúdicas do ensino de tabela periódica. [...] aí foi uma coisa que eu, o PIBID me ajudou a escolher o tema (Bolsista E Química, 21 jun. 2014).

Depreendemos, portanto, que houve uma iniciação a pesquisa durante o PIBID. Ademais, os trabalhos não foram restritos à prática em sala de aula, mas envolveram outras questões, conforme é narrado pelo bolsista I Matemática que investigou as contribuições do PIBID para a formação inicial junto aos licenciados bolsistas e aprofundou a reflexão de tal modo que resultou em seu trabalho de conclusão de curso e projeto para inserção no mestrado.

Outra possibilidade que merece ser salientada é a contribuição do PIBID para a constituição e fortalecimento da identidade dos professores coordenadores como pesquisadores na área de ensino e de educação:

Se eu não estivesse no PIBID, eu acho que eu não estaria mexendo com pesquisa em educação [...] eu faço doutorado em química analítica, a mesma área do mestrado. [...]como PIBID eu percebi a necessidade de informação sobre pesquisa em educação. [...] Então, mesmo fazendo doutorado na área de analítica, eu tive a oportunidade de fazer uma disciplina sobre a metodologia de pesquisa em educação. Adorei a disciplina [...] agora estou tentando dar um direcionamento para esses alunos. [...] é difícil fazer pesquisa em educação (CLQ, 25 jun. 2014).

[...] o PIBID vem no sentido de trabalhar com a formação do aluno [...] apesar de eu não ter formação, mestrado ou doutorado nesta área, eu gosto muito dessa área. E o PIBID me ajuda muito, pois está sempre me lembrando da educação (CGB, 19 ago. 2014).

Assim, o programa contribuiu para suscitar a realização de pesquisa na área do ensino por parte dos coordenadores, mesmo para os que não possuem formação em pesquisa nesta área. Dos três coordenadores, apenas a coordenadora de Matemática possui pós-graduação na área do ensino, os outros dois, apesar de possuírem a formação inicial em curso de licenciatura, na pós-graduação, dedicaram os estudos em área de pesquisas aplicadas.

O PIBID apresenta, pois, um espaço rico e prenhe em possibilidades para a aprendizagem da docência e formação na e para a pesquisa, para o que concorrem vários intervenientes: os licenciandos podem, por meio da investigação, adentrar os diversos espaços da escola de Educação Básica, ocupar as bibliotecas, ter contato com as Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs); podem vivenciar as relações multifacetadas, heterogêneas, afetivas, complexas de sala de aula e contorno sociocultural da comunidade educativa e, por fim, podem realizar projetos de ensino e de intervenção com possibilidades de se transformarem em projetos de pesquisa. Conforme pesquisas, o PIBID proporciona:

A possibilidade de experimentar formas didáticas diversificadas, de criar modos de ensinar, de poder discutir, refletir e pesquisar sobre eles são características dos projetos PIBID ressaltadas como valorosas para a formação inicial de professores. Certa autonomia dada aos Licenciandos em suas atuações e em sua permanência nas escolas ajuda-os no amadurecimento para a busca de soluções para situações encontradas ou emergentes e para o desenvolvimento da consciência de que nem sempre serão bem-sucedidos, mas que é preciso tentar sempre (Gatti; André; Gimenes; Ferragut, 2014GATTI, Bernadete; ANDRÉ, Marli, GIMENES, Nelson; FERRAGUT, Laurizete. Um Estudo Avaliativo do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência (Pibid). São Paulo: FCC/SEP, 2014., p. 58).

Não obstante, as práticas do PIBID estão modificando as licenciaturas no IF Campo, tendo em vista que a instituição possui uma identidade consolidada na área das ciências agrárias, com forte predominância da pesquisa experimental com bolsas de iniciação a pesquisa nessa área, fato evidenciado no Relatório Institucional IF Campo (2013):

[...] os licenciandos bolsistas estão tendo a oportunidade do contado com a iniciação científica na formação, fato que é um avanço, considerando que no IF Campo, os cursos das áreas agrárias são mais tradicionais, com isso as licenciaturas eram prejudicadas pela dificuldade de aprovação nos projetos de bolsas para os alunos para o PIBIC para os cursos de licenciaturas, devido a grande concorrência com outras áreas consolidadas (IF Campo, 2013IF Campo. Relatório Institucional do IF Campo (RIIFC) apresentado a Capes. 43 f. Goiânia/GO, 2013., p. 37).

Outrossim, as práticas do PIBID contribuem também para fortalecer a pesquisa na área do ensino, considerando que por ter a instituição um histórico consolidado na área das ciências agrárias, os alunos destes cursos possuem mais facilidade para obtenção de bolsas de pesquisa.

A Formação na e para a Pesquisa no PIBID no Contexto do IF Campo: fragilidades, desafios e tensões

A investigação revela que da mesma forma que as possibilidades são abundantes, os desafios, as tensões e fragilidades também o são, de modo que apresentaremos alguns que traduzem questões complexas, ambíguas, tais como a frágil relação da tríade, ensino, pesquisa e extensão nas licenciaturas, a formação dos formadores das licenciaturas e/ou PIBID e sobre questões teóricas e metodológicas apresentadas nas atividades de iniciação à pesquisa no PIBID.

A fragilidade da relação ensino-pesquisa ocorre na medida em que, de modo geral, são poucos os professores que atuam nas licenciaturas, estabelecendo relação entre as práticas de ensino da Educação Básica e suas atividades de ensino e pesquisa na IES, conforme expõe uma coordenadora do PIBID: "Quem desenvolve pesquisa mesmo aqui na matemática com os alunos sou eu, vinculada ao ensino [...] esta experiência de trabalhar na pesquisa, ela é recente [...]" (CEM, 22 maio 2014). Essa é, por certo, uma questão emblemática e que, apesar das inúmeras discussões sobre a importância da relação ensino e pesquisa na formação inicial, são raros os professores que vinculam o ensino e a pesquisa. Ao contrário, ainda prevalece o desenvolvimento de pesquisas focadas noutras áreas de conhecimento e ausência de interação com as práticas de ensino da Educação Básica, fato que não contribui para a formação de professores reflexivos, pesquisadores de sua prática, além de que o conhecimento é produzido de forma fragmentada. A ausência da formação na e para a pesquisa em educação nos cursos de licenciaturas no IF Campo é denunciada por um dos coordenadores do PIBID:

Uma aluna me relatou que está conhecendo essas abordagens de metodologias de pesquisas em educação graças ao PIBID. Significa então que, no curso de licenciatura em Química, não está tendo essa discussão de pesquisa. Eles veem prática de laboratórios, fazem relatório. Veem a possibilidade de pesquisa em Química pura; essa parte de estudos de pesquisa em educação não tem. Por que não tem? Acredito que os professores, mesmo sendo formados em licenciaturas, nenhum de nós tem conhecimentos sobre pesquisa em educação [...] (CLQ, 25 maio 2014).

Fica evidente na fala do professor que ocorre ausência de práticas de iniciação a pesquisa sobre questões do ensino, educação, dentre outros, no contexto das licenciaturas, prevalecendo, ao contrário, práticas experimentais de laboratório. Ademais, o professor CLQ sinaliza que é no PIBID que os formandos estão tendo a oportunidade do contato com a pesquisa na área de educação. Corroboram (Gatti; André; Gimenes; Ferragut, 2014GATTI, Bernadete; ANDRÉ, Marli, GIMENES, Nelson; FERRAGUT, Laurizete. Um Estudo Avaliativo do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência (Pibid). São Paulo: FCC/SEP, 2014., p. 34) ao constatarem que os coordenadores de área do PIBID sinalizaram a importância da investigação no PIBID e justificaram que "essas ações não encontravam ambiente suficientemente fértil anteriormente nas licenciaturas".

Outro ponto que tensiona e fragiliza a relação pesquisa, ensino e extensão nas práticas do PIBID e/ou licenciaturas no IF Campo, diz respeito à formação dos professores. Grande parte dos professores que atuam nas licenciaturas e/ou PIBID não possuem formação na área do ensino e educação, bem como não possuem experiência com investigação e ensino na Educação Básica, conforme aponta um dos coordenadores de área: "[...] O quadro docente na área de educação é pequeno. Aqui, por exemplo, nós temos 3 docentes, mas até o mês passado nós tínhamos uma [...] e nós temos poucas pesquisas vinculadas a licenciaturas" (CGB, 19 ago. 2014).

Este fato implica questionar que concepção de ensino e pesquisa embasa as atividades orientadas pelos professores coordenadores do PIBID? Que princípios epistemológicos sustentam este olhar que pode interferir diretamente nas práticas dos licenciandos bolsistas do PIBID? Há que termos em conta que o fazer docente e sua prática de pesquisa é influenciada pela sua formação, concepção de pesquisa e educação, ou seja, "o fazer docente estará sempre impregnado das concepções de mundo, de vida e de existência dos sujeitos da prática" (Franco, 2012FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia e Prática Docente. São Paulo: Cortez , 2012., p. 187). O pesquisador, portanto, carrega consigo valores, princípios ancorados em sua história de vida, área de formação e pesquisa, que, por conseguinte, influenciam a forma como ensina e como orienta os seus alunos nas práticas de pesquisa "[...] Como atividade humana e social, a pesquisa traz consigo, inevitavelmente, a carga de valores, preferências, interesses e princípios que orientam o pesquisador" (Ludke; André, 2013LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli, André. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. 2. ed. São Paulo: EPU, 2013., p. 3).

Nesta perspectiva, nas análises feitas, identificamos uma correlação entre a formação do formador, sua visão de pesquisa e as práticas realizadas no PIBID. As atividades desenvolvidas pelos/as licenciandos bolsistas, consideradas como iniciação a pesquisa, estão vinculadas em demasiado à concepção tradicional de pesquisa positivista, com procedimentos linearmente prescritos e planejados, com uso de experimentos, em que se aplica um pré-teste, desenvolve-se a atividade experimental e depois aplica-se um questionário para avaliar os resultados. Este processo é ausente de problematizações das situações complexas do cotidiano escolar, reflexão e posicionamento crítico reflexivo, bem como de ausência de uma perspectiva dialética, colaborativa, que tensiona os vários aspectos influenciadores do processo de ensino e aprendizagem dos alunos da Educação Básica. Ademais, os alunos, após a participação em oficinas com aplicação de metodologias alternativas que transcendem as práticas triviais utilizadas pelos professores titulares de sala, podem manifestar satisfação diante do que foi trabalhado, mas é importante termos em conta que essas práticas, por si, não vão garantir a melhoria da aprendizagem. Temos que considerar que para melhor compreender e intervir na melhoria do processo ensino e aprendizagem dos alunos, faz-se mister alargar a reflexão para além do espaço da sala de aula, para além das questões de ordem cognitiva, na tentativa de perceber os diversos intervenientes em termos sociais, culturais, afetivos que também vão influenciar na aprendizagem deles. Kincheloe (1997KINCHELOE, Joe. Pesquisa-ação, reforma educacional e pensamento do professor. In: KINCHELOE, Joe. A formação do Professor como Compromisso Político: mapeando o Pós-Moderno. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. P. 179-197.) corrobora com esta reflexão ao alertar para o uso acrítico da pesquisa, com perspectivas ancoradas no ideário cartesiano-newtoniano que focaliza mais os resultados por meio do emprego de métodos mensurativos, quantitativos, "Quando as formas cartesianas-newtonianas de pesquisa focalizam nos resultados educacionais, a importância dos processos cognitivos inatos é exagerada, e seu papel na aprendizagem é descontextualizado [...]" (Kincheloe, 1997, p. 191). A ausência destas questões não contribui para o desenvolvimento profissional dos futuros professores, tal como alerta Zeichner (2008ZEICHNER, Kenneth. Uma análise crítica sobre a "reflexão" como conceito estruturante na formação docente. Educação & Sociedade , Campinas, Unicamp, v. 29, n. 103, p. 535-554, maio/ago. 2008.) ao esclarecer que, apesar da intensa retórica acerca do discurso do professor reflexivo, ela não tem contribuído para o desenvolvimento profissional dos professores e da valorização do seu papel nas reformas educacionais, por não focalizar a reflexão como prática social de modo que os educadores se ajudem e se fortaleçam para um crescimento coletivo e lutem por justiça social. Isto limita demasiadamente o alcance do crescimento dos professores como práticos reflexivos.

Por outro lado, constatamos também a ausência de estratégias de pesquisa alternativas, elementos metodológicos que possibilitem um olhar mais reflexivo e crítico sobre a natureza do trabalho docente, das diversas ambiguidades que o envolvem. Considerando a complexidade do cotidiano escolar, de sua face multifacetada, são necessários outros tipos de estudos e de estratégias de coletas de dados, tais como sugerem André e Lüdke (2013LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli, André. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. 2. ed. São Paulo: EPU, 2013.) ao afirmarem que em função da natureza dos problemas da pesquisa em educação:

[...] em lugar dos questionários aplicados a grandes amostras, ou dos coeficientes de correlação, típicos das análises experimentais, são utilizados mais frequentemente neste tipo de estudo a observação participante, que cola o pesquisador à realidade estudada; a entrevista, que permite maior aprofundamento das informações obtidas, e a análise documental, que complementa os dados obtidos através da observação e da entrevista e que aponta novos aspectos da realizada pesquisada (Lüdke; André, 2013LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli, André. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. 2. ed. São Paulo: EPU, 2013., p. 10).

Também nos servimos de Alarcão (2011ALARCÃO, Isabel. Professores Reflexivos em uma Escola Reflexiva. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2011.) ao sugerir a pesquisa-ação como metodologia formativa e de intervenção social, que se desenvolve por meio de um planejamento, seguido da ação, observação, reflexão. Para além da pesquisa-ação, a autora sugere várias alternativas de trabalho para o desenvolvimento da reflexão, que podem ser utilizadas no âmbito do PIBID, tais como: as narrativas, portfólios, análise de casos, grupos de discussão ou círculos de estudos, a auto-observação, supervisão colaborativa, dentre outros.

Além do que já foi exposto sobre os desafios da formação na e para a pesquisa em educação no PIBID do IF Campo, há que termos em conta a recente experiência da instituição com a formação de professores, que se inicia a partir das exigências da Lei nº 11.892/2008 (Brasil, 2008BRASIL. Lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil] , Brasília, DF, 30 dez. 2008. P. 1. ). Atualmente são oferecidas as licenciaturas nas áreas de Ciências Biológicas, Pedagogia, Química e Matemática em cinco dos seus campi. Os professores das licenciaturas atuam em diferentes níveis de ensino, que perpassam desde cursos que integra a educação profissional com a Educação Básica, cursos de formação inicial e tecnológica, atividades de pesquisa, atividades de extensão, cursos de bacharelado e cursos de pós-graduação latu sensu e strictu sensu, situação desafiante na concretização da relação pesquisa, ensino e extensão no processo formativo de professores, na medida em que precisam elaborar vários planejamentos, escolherem diversas estratégias didáticas para o ensino nas diversas faixas etárias e níveis.

Considerações Finais

Reconhecemos que as reflexões tecidas no presente texto são ainda insuficientes face à complexidade deste campo teórico, e firmamos já a ideia de que a prática de pesquisa e reflexão no cotidiano da escola não é suficiente para resolver as mazelas que os professores enfrentam. Entretanto, o estudo aponta que o PIBID pode se constituir em um espaço fértil, prenhe para o contato do licenciando com a investigação durante a formação, considerando que além de aproximá-lo da realidade da Educação Básica, motiva-o para o futuro exercício da docência com a realização de práticas vinculadas ao ensino. Realçamos, por isso, o objetivo do PIBID em incentivar, mobilizar e fortalecer o processo formativo para a docência profissional no contexto das IES, reafirmando assim a relação entre a aprendizagem da docência e o preparo para a realização da pesquisa. Por outro lado, faz sentido não materializar a relação da tríade ensino, pesquisa e extensão em um espaço tão fecundo para tanto? Por que não incentivar a capacidade de problematização, reflexão, análise, sistematização, elaboração própria, se existe um campo que enseja tal prática? Afinal, se há um consenso na literatura de que a reflexão e a pesquisa em uma perspectiva crítica no cotidiano da escola de Educação Básica, entre outros intervenientes, são alternativas de melhoria do desenvolvimento profissional dos professores, do ensino e aprendizagem, então vamos ser deterministas na história e nos atermos a pontuar todos os obstáculos que dificultam o exercício da pesquisa e da reflexão na escola ou vamos, em uma perspectiva coletiva, dispensar esforços na luta por políticas públicas que garantam que essas condições sejam garantidas aos professores?

Importante aqui trazer Freire (2006FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. 34. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.), quando dizia que precisamos ser utópicos e esperançosos quanto a possibilidades de mudança na educação e quando afirmava que a educação muda as pessoas e estas transformam a história, o mundo. Afinal não foi assim que a ciência sempre se desenvolveu? Sempre ocorrendo mudanças jamais imaginadas, como a revolução Copérnica e, depois, tantos outros avanços que há séculos atrás considerávamos impossíveis!? Por que tudo muda e a escola permanece a mesma como estivesse congelada, e muitos dos professores permanecem como reprodutores de conhecimentos produzidos por pessoas alheias a sua realidade educativa? Não podemos, pois, diante de tantas transformações, lidar com nossa prática educativa, incerta, ambígua, complexa face às influências de tantos intervenientes, com os pressupostos epistemológicos deterministas da ciência positivista que não reconhece o potencial dos professores como produtores de conhecimentos.

Não obstante, se os licenciandos bolsistas forem inseridos desde o início da formação no cotidiano da escola de Educação Básica, tendo a oportunidade de participar da elaboração de planejamento de ensino, da criação e aplicação de alternativas metodológicas inovadoras, na análise do processo de ensino-aprendizagem dos conteúdos ligados aos subprojetos que participam e das diretrizes e currículos educacionais da Educação Básica, dentre outras, não será um desperdício não transformar essas experiências, ações em conhecimentos sistematizados para serem publicados e com outros compartilhados?

Apesar do cenário positivo para a formação na e para a pesquisa, as fragilidades apontadas reduzem as possibilidades do programa como espaço de aprendizagem significativa da profissão docente e de aproximação da realidade da educação básica, por meio da investigação e da reflexão, o que nos provoca a afirmar a importância e a necessidade de que os formadores que atuam nas licenciaturas, bem como no PIBID, sem formação na área do ensino e/ou educação, percebam a importância da relação entre os conteúdos específicos e os pedagógicos, e o exercício da pesquisa vinculada ao ensino. Ademais, é importante que a proposta de professores pesquisadores e reflexivos conste nos programas curriculares dos cursos das licenciaturas do IF Campo e que ocorra formação continuada, para que os professores com formação em bacharelado, pós-graduação em áreas específicas e os demais possam adquirir saberes acerca do ensino, da educação, metodologias diferenciadas e pesquisa em educação, para que os obstáculos a serem superados sejam menores.

E por fim, enfatizamos a necessidade de que o programa, ao invés de reduzir bolsas, conforme os ruídos assinalados a partir de 2015, se fortaleça e se estenda a todos os licenciandos. Com a grave crise financeira, os ajustes foram anunciados e, entre eles, os cortes de bolsas do programa, o que resultou em incerteza quanto a sua continuidade. Salientamos que as lutas pela sua permanência, desencadeadas em 2015 e alargadas até o presente momento, conquistaram uma certa garantia de continuidade. Entretanto, outras mudanças na conjuntura política do Brasil estão ocorrendo, por conseguinte, o MEC sofreu mudanças em sua equipe que podem incidir diretamente no programa, modificando vários aspectos, incidindo no quantitativo de bolsas e finalidades educativas, o que consideramos que será um retrocesso grave em termos de políticas públicas de formação de professores.

Referências

  • ALARCÃO, Isabel. Professores Reflexivos em uma Escola Reflexiva. 8. ed. São Paulo: Cortez, 2011.
  • ANDRÉ, Marli. Pesquisa, formação e prática docente. In: ANDRÉ, Marli (Org.). O papel da Pesquisa na Formação e na Prática dos Professores. 5. ed. Campinas: Papirus, 2006. P. 55-71.
  • BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. 5. ed. Lisboa: Edições 70, Ltda, 2013.
  • BRASIL. Ministério da Educação. Parecer CNE/CP 09/2001 de 8 de maio de 2001. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil], Brasília, DF, 18 dez. 2002. Seção I. P. 31. Disponível em: <Disponível em: http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/009.pdf >. Acesso: 20 jun. 2014.
    » http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/009.pdf
  • BRASIL. Resolução CNE/CP nº 01 de 18 de fevereiro de 2002. Institui as diretrizes curriculares nacionais para a formação de professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil] , Brasília, DF, 19 fev. 2002. P. 1-5.
  • BRASIL. Lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia, e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil] , Brasília, DF, 30 dez. 2008. P. 1.
  • BRASIL. Decreto nº 7.219, de 24 de junho de 2010. Dispõe sobre o Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência - PIBID e dá outras providências. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil] , Brasília, DF, 25 jun. 2010a. P. 1. Disponível em: <Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/Decreto/D7219.htm >. Acesso em: 22 dez. 2013.
    » http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/Decreto/D7219.htm
  • BRASIL. Portaria nº 260, de 30 de dezembro de 2010. Brasília, DF, 2010b. Disponível em: <Disponível em: https://www.capes.gov.br/images/stories/download/legislacao/Portaria260_PIBID2011_NomasGerais.pdf >. Acesso em: 10 jun. 2014.
    » https://www.capes.gov.br/images/stories/download/legislacao/Portaria260_PIBID2011_NomasGerais.pdf
  • BRASIL. CAPES. Portaria nº 096, de 18 de julho de 2013. Brasília, DF 2013a. Disponível em: <Disponível em: http://www.capes.gov.br/images/stories/download/legislacao/Portaria_096_18jul13_AprovaRegulamentoPIBID.pdf >. Acesso em: 10 jun. 2014.
    » http://www.capes.gov.br/images/stories/download/legislacao/Portaria_096_18jul13_AprovaRegulamentoPIBID.pdf
  • BRASIL. CAPES. Diretoria de Formação de Professores da Educação Básica. Relatório de gestão. Brasília, 2013b. Disponível em: <Disponível em: https://www.capes.gov.br/images/stories/download/bolsas/2562014-relatrorio-DEB-2013-web.pdf >. Acesso em: 6 set. 2014.
    » https://www.capes.gov.br/images/stories/download/bolsas/2562014-relatrorio-DEB-2013-web.pdf
  • BRASIL. Resolução CNE/CP nº 02 de 01 de julho de 2015. Define as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior (cursos de licenciatura, cursos de formação pedagógica para graduados e cursos de segunda licenciatura) e para a formação continuada. Diário Oficial [da República Federativa do Brasil] , Brasília, DF, 2 jul. 2015. Seção I. P. 8-12.
  • DINIZ-PEREIRA, Júlio Emílio; LACERDA Mitsi Pinheiro de. Possíveis significados da pesquisa na prática docente: ideias para fomentar o debate. Educação & Sociedade, Campinas, Unicamp, v. 30, n. 109, p. 1229-1242, set./dez. 2009.
  • FLORES, Maria Assunção. Algumas reflexões em torno da formação inicial de professores. Educação, Porto Alegre, PUCRS v. 33, n. 3, p. 182-188, set./dez. 2010.
  • FRANCO, Maria Amélia Santoro. Pedagogia e Prática Docente. São Paulo: Cortez , 2012.
  • FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia. 34. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.
  • GATTI, Bernadete; ANDRÉ, Marli, GIMENES, Nelson; FERRAGUT, Laurizete. Um Estudo Avaliativo do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação a Docência (Pibid). São Paulo: FCC/SEP, 2014.
  • IF Campo. Projeto Institucional do IF Campo (RIIFC) apresentado a Capes. 07 f. Goiânia/GO, 2011.
  • IF Campo. Relatório Institucional do IF Campo (RIIFC) apresentado a Capes. 43 f. Goiânia/GO, 2013.
  • IMBERNÓN, Francisco. Formação Docente e Profissional: formar-se para a mudança e a incerteza. 4 ed. São Paulo: Cortez , 2004.
  • KINCHELOE, Joe. Pesquisa-ação, reforma educacional e pensamento do professor. In: KINCHELOE, Joe. A formação do Professor como Compromisso Político: mapeando o Pós-Moderno. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997. P. 179-197.
  • LÜDKE, Menga. O Professor e a Pesquisa. 4. ed. Campinas, São Paulo: Papirus, 2006.
  • LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli, André. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. 2. ed. São Paulo: EPU, 2013.
  • MENEGOLLA, Manmiliarw; SANT'ANNA, Ilza. Por que planejar? Como Planejar? Petrópolis: Vozes, 1998.
  • NÓVOA, António (Org.). Profissão Professor. 2. ed. Porto: Porto Editora, 1999.
  • NÓVOA, António. Formação de professores e profissão docente: In: NÓVOA, António (Org.). Os Professores e a sua Formação. 3. ed. Lisboa: Dom Quixote, 1997. P. 15-33.
  • PIMENTA, Selma Garrido (Org.). Saberes Pedagógicos e Atividade Docente. 8. ed. São Paulo: Cortez , 2012.
  • PIMENTA, Selma Garrido; GHEDIN, Evandro. Professor Reflexivo no Brasil. Gênese e crítica de um conceito. São Paulo: Cortez , 2005.
  • PIMENTA, Selma Garrido; LIMA, Maria Socorro. Estágio e Docência. 6. ed. São Paulo: Cortez , 2011.
  • SARMENTO, Teresa. Contextos de Vida e Aprendizagem da Profissão. In: FORMOSINHO, João (Org.). Sistemas de Formação de Professores: saberes docentes, aprendizagem profissional e acção docente. Porto: Porto Editora , 2009. P. 303-328.
  • SCHÖN, Donald Alan. The Reflective Practitioner: how professional Think in action. EUA: Basic Books, 1983.
  • STENHOUSE, Lawrence. Investigación y dessarrollo del curriculum. Madri: Morata, 1987.
  • TARDIF, Maurice. Saberes Docentes e Formação Profissional. 15. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.
  • ZEICHNER, Kenneth. Uma análise crítica sobre a "reflexão" como conceito estruturante na formação docente. Educação & Sociedade , Campinas, Unicamp, v. 29, n. 103, p. 535-554, maio/ago. 2008.
  • ZEICHNER, Kenneth; DINIZ-PEREIRA Júlio Emílio. Pesquisa dos educadores e formação docente voltada para a transformação social. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, Fund. Carlos Chagas, v. 35, n. 125, p. 63-80, maio/ago. 2005.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    23 Fev 2017
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2017

Histórico

  • Recebido
    11 Set 2015
  • Aceito
    22 Ago 2016
Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Faculdade de Educação Avenida Paulo Gama, s/n, Faculdade de Educação - Prédio 12201 - Sala 914, 90046-900 Porto Alegre/RS – Brasil, Tel.: (55 51) 3308-3268, Fax: (55 51) 3308-3985 - Porto Alegre - RS - Brazil
E-mail: educreal@ufrgs.br